Home QuadrinhosOne-Shot Crítica | Krishna e Narakasura: Confiança Versus Arrogância

Crítica | Krishna e Narakasura: Confiança Versus Arrogância

Abuso de poder e fim de um reinado de terror.

por Luiz Santiago
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Das 5 histórias presentes no encadernado Stories of Krishna, publicado pela editora indiana Amar Chitra Katha, esta é a única da qual eu já tinha algum conhecimento prévio, e talvez por isso foi a que menos gostei em termos de escolhas narrativas. O roteiro de Kamala Chandrakant não cede um único momento de espaço ativo para Satyabhama, a terceira mulher de Krishna, que possui um papel importantíssimo no mito original (na verdade, é ela quem dá o golpe final e mata o vilão). Ao contrário, a personagem é tratada como uma “mulher comum“, meio insatisfeita com a partida do amado para uma luta e só por isso é que ele acaba levando-a para a saga contra Narakasura. As falas de Satyabhama aqui são apenas de uma observadora espantada que faz questão de participar de um embate onde não tem nada para oferecer, ao contrário, está ali apenas para gerar mais preocupação para o esposo, que precisa romper os obstáculos de seu inimigo e também proteger a mulher. É horrível e bem diferente do conto original (pelo menos o que eu conheço, não sei se existe outra versão), onde Satyabhama não só tem uma grande participação, como também fala e se enraivece com a situação das mulheres sequestradas por Narakasura.

A trama começa com uma ação que pode deixar muita gente com perguntas, então vou começar a analisar o enredo a partir de um contexto que creio ser necessário. A deusa Bhumi, que é a personificação da Terra, foi sequestrada pelo demônio asura chamado Hiranyaksha, que a levou para as águas profundas do oceano. A primeira cena do quadrinho é justamente o momento de seu resgate dessa prisão: quando encarnou como Varaha, seu terceiro avatar, que tinha forma de javali, o deus Vishnu retirou Bhudevi das profundezas do oceano e com ela teve um filho (há, porém, uma versão da história em que esse filho era, na verdade, de Hiranyaksha). O nome desse filho era Narakasura, que cresceria para atormentar a vida de milhares de pessoas e de dezenas de deidades vivendo na Terra.

A maneira como o texto apresenta esse início de reinado de terror protagonizado por Narakasura é bom, mas seria ainda melhor se o escopo de motivações do personagem fosse expandido. Aqui ele é retratado apenas como um malvadão conquistador e nada mais, exposição que pode até funcionar para vilões em histórias que possuem foco em outras coisas ou que trazem eventos transversais que precisam muito mais de explicações, só que nada disso é o caso aqui. Narakasura é um personagem que precisava de mais exposição dramática e mais diálogos para torná-lo interessante e fazer com que sua batalha final contra Krishna não fosse apenas uma questão de força, mas de domínio também em outras esferas.

Diferente dos outros contos de Krishna lançados pela Amar Chitra Katha, este aqui possui uma boa quantidade de grandes animais participando das lutas, o que adiciona um sabor todo especial à saga. A trama começa, aliás, com a ação de um poderoso animal, o javali encarnado de Vishnu. Mas durante o desenvolvimento do enredo vemos ainda os elefantes especiais de Indra e a águia voadora Garuda, que é invocada por Krishna e ajuda-o a vencer parte das primeiras provações colocadas em seu caminho pelo seu inimigo (montanha, tsunami e barreira de fogo). Na sequência final de batalhas, há uma boa cadência de eventos e também uma boa escolha de como cada combate vai intensificando até terminar com a grande derrota de Narakasura (aqui, degolado pelo disco de Krishna) e restabelecimento da ordem no reino, inclusive com novo rei coroado (um filho do rei morto) e roubos e sequestros devolvidos a quem pertencem. É um final coeso e orgânico, embora não tenha nada grandioso ou narrativamente aplaudível, assim como o seu desenvolvimento.

Krishna e Narakasura: Confiança Versus Arrogância (Krishna: Confidence versus arrogance) — Índia, 1978
Roteiro: Kamala Chandrakant
Arte: M. N. Nangare
Editoria: Anant Pai
34 páginas

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