Home QuadrinhosOne-Shot Crítica | Júlia Kendall – Vol. 2: Objeto de Amor

Crítica | Júlia Kendall – Vol. 2: Objeto de Amor

por Luiz Santiago
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Lançado em novembro de 1998, Objeto de Amor dá sequência aos eventos de Os Olhos do Abismo, numa perseguição policial e analítica (por parte da criminóloga Júlia Kendall) à serial killer Myrna Harrod, que conseguiu escapar da polícia no nietzschiano caso dos profundos e medonhos olhos, narrado no volume de estreia da série. Como era de se esperar, as questões familiares ainda estão em voga e ganham outro relevo no presente livro, uma vez que Myrna procura pistas do paradeiro de sua mãe desaparecida, esta também com uma vida cheia de eventos trágicos, uma espécie de amontoado de desgraças pessoais e coletivas que marcam os gialli mais complexos, em qualquer mídia.

Durante a leitura, eu não consegui conter exclamações de horror diante do que estava acontecendo, e vejam, nós estamos falando de um quadrinho! É impressionando a qualidade da estrutura psicológica com que o escritor Giancarlo Berardi guia os eventos a ponto de nos deixar mal e chocados pela quantidade de mortes e pela crueza e realismo com que as cenas dessa série nos são mostradas. A trilha de sangue deixada por Myrna não é apenas chocante como um evento em si — as mortes são cruéis, detalhadas e ilustradas com precisão agonizante por Corrado Roi — mas possuem excelentes contextos e em pelo menos um deles (o primeiro, com o infame mendigo) mexe com o lado moral do leitor. Após a entrada de Myrna em cena, observamos de perto uma relação de fuga no estilo “gato e rato” entre ela e a polícia. A partir de certo ponto há a companhia de Ruby, uma garota com algum problema cognitivo e vários problemas emocionais que passa a seguir a assassina como uma “colega de aventuras”.

Devido à falha na análise e perseguição à assassina cometidas em Os Olhos do Abismo, Júlia segue obcecada pelo caso. Em paralelo, o texto traz novamente à tona mistérios interessantes sobre a sua vida, coisas que ainda não sabemos do que se trata, mas sobre as quais a personagem escreve em seu diário e fala sobre isso em doses homeopáticas, como o passado com Phil, seu ex interesse amoroso, e um certo “caso que mudou sua vida e seu espírito para sempre“. Há uma bonita cena da personagem visitando a avó em um asilo e outra um pouco angustiante dela falando com a irmã ao telefone, numa relação difícil que o texto, mais uma vez, torna realista em diversos aspectos, inclusive na escolha do que contar e do que não contar para o leitor através desses diálogos meio tímidos, meio honestos, meio agressivos e controladores.

Julia Kendall #2 - objeto de amor plano critico

No momento em que chegamos à busca do jornalista Graham, eu já estava sem fôlego, pedindo para que não houvessem mais mortes. O mergulho que fazemos aqui é tão grande, que nos importamos até com os coadjuvantes e temos a larga impressão de que coisas horrendas devem acontecer nos próximos quadros. O suspense criado e a maestria do autor ao guiar as cenas e o clímax é tao grande que a gente não quer que a história acabe, mesmo quase roendo as unhas durante a leitura. Exceto por alguns diálogos pouco amarrados no início do volume e a maneira meio abrupta como a revista termina (questões mínimas dentro de uma trama rica e de altíssima qualidade) Objeto de Amor é uma grande história de investigação e assassinatos, fazendo jus à boa fama do título. Fico espantado que até hoje (maio de 2019) não tenham comprado os direitos dessa saga ao menos para a criação de uma série de TV. Isso aqui é um baú de ouro!

A gente destrói aquilo que mais ama
em campo aberto, ou numa emboscada;
alguns com a leveza do carinho
outros com a dureza da palavra;
os covardes destroem com um beijo
os valentes destroem com a espada.
Mas a gente sempre destrói aquilo que mais ama.

Oscar Wilde

Julia – Le avventure di una criminologa #2: Oggetto d’amore (Itália, novembro de 1998)
Editora original:
 Sergio Bonelli Editore
No Brasil:
 Editora Mythos, 2004
Roteiro: Giancarlo Berardi
Arte: Corrado Roi
Capa: Marco Soldi
Tradução: Júlio Schneider (edições de 2004 de 2019)
132 páginas

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