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Crítica | Logan Noir

Uma igualmente poderosa versão em preto e branco.

por Ritter Fan
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A efetiva crítica de Logan encontra-se no link do título. Os presentes comentários são exclusivamente da versão batizada de Logan Noir, em que o diretor James Mangold, retornando para o material original alguns meses depois do lançamento do filme em 2017, preparou uma versão em preto e branco de seu longa que teve uma brevíssima janela de lançamento cinematográfico nos EUA e, depois, tornou-se “material extra”, por assim dizer, na disponibilização doméstica da obra. Em outras palavras, o objetivo, aqui, é discutir em que essa versão afeta a original, se é melhor, pior ou não muda muita coisa, exatamente na linha do que fizemos com O Nevoeiro, Max Max: Estrada da Fúria, Lobisomem na Noite (o processo inverso, na verdade, ainda que, neste caso, o média metragem tenha sido filmado em cores e lançado em preto e branco) e Liga da Justiça de Zack Snyder.

É sempre importante lembrar aos não iniciados que uma versão em preto de branco de um filme lançado originalmente em cores não é simplesmente retirar as cores como fazemos com o controle remoto de uma televisão, especialmente quando o próprio diretor retorna para trabalhar no projeto. Aliás, sequer um filme capturado em cores é lançado com as cores da captura, a não ser que estejamos falando em projetos pequenos, autorais ou que sigam o hoje raramente usado Dogma 95. Há todo um trabalho de gradação de cores em pós-produção que pode alterar radicalmente o resultado final se comparado com o que as câmeras efetivamente filmaram durante a produção, com o resultando aproximando-se, então, da visão que a direção tem para o longa. E falo isso de todo filme, não apenas daqueles que dependem de computação gráfica.

No caso de uma conversão de cores para preto e branco, o mesmo processo de gradação de cores é cuidadosamente (espera-se, pelo menos) empregado, com o diretor e o colorista, por vezes até mesmo o diretor de fotografia estudando a melhor maneira de empregar a “falta” de cores para esse ou aquele filme, como por exemplo focando no contraste entre o claro e o escuro, algo que pode ser radicalizado ou suavizado, dependendo da proposta e a da visão dos envolvidos. Vale também destacar que Logan foi filmado em cores, pois é muito raro algum estúdio hollywoodiano investir dezenas de milhões de dólares em obras em preto e branco, especialmente quando elas são de maior apelo popular, mesmo quando, como é o caso aqui, trata-se de uma pegada bem diferente e mais autoral para filmes de super-herói.

É relevante salientar que está no DNA de Logan a inspiração em faroestes clássicos. Os Brutos Também Amam é, aliás, importantíssimo para paralelizar o drama do protagonista (Hugh Jackman) em sua jornada para salvar Charles Xavier (Patrick Stewart) e sua protegida pequena protegida Laura, ou X-23 (Dafne Keen). Mesmo que o referido filme tenha sido filmado em cores, o preto e branco faz pleno sentido quando lembramos de outras obras clássicas do gênero que certamente serviram de inspiração para Logan. E, mesmo que a pegada noir de Logan não fique evidente em um primeiro momento, talvez pelo “vício” causado pelas expectativas do gênero principal em que o filme está inserido, ela está também lá, especialmente na forma como o protagonista mais velho, experiente, alcoólatra e desesperançoso com a vida é minuciosamente trabalhado em uma narrativa de redenção e redescoberta que o faz ver um futuro melhor na figura da jovem que protege. Com a conversão do filme para preto e branco, essas conexões com os filmes noir ficam, portanto, mais salientes e interessantes, algo que também pode ser dito de toda a atmosfera mais lúgubre, depressiva e pesada que o roteiro estabelece logo de início.

Como  mencionei na crítica do filme, o mais emblemático momento, para mim, foi a sucessão de sequências na fazenda da família que acolhe os viajantes por uma noite em determinada altura da projeção. E esse mesmo momento é o que talvez melhor exemplifique o ótimo uso da fotografia em preto e branco, já que grande parte das tomadas são à noite, tanto no interior quanto no exterior na casa, com o contraste do chiaroscuro tornando as sequências ainda mais dramáticas, ainda mais visualmente deslumbrantes. Diria que é nesse ponto que Logan Noir realmente se justifica, realmente paga os dividendos que o projeto essencialmente de vaidade de James Mangold vai além disso e tem efeito transformativo de verdade.

Curiosamente, porém, o efeito inverso acontece especialmente nas sequência iniciais no México, no refúgio em que o ex-Wolverine vive com o debilitado Professor X e também com Caliban, um mutante albino que tem o poder de rastrear portadores do gene X, mas que tem sua pele queimada quando exposta ao sol. Senti falta das cores quentes ali e mesmo a escolha de Mangold de suavizar o contraste para manter o preto e branco mais difuso não funcionou tão bem, seja nas tomadas exteriores, seja nas interiores, notadamente na caixa d’água tombada onde Charles vive sob efeito de drogas. Outro problema é que a maquiagem que empalideceu Stephen Merchant para viver Caliban perde a força no preto e branco, algo que pode ser particularmente sentido no momento em que Pierce (Boyd Holbrook) o tortura com o sol. De maneira semelhante, a ação final na verdejante Dakota do Norte não teve, para mim, o mesmo impacto, ainda que o momento final, com Laura segurando a mão de Logan, funcione muito bem no preto e branco.

Entre vantagens e desvantagens do detalhado trabalho de recalibração de cores de Mangold e companhia, diria que Logan Noir ficou em pé de igualdade com a versão cinematográfica colorida. Enquanto o filme em preto e branco realçou algumas cenas e tornou a conexão com o noir mais direta, o original se vale de suas cores para estabelecer conexões com faroestes e com road movies setentistas. No final, o espectador ganhou um grande filme em duas versões excelentes.

Logan Noir (Idem – EUA, 2017)
Direção: James Mangold
Roteiro: James Mangold, Michael Green, Scott Frank
Elenco: Hugh Jackman, Patrick Stewart, Dafne Keen, Boyd Holbrook, Stephen Merchant, Richard E. Grant, Eriq La Salle, Elise Neal, Elizabeth Rodriguez, Doris Morgado, David Kallaway, Han Soto, Jason Genao, Krzysztof Soszynski, Alison Fernandez
Duração: 137 min.

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