A vida da cantora Britney Spears se tornou mais mercantilizada que na época das grandes apresentações realizadas em premiações, turnês, álbuns e videoclipes. A sua trajetória de dor e sofrimento, radiografada exaustivamente pela mídia, se tornou conhecida até mesmo aquelas pessoas que pouco conhecem sobre o trabalho da artista, pois ao longo dos últimos anos, as batalhas travadas contra a curatela estabelecida após a intervenção de seu pai tomou capas de revistas, sites, telejornais, redes sociais, documentários nos streamings, dentre outros meios de veiculação de informação, muitos destes, vagas informes, baseados em rumores. Jamie vs. Britney: O Julgamento da Família Spears não chega a ser uma série documental abaixo da média. Possui uma edição cuidadosa, traz uma narração equilibrada, apesar da música sentimentalista que busca tornar o relato uma espécie de melodrama ao longo de seus dois capítulos em torno dos 47 minutos. O grande problema é ficar em cima do muro, não trazer um texto documental forte, focando nas mesmas informações demasiadamente espalhadas pelos quatro cantos do “olhar público”.
Em linhas gerais, uma produção que promete muito, mas entrega o mais do mesmo. Dividida em dois momentos, a narrativa traz no primeiro episódio o ponto de vista de Jamie Spears, o pai da cantora. Os depoimentos, as cenas de bastidores e um breve percurso biográfico são escolhas que buscam demonstrar o que o patriarca da família Spears fez enquanto manteve a filha sobre a curatela. É a exposição de uma figura defendida por tentar proteger a artista dos males que ela mesma projetava em si. As drogas, as bebidas, as aparições vexatórias, numa era de desequilíbrio da artista diante das fortes pressões que sofria da mídia, foram as motivações para que Jamie Spears entrasse com um pedido de curatela na justiça, tirando da cantora a possibilidade de responder por si mesma e por suas finanças. Para o pai, foi uma forma de proteger o patrimônio e mantê-la em recuperação, salvando a sua vida fragilizada.
O segundo episódio busca apresentar o ponto de vista de Britney Spears, uma mulher aprisionada por uma curatela que durou tempo demais e quem tem, como denúncia, a exploração sofrida pelo pai, além de destacar a vulnerabilidade diante da omissão da mãe e da irmã, figuras oportunistas que se tornaram, até então, distantes de sua nova vida. Um dos pontos curiosos deste olhar é tentar compreender como alguém que estava tão debilitada ter sido colocada para trabalhar com tanta frequência. Para a cantora, o seu pai é um homem abusivo, que se aproveitou do seu colapso entre 2004 e 2007 para transformá-la numa máquina de fazer dinheiro, ganhando mais que a própria filha, a realizadora dos tais trabalhos. Ademais, por ter mantido o aprisionamento por mais de uma década, no que os relatos descrevem como longínquos 13 anos de “interdição”, Britney esbraveja que tudo isso foi parte de um sistema corrupto e de uma suposta tentativa de protegê-la, mas que na verdade passou de todos os limites e lhe trouxe danos irreparáveis. Foi um trauma atrás do outro.
Nem Jamie nem Britney prestam depoimentos na série documental em dois episódios. Tudo que acompanhamos tem como base trechos de documentos, cenas de telejornais, associados com depoimentos de especialistas do Direito, representantes do movimento Free Britney, pessoas relativamente próximas aos familiares e aos departamentos da artista enquanto atuava com toda intensidade, além de alguns trechos de postagens de Britney Spears na rede social Instagram, material que serve como base para o roteiro que tenta trazer, com coesão, uma demonstração adicional para esta história escabrosa, mas que na verdade não consegue ir além do genérico e, como já comentado anteriormente, bate na mesma tecla continuamente.
Jamie vs. Britney: O Julgamento da Família Spears (Jamie vs. Britney: The Father Daughter Trials, EUA – 2022)
Direção: Annabelle Draper
Roteiro: Annabelle Draper, Sarah Eglin, Nick Hornby
Com: Dan George, Darlene Hughes, Steve Dennis, Julianne Kaye, Jennifer Otter Bickerdike, Emily Baker
Duração: 02 episódios/47 min cada.