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Crítica | Juramento de Vingança

por Luiz Santiago
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A produção de Juramento de Vingança (1965) foi bastante conturbada e traumática tanto para a Columbia Pictures quanto para Sam Peckinpah e o grande elenco do filme. A constante embriaguez do cineasta e os conflitos verbais e físicos que teve com o elenco de apoio acabaram fazendo com que o estúdio suspendesse a agenda de filmagens, já na reta final, e só aceitasse retornar com Peckinpah na direção após a firme defesa de Charlton Heston em relação ao diretor, que, curiosamente, também havia se desentendido com o ator semanas antes. O resultado final das filmagens, no entanto, não foi positivo. Peckinpah simplesmente não parava de beber e foi Heston quem dirigiu boa parte das cenas finais do filme.

Já na pós-produção, o material filmado sofreu largas mudanças, começando pela quase onipresente e épica trilha sonora de Daniele Amfitheatrof (que Peckinpah não aprovava, porque achava desconexa do filme e longa demais) e terminando com os severos cortes na edição final, retirando sequências preciosas para o diretor e fazendo com que o filme tivesse um final questionável, incompleto e abrupto, um verdadeiro e inaceitável “não-final”.

É por isso que existem três versões de corte para este filme. A primeira, oficial do cinema, com 123 minutos de duração. A segunda, resultado da restauração realizada em 2005, com adição de belos temas musicais compostos por Christopher Caliendo e com 136 minutos. E a terceira, chamada de “versão do diretor”, com 152 minutos. A presente crítica é baseada na versão restaurada, lançada em 2005.

O roteiro de Juramento de Vingança, escrito a seis mãos, é uma mescla de elementos literários, históricos e cinematográficos que Peckinpah já pretendia realizar desde Pistoleiros do Entardecer (1962), o filme que lhe permitiu ser olhado com maior respeito pelos estúdios, pela maioria do público e pela crítica cinematográfica.

O diretor e seus parceiros de escrita, Harry Julian Fink e Oscar Saul, trouxeram os eventos da Guerra Dakota de 1862 como componentes históricos do filme e criaram uma estrutura dramática que lembrava Moby Dick, de Herman Melville. A base central do texto é a perseguição apaixonada que o Major Amos Dundee empreendeu contra Sierra Charriba, um Apache que junto de seu lendário Exército tirou dos colonos enormes extensões de terras do Texas e matou um enorme contingente de soldados da Cavalaria Americana.

A proximidade do enredo com os temas recorrentes favoritos de outro grande diretor, John Ford, fez muita gente perguntar se não haveria sido melhor o estúdio ter entregue a direção da fita a ele, em vez de ao irascível Peckinpah. Mas a questão é que o “diretor maldito” deu a Juramento de Vingança uma abordagem tão interessante, que mesmo considerando todos os problemas de produção, os cortes criminosos feitos pela Columbia e a imperdoável forma como o filme teve de ser finalizado, o espectador aprova sua assinatura e entende que Juramento de Vingança é um filme grandioso e que se tornaria menos impactante – no sentido de uso da violência e crueza no trato dos personagens – se fosse dirigido pelo mestre John Ford, cuja proposta artística e modo de ver o Oeste eram outras.

O que impressiona no longa é a forma como Peckinpah realizou aproximações estéticas e conceituais com outros filmes, tendo já o ponto histórico e literário sido estabelecido. Podemos destacar aqui a cantoria da cavalaria ao sair do Forte Benlin como referência Paixão dos Fortes (filmes que Peckinpah adorava); inúmeras referências temáticas a Sangue de Heróis, especialmente na construção do personagem de Heston; e ainda cenas que homenageavam gráfica ou conceitualmente eventos de Rio Vermelho (1948), Rio Bravo (1950), A Fera do Forte Bravo (1953), Rastros de Ódio (1953) e, pasme, Lawrence da Arábia (1962).

E como se não bastasse o roteiro bem escrito e as ótimas locações no México, o filme ainda conta com um elenco afinadíssimo, destacando-se com grandeza os personagens de Charlton Heston e Richard Harris, uma relação que funciona em vários níveis durante toda a projeção e que só alcança um ponto negativo no final, não devido a interpretação do atores, é claro, mas à forma como o texto e especialmente a montagem colocaram a vírgula que separou os dois homens na luta contra os franceses, em território mexicano.

Juramento de Vingança é um grande exemplo de como o estúdio pode estragar um excelente filme e de como Sam Peckinpah acumulou críticas dos grandes produtores e recebeu a fama de “maldito” em Hollywood. Mas a despeito de todos os obstáculos, sua obra alcançou aqui um alto nível e, definitivamente, nos garante uma ótima sessão, colocando em cena as ambições pessoais de um militar disfarçadas de serviços prestados à nação, além de trabalhar temas como deserção, imigração e alistamento de homens negros no Exército. Como complemento, o espectador ainda vê que em meio a tanta brutalidade há espaço no filme para um humor sutil e para temas bastante humanos e inesperados como a descoberta da vida sexual por parte de um jovem soldado e, numa linha paralela ao tema central, o impasse das relações de amizade frente ao dever militar, temática que culmina na vitória amarga do Major protagonista após sua jornada mortal cheia de perdas e poucos ganhos pelas pradarias texanas e terras mexicanas.

Juramento de Vingança (Major Dundee) – EUA, 1965
Direção: Sam Peckinpah
Roteiro: Harry Julian Fink, Oscar Saul, Sam Peckinpah
Elenco: Charlton Heston, Richard Harris, Jim Hutton, James Coburn, Michael Anderson Jr., Senta Berger, Mario Adorf, Brock Peters, Warren Oates, Ben Johnson, R.G. Armstrong
Duração: 136 min.

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