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Crítica | Liga da Justiça de Zack Snyder: Justiça é Cinza

por Davi Lima
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Assim como o filme Batman vs Superman: A Origem da Justiça teve sua Versão Estendida, Liga da Justiça de Zack Snyder teve seu Justiça é Cinza. Enquanto o filme de 2016 teve acréscimos de minutagem, essa versão monocromática do filme de 2021 é puro apelo estético. Segundo Zack Snyder, essa versão cinza representa o que foi sua jornada quanto ao filme Liga da Justiça e porque era nessa cor que estava gravado em seu computador. Ano passado, Mank trouxe o preto e branco como tema central para as discussões fílmicas, em vista que David Fincher, expert em efeitos visuais, havia aproveitado contextualizações temporais da década de 30 e 40 de Hollywood e o seu método narrativo de artificialidade das imagens para empregar o filme sem cores na experiência cinematográfica. Já esse acinzentamento dos “heróis” em Liga da Justiça de Zack Snyder: Justiça é Cinza parece buscar uma atemporalidade da imagem, junto com o aspecto 4:3 da tela, e a homogeneização dos efeitos visuais artificiais com o realismo.

O famoso Snydercut, assim como quase todos os filmes de Zack Snyder, especialmente desde 300, apresenta uma carga de efeitos visuais muito forte. O uso de tela verde, o chamado chroma key, é a tela de pintura do diretor, buscando profundidade de campo, com gotículas de água e poeira esvoaçando, e facilitando a implementação da câmera lenta como instrumento de sequenciamento da ação. Snyder busca criar uma relação simbiótica com os quadrinhos, também arte sequencial como o cinema, desde Watchmen, com referências diretas às imagens ilustradas por Dave Gibbons.

Assim, ao mesmo tempo que os filmes do diretor parecem insistir em criar um novo universo em tela, também esbanja para o espectador que o cenário de seu filme é visivelmente falso. Com o preto e branco, em Liga da Justiça de Zack Snyder: Justiça é Cinza, uma regulação de filtro digital, pois Snyder não gravou com câmera em preto e branco, como David Fincher fez, toda a artificialidade dos efeitos visuais do cineasta é reduzida, provocando um apelo para o delinear da fotografia de Fabian Wagner e os artistas da pós-produção em efeitos visuais.

Se o filme colorido já apresentava um tom de luto e de acinzentamento, como uma sépia que fragiliza as cores pouco vibrantes, com a adição do preto e branco as cores deixam de ser distrações, revelando o trabalho de luz aprimorado para a fotografia de Wagner. As cidades ficam mais brilhantes com os pontos luminosos, a armadura do Lobo da Estepe perde o prateado puro e se torna ainda mais reluzente, entre outros momentos que a junção da prática da fotografia com a pós-produção de alinhar reflexos na metalização, que Snyder tanto ama, aporta uma narrativa menos tediosa e mais escultural dos personagens.

Entre as harmonias e as contradições do filme, essas proporções se invertem se tomam o mesmo resultado. Se o longa de quatro horas parece mais vivo, colocando o detalhismo de Snyder à tona, morre, também, o lúdico mínimo que o diretor usa para associar aos quadrinhos. Enquanto a proposta de tornar a Liga da Justiça em um grupo de deuses, não heróis, parece mais coerente com o preto e branco, formando estátuas de mármore antes mesmo delas se moldarem no ato final do filme, a contradição temporal desses seres agindo contemporaneamente, usando figurinos sem cores, apenas reflexos luminosos em tonalidades de cinza, questiona a homogeneização atemporal da era dos “heróis” que quer se discursar na simultaneidade na viagem do tempo de Flash. Soa como a metáfora do espectro, em que na linha entre o branco mais branco e o preto mais preto, dentro de uma escala monocromática, a versão de Zack Snyder alcançasse uma altura grega de bronze, com o aspecto 4:3 e a ausência de cores, mas evidenciasse um mito digital quando a correção do filtro revelasse o VFX que borra em alguma explosão de luz, por exemplo.

Além disso, vale ressaltar, com o método barroco que Snyder enxerga seus filmes, com a dialética de um endeusamento e uma individualidade libertária humana, dualismos basilares e como o diretor projeta cenas com penumbras, – como de Alfred e Bruce entre o Batmóvel, e de Martha e Lois Lane – explode-se essa visão autoral em tela com esse preto e branco, como também revela as conveniências de roteiro mais explosivas quando a imagem entrega tanta homogeneidade. Como um filme incauto, longo e necessitando de uma composição ordinária de momentos para incrementar videoclipes de apresentação, Liga da Justiça de Zack Snyder: Justiça é Cinza mostra mais os exageros da narrativa.

Fora o detalhismo exacerbado e a iluminação mais chamativa para avaliação, acompanha-se a isso os abafamentos de cansaços visuais de cores que Snyder nunca pareceu se importar tanto. O céu se torna mais real e todo o filme parece mais realista, e, até certo ponto, cinematograficamente falando, atemporal pelo seu quesito estético do preto e branco. Mas a incoerência de mirar nos gregos, a todo momento, querendo ser relevante em heroísmo para os tempos atuais, grita deuses, não heróis.

Por sinal, dando um grito de intruso nesse ótimo e sereno texto, é preciso dizer que a única coisa que havia sido digna de elogio de mudança no Snydercut, em que ele consegue mudar realmente pra melhor, no caso, a volta do Superman; o mito snydeus disse na internet que a real motivação do azulão não dizimar a equipe da Liga da Justiça foi ver a Lois Lane grávida. Se o preto e branco não muda algo na percepção do filme, essa explicação muda. Se já não bastasse as explicações técnicas do 4:3, ou essa versão cinza para vestir o filme como cult, Snyder vai superando Darren Aronovsky sobre explicações de Mãe!. Isso fomenta teorias que vão mudando o filme, como ser possível enxergar o Batman viajante do tempo por aí. Se o preto e branco e o aspecto da tela já não servisse, o snyderverso continua se modificando fora do filme.

Por fim, para alguns o preto e branco pode não mudar nada, sendo apenas mais um filtro trabalhoso que Snyder simbolicamente quis definir sua obra de arte no computador e quis entregar para os fãs. Para outros, se o estilo do diretor clipesco era avassalador, podem se apaixonar mais ainda. No entanto, é importante lembrar como uma fotografia é determinante para a experiência de um filme, como um aspecto 4:3 que engrandece o Superman em tela, e almeja o Imax, como já disse o diretor, e como o preto e branco normaliza as faixas pretas na laterais, exatamente por pertencer à mesma matiz de preto e branco. Caso o espectador queira botar a conta em risco em relação a filmes, pense na fotografia, mas não apenas na mais bela, e sim na melhor que compõe a narrativa.

  • O parágrafo de cor verde foi escrito pelo famoso Pedro de Lara do site, que amou demais (só que não) esse filme do Zack Snyder. E a cada nova explicação do diretor sobre o Snydercut e mais comentários na crítica com spoilers do site, Iann Jeliel manda novos áudios para seu amigo: eu. Acrescento algo que ele disse: “E depois eu que sou chato em dizer que esse trem só é feito pra fã. E eu amo o filme mãe!, só para ficar claro”.
  • Aviso: alguns rumores apontaram para novas cenas do Coringa nessa versão Justice is Gray, mas elas não existem ou, pelo menos, não foram inseridas nesta nova versão (quem sabe em outra?).

Liga da Justiça de Zack Snyder (Zack Snyder’s Justice League | EUA, 2021)
Direção: Zack Snyder
Roteiro: Chris Terrio (baseado em história de Zack Snyder, Chris Terrio e Will Beall)
Elenco: Ben Affleck, Henry Cavill, Gal Gadot, Diane Lane, Jared Leto, Ezra Miller, Jason Momoa, Connie Nielsen, J.K. Simmons, Robin Wright, Amy Adams, Karen Bryson, Kiersey Clemons, Jesse Eisenberg, Ray Fisher, Amber Heard, Ciarán Hinds, Jeremy Irons, Lisa Loven Kongsli, Harry Lennix, Joe Manganiello, Joe Morton, Ann Ogbomo, Ray Porter, Samantha Win, Ryan Zheng, Mark Arnold, Gianpiero Cognoli, Willem Dafoe, Peter Guinness, Swaylee Loughnane, Eleanor Matsuura, Lara Decaro, Russell Crowe, Kevin Costner, David Thewlis, Michael McElhatton, Billy Crudup
Duração: 242 minutos

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