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Crítica | Jackpot – Loteria Mortal!

Topa tudo por dinheiro!

por Luiz Santiago
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Às vezes, a procura por um filme leve e engraçado acaba nos colocando em um funil de raiva que nos faz questionar: “o que há de errado comigo, que escolhi ver isso até o final?“. Foi assim que fiquei ao cabo de Jackpot – Loteria Mortal!, um projeto que inicialmente se chamaria Grand Death Lotto, e que destaca Awkwafina e John Cena chutando bundas e fugindo de assassinos que querem matar a ganhadora da bilionária loteria californiana. Por ser uma comédia de ação com ganas de ser pop, o espectador já sabe o que esperar da construção de enredo (em linhas gerais, algo pouco exigente), mas nada me preparou para o alto nível de canastrice e para a falta de qualidade na entrega das piadas e montagem da obra, com algumas das piores continuidades cênicas e encadeamento de lutas ou perseguições que eu vi nesta safra.

Escrito por Rob Yescombe (que fez um bom trabalho no time de Zona de Combate), o roteiro chupinha elementos bem aceitos pelo público em obras como Uma Noite de Crime, estabelecendo um cronômetro de morte permitida pelo Estado, dentro de uma sequência de regras que precisam ser obedecidas por todos — e, ao menos na lógica deste enredo, parece que a população segue a lei à risca. Num futuro bem próximo, a Califórnia conseguiu fazer o seu próprio pão e circo com uma pitada de adrenalina: as pessoas têm seis horas para perseguir e matar o ganhador da loteria. Como recompensa, o assassino fica com o prêmio. Por acidente, a personagem de Awkwafina faz a aposta e ganha, sendo mortalmente perseguida, embora não saiba por quê. Como premissa, eu gosto bastante dessa ideia. Mas, vendo o que o diretor Paul Feig fez com o projeto, não tem como aceitar.

Por ser um filme marcado por movimento, não creio que Feig foi a escolha certa para a direção, porque o cineasta não parece interessado em fazer qualquer tipo de movimento interessante da câmera. Em vez de lutas dinâmicas, boa cadência e reviravolta de ação-e-reação, o que temos aqui é uma direção chapada, com lutas onde as cenas parecem trazer sobras de 3 segundos no início e no fim, atrasando os golpes e suas consequências. Por conta disso, mais da metade de todo enfrentamento do filme parece infantil e sem impacto, porque a péssima edição não faz o corte no momento certo, e porque a direção não ofereceu muitas opções de deslocamento, deixando tudo visualmente pobre. Esse mesmo padrão se vê repetido na fotografia, que está no piloto automático. Tirando momentos como o quarto do pânico e o museu de cera, poderíamos dizer que todo o componente plástico do filme foi feito por um robô, tamanha a falta de personalidade.

Não é possível encontrar uma única atuação que seja aceitável, mesmo considerando a premissa despreocupada e cômica que integram a identidade da película. De todo modo, não sei como se conduziria bons personagens com tantos diálogos infantis, estereotipadamente “jovens” e, como não podia deixar de ser, amaldiçoados por referências que acrescentam tão pouco à trama, que não fazem sentido existir (talvez com exceção a Keeping Up with the Kardashians — como deu pra perceber, se tem uma sequência na qual eu me diverti foi a do museu de cera). A maneira como constituíram o personagem de John Cena é um absurdo, por ser completamente bipolar: ora ele é um grandalhão sensível; ora ele tem um histórico que o afasta dessa situação violenta, adicionando pontos de drama; ora ele é simplesmente um espectador passivo das palhaçadas físicas de Awkwafina, como acontece em no bloco do teatro, por exemplo.

É muito comum os críticos de críticos, em seu clubismo opinativo, aparecerem aqui no PC e chorarem sobre nossas opiniões negativas a filmes que gostaram muito, principalmente comédias. Usam a desculpa de que são obras “para desligar o cérebro e se divertir“. Eu acho que perdi o surto da época em que se tornou aceitável ignorar toda convenção cinematográfica só porque um filme faz parte de um determinado gênero. Desde quando comédias, mesmo as mais escrachadas, devem ser majoritariamente mal construídas e, ainda assim, louvadas por entregarem um produto ruim? Notem o quanto Awkwafina transita entre a carinha de “não sei o que estou fazendo aqui” e a carinha de “aaaaaaaaaaaaaaaaaaa!” o filme inteiro! Notem como o personagem de John Cena parece não ter sido completado. Notem como o personagem de Simu Liu até sugere ser aceitável, mas começa a se levar a sério demais e esquece de mudar a abordagem interpretativa. A cada novo capítulo de perseguição, o filme parece querer mudar de orientação narrativa também, e como não se resolve, acaba virando um Frankenstein vergonhoso, minimamente cômico em alguns pontos e completamente descartável em todo o resto.

Jackpot – Loteria Mortal (Jackpot! – EUA, 15 de agosto de 2024)
Direção: Paul Feig
Roteiro: Rob Yescombe
Elenco: Awkwafina, John Cena, Ayden Mayeri, Donald Elise Watkins, Sam Asghari, Colson Baker, Simu Liu, Seann William Scott, Marian Green, Rosanna Scotto, Dolly de Leon, Murray Hill, Becky Ann Baker, Adam Ray, Monique Ganderton, Bobby Lee
Duração: 106 min.

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