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Crítica | Labirinto de Paixões

Um labirinto de paixões, narrativas e sexualidade.

por Rodrigo Pereira
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Riza Niro e Sexilia sentados em um sofá tomando café.

A escolha do diretor Pedro Almodóvar em contar a história de Labirinto de Paixões através de quatro núcleos narrativos possui bons e maus momentos. A ninfomaníaca Sexilia (Cecilia Roth), o terrorista gay Sadec (Antonio Banderas), o príncipe do Tiran, Riza Niro (Imanol Arias), e Queti (Marta Fernández Muro), a filha do dono de uma lavanderia, têm suas histórias otimamente interligadas pelos conflitos com seus progenitores. Entretanto, o mesmo não acontece com tudo que envolve a ação terrorista.

O foco da trama se dá com Riza Niro exilado em Madrid, onde conhece Sadec e Sexilia, se envolvendo sexualmente com ele e se apaixonando por ela, seu primeiro relacionamento heterosexual. Após conhecer e cair de amores por Sexilia, o príncipe se disfarça como cantor de uma banda para despistar Sadec e seus parceiros, que pretendem sequestrá-lo e pedir um resgate para financiar suas ações. Em meio a essa loucura, Queti se aproxima de Sexilia e a ajuda com a conturbada relação com seu pai, o que possibilita a separação da obra em duas.

A primeira é aquela em que se encontra o melhor da projeção. É onde Almodóvar usa os tormentos de suas personagens para expor e refletir sobre conflito geracional e as relações entre pais e filhos (inclusive, do ponto de vista sexual). Como é comum do diretor, ele aborda esses temas tradicionalmente considerados tabus sem nenhum moralismo, trazendo até a ciência, representada pelo Dr. de la Peña (Fernando Vivanco) e pela psicanalista Susana Díaz (Ofelia Angélica), para tentar melhor compreender esses fenômenos.

E o realizador faz isso de maneira cômica e divertida. Enquanto de la Peña é um ginecologista muito conhecido por ser pioneiro na inseminação artificial e lidar com isso diariamente, ele é totalmente avesso ao sexo. Já Díaz é uma psicanalista lacaniana, o que traz a comicidade pelo fato do Complexo de Édipo, conceito que aborda a atração sexual do filho pela mãe e está representado no filme, pertencer a Freud, não Lacan.

Como o sexo está presente ao longo de todo o filme, a forma cômica escolhida por Almodóvar funciona bem. Desde as relações entre os jovens, que ocorrem a todo instante e sem pudor, refletindo não só o espírito rebelde e experimental da juventude mas também dos anos de 1980, época em que ocorre a fita, até as que envolvem os mais velhos, a opção pela comédia traz leveza para as situações, sugerindo como essas relações deveriam ser, independente por quem sinta-se desejo.

Aliás, não é por coincidência que temas como a resistência ao sexo (Dr. de la Peña) e o estupro (pai da Queti) sejam representados por personagens masculinos e mais velhos. A única personagem do grupo mais velho que não se encaixa no perfil mais “conservador” é justamente a psicanalista Díaz, muito mais resolvida com essas questões, interessada no assunto e com comportamento radicalmente oposto ao de, por exemplo, de la Peña.

Outros recursos utilizados pelo cineasta para abordar esse assunto são o figurino e a maquiagem. É interessante como as vestimentas das personagens se alteram conforme sua relação com o sexo muda. De muita maquiagem, cores e roupas extravagantes quando está libertino para vestimentas e maquiagem mais sóbrias, com tons mais frios e quase sem variação de cor quando está somente com um parceiro ou fechado para aventuras.

Apesar de todas essas qualidades, são características restritas ao que considero a parte boa da obra. A segunda parte, que vejo sem interesse e quase completamente desconectada da construção do diretor até aqui, é sobre toda a trama envolvendo o grupo terrorista de Sadec e suas intenções de sequestrar Riza Niro.

Mesmo que haja a relação sexual entre as duas personagens citadas, é disparado o núcleo com menos espaço de tela, com menos desenvolvimento e que, arrisco dizer, influenciaria muito pouco no desfecho da obra caso fosse removido. Não à toa, é o único núcleo em que a personagem destaque não possui a presença paterna e/ou materna, o desconectando dos outros três e de seus dilemas familiares.

Sendo apenas o terceiro longa da carreira de Almodóvar, Labirinto de Paixões apresenta praticamente todos os elementos que tornaram o realizador espanhol um gigante dentro da sétima arte. Através da comédia, ele aborda bem assuntos relacionados à sexualidade e cria um universo que funciona dentro dessa lógica, apesar da dispensável trama terrorista.

Labirinto de Paixões (Laberinto de Pasiones) – Espanha, 1982
Direção: Pedro Almodóvar
Roteiro: Pedro Almodóvar, Terry Lennox
Elenco: Cecilia Roth, Imanol Arias, Helga Liné, Antonio Banderas, Marta Fernández Muro, Ofelia Angélica, Fernando Vivanco, Concha Grégori, Ángel Alcázar, Eva Siva, Fabio McNamara, Pedro Almodóvar, Poch, Cristina Sánchez Pascual, Luis Ciges, Agustín Almodóvar, María Elena Flores, Ana Trigo, Javier Pérez Grueso, Santiago Auserón, Paco Pérez Bryan, José Carlos Quirós, Charly Bravo, Zulema Katz, Marcela Amaya, Jesús Cracio, Mercedes Juste, Lupe Barrado, Javier Ulacia, Teresa Tomás, Socorro Siva, María del Carmen Castro, Eva Carrero, Helena Ramos, Ouka Leele, Enrique Naya, Juan José Carrero, Carlos García Berlanga, Rubén Olivera, Pablo Pérez Mínguez, Guillermo Pérez Villalta
Duração: 100 min.

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