- IMPORTANTE: A partir da edição #26, a Liga da Justiça Internacional muda oficialmente de nome para Liga da Justiça América, mantendo o cumulativo da numeração.
Seguindo-se aos eventos da saga Invasão!, onde a Liga da Justiça Internacional trabalhou ao lado da Mulher-Maravilha nas ilhas Fiji, temos este arco iniciado com uma excelente história concluindo a estadia do grupo no lugar, tendo uma última batalha contra uma desajeitada Liga da Injustiça, aqui, formada por Graúdo, Rei Relógio, Mestre das Pistas, Major Disaster, Poderoso Bruce e Multi-Homem. A história funciona como um bom contraste de comportamento entre as duas entidades e representa Guy Gardner de alguma maneira até que interessante, dentro do possível. Na edição #23, o discurso maldoso desse Lanterna Verde é muito bem acomodado no enredo e serve de ponte entre o lado dos vilões — que passam pelas mesmas brigas vistas na Liga — e o lado dos mocinhos. A dicotomia nos faz pensar no caráter de relacionamento entre os indivíduos dos dois lados da moeda: se são, de alguma forma, amigos e trabalham juntos por muito tempo, com certeza as alfinetadas e os obstáculos de uma relação em grupo irão aparecer. Que bom que o roteiro trouxe isso à tona!
Com a explosão da bomba genética, no final, não são deixadas muitas pistas sobre o que irá acontecer aos heróis dentro da série e, na verdade, as reais consequências ficam escondidas por um tempo, manifestando-se posteriormente apenas em duas pessoas depois que o caso da Invasão! foi resolvido: em Maxwell Lord, que faz uma expedição à caverna onde estava o material deixado por Metron, no arco Quem é Maxwell Lord? e tenta descobrir o por quê ele foi afetado pela bomba genética; e em Fogo, sobre quem falarei mais adiante.
No andamento da série vemos chegar ao fim a busca por heróis que Oberon encabeçava desde o arco passado. Em uma festa oferecida na embaixada da LJI em Nova York, diversos fantasiados são convidados, sem saber por quê, mas aos poucos a verdadeira intenção da festa se revela. Novamente vemos o roteiro investir nas relações pessoais, nas brigas de equipe e impasses de ego que não aparecem de forma intensa enquanto esses heróis estão salvando o dia. O humor do roteiro também se junta à boa representação do conflito de gerações, encabeçado pelo chato do Gavião Negro — o tempo inteiro relembrando as “glórias do passado, da Liga original“, fazendo questão de rebaixar os heróis jovens –, e o esquentadinho do Besouro Azul — que está certo em todas as colocações, mesmo que expresse seus sentimentos de maneira um tanto… desrespeitosa, digamos assim, em relação ao Gavião. Dessa forma, não é surpresa quando ele se demite da Liga (e por tabela, a Mulher Gavião também) no final da edição #24. E para falar a verdade, é algo muito bem-vindo.
Ainda na edição #24 é criada a Liga da Justiça Europa, com sede em Paris. A primeira formação dessa Liga é a seguinte: Homem Animal, Capitão Átomo, Homem-Elástico, Flash (Wally West), Metamorpho, Poderosa, Soviete Supremo e, como membro periódico, Mulher-Maravilha. A festa é um dos grandes momentos do roteiro em termos de fechamento de janelas dramáticas na revista da LJI. Vemos não só a criação de uma nova Liga, mas também a conclusão do “evento Khunds” protagonizado por Oberon um pouco antes. Sem contar que inocentemente, Dmitri, o Soviete Supremo, pede para Oberon perguntar aos possíveis membros da nova Liga se eles “fizeram ou fazem parte do Partido Comunista“, um flerte cômico bem utilizado com um período nada engraçado da história dos Estados Unidos, a “caça às bruxas” do Senador McCarthy, que causa grande desconforto em alguns heróis, mesmo tendo um princípio inocente. Excelente sacada dos autores!
A continuação dessa reunião mostra os heróis tendo que limpar a bagunça e então partimos para uma trama-atalho, quando Besouro e Gladiador são contratados para um serviço externo (capturar um vampiro), trabalho onde tudo sai errado e abre espaço para questionamentos e elementos existenciais para os dois amigos. O que ninguém esperava é que após este conto de reflexão sobre a vida, a vilania e o heroísmo, o Besouro Azul simplesmente enlouquecesse e atacasse Oberon e Max. Pela primeira vez na série a Caçadora fez um cameo, interrompendo a caçada do Besouro, que está agindo por ordem da Abelha Rainha, como depois seria comprovado.
É muito interessante quando saímos dos grandes problemas do mundo, das batalhas em outros planetas e grandes crises galácticas e focamos em histórias pessoais, em elementos humanos que atingem mesmo o mais forte dos heróis. Esta base textual que começou na edição #26 — onde a DC Comis retomou o título Liga da Justiça América nas capas, porém, mantendo a numeração cumulativa e a classificação de “Internacional” para o grupo — e que seguiu até a edição #29, foi o primeiro grande mergulho em personagem que os escritores fazem desde Um Novo Começo, considerando aí os textos das revistas mensais, claro.
A ótima arte de Ty Templeton, que ficou a cargo dos desenhos das edições #27 e 28, chama a nossa atenção. A aparência mais limpa de finalização, a organização simples e elegante dos cenários internos (o artista explora bastante os espaços vazios dos quadros, o que é ótimo) e uma boa sequência de ângulos e movimentação dos heróis colocam essas edições como as visualmente mais interessantes, em ambiente urbano, que tivemos até agora — no espaço, as campeãs s são as do arco Compre… ou Morra –, admiração que cai um pouco quando Templeton divide os créditos com outros artistas.
Amanda Waller é chamada para desprogramar o Besouro Azul, mas nada sai como deveria. Esta parte da trama, que dá nome ao arco, é uma mistura de O Exorcista (1973), como nos indica a simples, não original, mas excelente capa de Kevin Maguire, com consequências tardias de aventuras anteriores da Liga. Neste ponto, volta a assombrar a última viagem que os heróis fizeram a Bialya, em Compre… ou Morra, momento que serviu para Queen Bee programar Kord e o Gladiador Dourado, inserindo também impedimentos vitais (o chamado Azrael Block) caso alguém tentasse desprogramar suas “marionetes”. Neste ponto, o roteiro dá uma pausa no humor e investe em uma história densa. Claro que em um momento ou outro podemos perceber gracinhas, especialmente vindas de Guy Gardner (logo, gracinhas odiosas), mas o texto dosa bem esse tipo de linha narrativa com o momento delicado. O coma do Besouro e o cameo de Nabu no corpo de Kent Nelson são os maiores destaques no fim da edição #28.
Como não podia deixar de ser, há o momento péssimo do arco, e isso se dá com o encontro pseudo-romântico entre Gelo e Guy Gardner, que obviamente dá errado. A única coisa que se aproveita dessa saída dos dois é a aparição do Mão Negra, que leva uma surra e, por sua neurose, garante umas boas risadas do leitor. Já a amiga de Gelo, Fogo, está tentando lidar com as consequências da boba genética de Invasão!. Mas nada relacionado a esta parte do roteiro parece funcionar. É muito estranho ver alguém aprendendo a usar poderes fora de uma história individual e bem explorada, ainda mais quando isso acontece com uma personagem coadjuvante. Temos a impressão de que a heroína brasileira não tinha poder nenhum e nem sabia o que estava fazendo antes de ficar “doente” por conta dos efeitos da BG.
A retirada do bloqueio da mente do Besouro Azul é simplesmente hilária. Tudo bem que há uma certa dificuldade no roteiro, onde se misturam o didatismo dos autores em explicar quem é Nabu e o que ele faz no corpo de Kent Nelson, que… bem… está morto; e o que ele é capaz de fazer, mas isso não atrapalha o momento. Na verdade, é utilizado como elemento cômico e funciona muito bem. De uma certa forma, a entrada de Nabu na mente do Besouro para “livrá-lo de si mesmo” me lembrou outra jornada mental, só que da editora concorrente, quando Xavier entrou na mente de David Haller, o Legião, na revista dos Novos Mutantes. A conclusão do problema com o Besouro é bem estruturada e tem um ótimo ponto final, quando o mesmo processo é feito com o Gladiador Dourado, mas fora dos quadros. A opção por não mostrar a cena foi perfeita, pois não lidamos com a repetição e ainda nos divertimos em saber que o mesmo espanto de mudança de corpos aconteceu com os dois melhores amigos, o melhor bromance da DC na época.
Este bloco de histórias termina na edição #30, com a resolução do roubo do carro de Barda e a Mega-Rod (poderosa arma de energia e transporte espacial oriunda de Apokolips) que um jovem punk rouba e usa inadvertidamente, tornando-se um assassino e sendo consumido pelo ódio que emana do objeto. A grande surpresa vem nas páginas finais, com Max novamente colocando as asinhas de fora, forçando a Caçadora a juntar-se à LJI através de seus recém-descobertos poderes. Está na cara que isso é algo que não acabará bem.
Liga da Justiça Internacional #23 a 25 e Liga da Justiça América #26 a 30 (Justice League International / Justice League America) — EUA, janeiro a setembro de 1989
Roteiro: Keith Giffen, J.M. DeMatteis
Arte: Kevin Maguire (#23), Ty Templeton (#24 a 29), Mike McKone (#25, 28 e 29), Bill Willingham (#30)
Arte-final: Joe Rubinstein (#23 a 30), Dick Giordano (#27)
Cores: Gene D’Angelo (#23)
Letras: Bob Lappan (#23 a 26), Albert DeGuzman (#27 a 29)
Capas: Kevin Maguire, Joe Rubinstein
Editoria: Kevin Dooley, Andrew Helfer
24 páginas (cada edição)
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LJI Anual #3: Volta ao Mundo com a Liga da Justiça
O Homem que Nunca Fui
O primeiro e principal conto do Anual #3 mostra uma jornada da Liga da Justiça Internacional (aqui não existe a separação entre “América” e “Europa”) pelas principais embaixadas da Liga ao redor do mundo. Eles visitam Japão, Brasil, URSS, Austrália e França, tendo recepções e pequenos “problemas” em cada um desses lugares. É uma jornada de reconhecimento e conhecimento ao mesmo tempo, que Giffen e DeMatteis sabem aproveitar até certo ponto, utilizando de boas piadas e rixas recentes (o Capitão Átomo que o diga) para temperar melhor a história.
O ruim dessa jornada é que a presença da comitiva humilde de Kooey Kooey Kooey está completamente deslocada. Mesmo que exista uma linha política muito interessante a ser levada em conta (apesar do humor, desde Um Novo Começo os autores têm mostrado muito das mudanças e impasses sociais do final dos anos 80), o leitor se perde um pouco na intenção final, que não tem um bom desfecho, pois passa por uma quebra total de narrativa, saindo da visita diplomática para uma estadia dos heróis na ilha. Sem contar que uma porção de historinhas paralelas ficam sem conclusão no anual.
Já o segundo conto, intitulado The Man I Never Was, tem um apelo bem maior e um desenvolvimento mais interessante. Trata-se de uma história focada no Caçador de Marte, que perde um antigo parceiro, de quando ele era policial, e sai em uma investigação ensandecida que conta com a participação do Batman no meio do caminho. O enredo dispõe de vários solilóquios, principalmente para o Caçador, que está atormentado, triste, e começa a fazer algumas coisas preocupantes, para depois entrar em jejum, meditar, assumir sua forma original e assustar Oberon.
Exitem mais mistérios e dependência de eventos externos do que deveria aqui e este me parece ser um erro que Giffen e DeMatteis não conseguem corrigir direito. Já são 3 anuais com histórias que ou são péssimas (caso do Annual #2) ou não são escritas como algo que consegue se segurar sozinho. De qualquer forma, a trama aqui é bastante válida. Ela mostra um lado pouco visto de J’onn no cotidiano da Liga e segue uma trilha de crime urbano sem motivo que nos lembra as origens do Morcegão e nos faz pensar que nem mesmo os super-heróis conseguem proteger a todos e evitar que tragédias ocorram com eles mesmos ou pessoas queridas à sua volta.
Justice League International Annual #3 (EUA, 1989)
Roteiro: Keith Giffen, J.M. DeMatteis
Arte: Mike McKone (conto 1) e Tim Gula (conto 2)
Arte-final: Pablo Marcos, Bruce D. Patterson (conto 1) e Tim Gula (conto 2)
Cores: Gene D’Angelo
Letras: Albert DeGuzman (conto 1) e Tim Harkins (conto 2)
Capa: Mike McKone, Joe Rubinstein
Editoria: Andrew Helfer, Kevin Dooley
64 páginas