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Crítica | Kung-Fusão

por Gabriel Zupiroli
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Um dos maiores méritos de Kung-Fusão é precisamente assimilar as influências e os estereótipos ao seu redor de maneira extremamente consciente. Trata-se de uma obra que entende com clareza sua proposta e suas limitações, subvertendo muitas vezes os próprios limites em função de uma busca ainda maior do espectro fantasioso-humorístico. Tudo isso pois é exatamente essa questão que o filme aborda: um conto fantástico envolvendo kung-fu e a procura de si mesmo em meio à jornada.

No filme, acompanhamos um protagonismo espalhado, descentralizado em relação aos personagens, estendendo-se majoritariamente à vila em que se passa a narrativa, do que a um ou outro sujeito em si. Em meio a isso, temos pequenas histórias que se entrelaçam: a dos três guerreiros que primeiramente protegem a vila, a do casal que administra o lugar, a do vilão da Gangue dos Machados, e a que aspira a algum protagonismo, de Sing, um jovem perdedor que tem o sonho de se tornar um lutador.

É em meio a esse cenário fragmentado que emerge a grande habilidade do filme de manejar as influências em vias do humor e da ação estereotipada. Temos toda uma recapitulação da encenação tradicional de filmes de luta, assim como o uso escrachado de elementos de humor já presentes em obras anteriores. A diferença é que Kung-Fusão não se leva a sério. Tudo que é abordado ao longo da obra está entregue ao campo do absurdo, sem se importar em elaborar uma formalidade que apenas poderia podar seu potencial. A entrega corajosa do filme é o que permite ao espectador assistir e pensar: “Ok, eu aceito isso”.

A problemática surge quando a liberdade visual e espacial ensaiada se mostra limitada justamente por conta das aberturas. O filme ao mesmo tempo em que se permite extrapolar, acaba se podando pelas inúmeras possibilidades que abre sem o devido controle. É justamente por isso que, em dado momento, parece que não há mais nada a dizer. E ele se estende, estende e estende em função de um brilhantismo imagético com a intenção de sempre superar o anterior, mas que não se sustenta por simplesmente não ter nada a dizer. Um dos problemas, é claro, do protagonismo descentralizado, por mais que seja muito interessante a narrativa que caminha sem um propósito, com o objetivo único de espetacularizar através da imagem da luta e do humor.

Kung-Fusão é um filme que delibera com muita consciência seus limites e trabalha perfeitamente sobre eles. É assim que consegue extrair uma boa paródia ou mesmo um bom filme desinteressado em meio àquele cenário todo. Mas, às vezes, conhecer-se demais leva a muita confiança em si mesmo. E esse é o problema quando a obra possui uma visão tão vasta e jocosa que acaba por perder o controle e a ciência de suas próprias fronteiras.

Kung-Fusão (功夫) – China, Hong Kong, 2004
Direção: Stephen Chow
Roteiro: Stephen Chow, Lola Huo Xin, Tsang Kan-Cheung, Man Keung Chan
Elenco: Stephen Chow, Yuen Wah, Yuen Qiu, Lam Tze-chung, Bruce Leung Siu-Lung, Eva Huang
Duração: 99 min.

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