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Crítica | Lilith – Vol. 6: O Rei Macaco

por Kevin Rick
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O Rei Macaco

Apesar do arco narrativo de Lilith ser o elemento principal da série, Luca Enoch sempre fez questão de expor como a crueldade humana, mais necessariamente a contínua brutalidade na História, é um componente de extrema importância para sua obra. Esse traço de realismo trágico injetado à trama sci-fi, bastante inquietante da nossa perspectiva – e também da Lilith -, dá um toque dramático bem aterrorizante e perturbador à leitura. E dentre as aventuras da cronoagente até aqui, o sexto volume da série, O Rei Macaco, nos apresenta a edição mais visceral e impactante da protagonista.

Dessa vez, Lilith acorda em um dos períodos mais brutais da trajetória histórica humana: a Segunda Guerra Sino-Japonesa, mais especificamente o Massacre de Nanquim, que aconteceu em 1937, no qual o Exército Imperial Japonês conquistou a capital chinesa.  Nesse período negro do passado, vemos o povo chinês ser torturado, abusado, fuzilado, usados em experiências e assassinados das formas mais hediondas possíveis, enquanto Lilith se junta a uma combativa comunidade ocidental liderada pelo alemão nazista John Rabe. Mas não se enganem pela predileção política da figura histórica, que utilizava a suástica do terror para ter influência na proteção dos cidadãos de Nanquim, na medida do possível. Tarefa que a nossa querida Lilith decide ajudar enquanto procura o portador do triacanto, assumindo o papel de Sun Wukong, traduzido como o “Rei Macaco”, personagem de uma popular saga local, chamada de Jornada ao Oeste.

O Rei Macaco

Os dois últimos volumes têm o encadeamento dramático similar, utilizando da trama histórica como força principal do roteiro, apesar de trabalharem sobre conceitos diferentes, e mesmo que o sexto volume sustenta o mesmo estilo narrativo, ele é, até aqui, o que mais resigna o núcleo da ficção científica e a busca do portador do espiromorfo para trabalhar sua narrativa autocontida. Até mesmo o oficial japonês que fez uma aparição surpresa em Cavalgando com o Diabo, que aparece aqui na sua linha do tempo “correta”, não ganha muita explicação. E isso não deve ser visto como um ponto negativo, pois Luca constrói uma edição que golpeia o leitor constantemente com o cenário de barbárie e selvajaria. Até a comum explosão de cabeça com os twists das aparições do Cardos não acontece aqui, e nem precisa, afinal, O Rei Macaco é uma leitura chocante do início ao fim, realmente nos situando da ilimitada monstruosidade humana, que só se torna mais trágica ao sabermos que aconteceu na vida real.

Além disso, a forma como o autor elabora a figura mitológica de Lilith continua sendo um dos pontos altos da série, já que temos um vislumbre sentimental das mudanças que a personagem faz nesse campo histórico em O Manto do Urso, e neste período em questão decide tomar para si as fantasias locais com mais afinco, servindo como uma salvadora dos cidadãos de Nanquim, vestindo e se maquiando para incorporar o personagem. Toda a estrutura termina por ser… divertida, em uma espécie de humor macabro, mantendo o leitor em constante torcida para Lilith assassinar os soldados cruéis. E a própria personagem se diverte com toda a situação, recebendo um respiro da missão árdua para servir a um propósito mais “heroico” do que sua comum turbulência moral.

Não é como se a trama principal da série não movesse, ganhando muitos ares de desconfiança no volume. A protagonista começa a duvidar da missão, do seu papel e de seu companheiro Escuro, mas o grande foco do volume é a guerra, e toda a crueldade que a circunda. Luca decide se afastar um pouco da ficção científica, das ideologias e até mesmo de questões culturais, para simplesmente chocar. Por fim, O Rei Macaco até se permite terminar em uma nota otimista, que, aparentemente, não parece ser o destino da protagonista conturbada, mas que, aqui, encontra um pequeno propósito esperançoso em meio ao caos.

Lilith – Vol. 6: O Rei Macaco (Il re delle scimmie) — Itália, junho de 2011
Roteiro: Luca Enoch
Arte: Luca Enoch
Capa: Luca Enoch
Editora: Sergio Bonelli Editore
No Brasil: Red Dragon Publisher, 2020
132 páginas

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