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Crítica | “Iron Maiden” – Iron Maiden

por Iann Jeliel
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Iron Maiden’s gonna get you

No matter how far

Como qualquer obra de estreia de uma banda gigante, o autointitulado Iron Maiden é um disco que esbanja rebeldia, agressividade e intensidade de músicos que queriam o seu lugar na História. Steve Harris, baixista idealizador do nome da Dama de Ferro – em homenagem ao romance O Homem da Máscara de Ferro de Alexandre Dumas –, conduziu o início de uma nova onda do heavy metal surgido na Inglaterra, na metade da década de setenta. Uma onda que ressignificou os sons mais clássicos de Black Sabbath ou Led Zeppelin para batidas mais pesadas e que, ainda assim, esbanjavam a classe lírica do passado.

Nesse ponto foi que se destacou o talento absoluto do Maiden, porque seu primeiro título não possuía a melhor das produções. Pelo contrário, a sonoridade era meio seca, com poucos ajustes nos graves, pouca timbragem da bateria a ponto de parecer que ela não existia, vocais rasgados e instáveis. Era como se fosse gravado em live numa apresentação de “fundo bar de quinta”. Beirava o amadorismo, se fosse desmembrar o quesito técnico da edição sonora, mas “quem sabe faz ao vivo”, e todos esses problemas ficavam invisíveis numa ligeira impressão que capturava a sinergia dos combos de guitarra de Dave Murray e o baixo de Harris, além das letras diretas, cruas e alucinantes, ainda conduzidas pelo subestimado Paul Di’Anno.

Da abertura com a frenética Prowler, passando pela viciante Running Free como aquele grito de liberdade jovial padrão de primeiros álbuns – acho curioso essa ser a mais conhecida desse álbum, sendo provavelmente a menos ótima das músicas –, até a finalização com a fabulosa faixa título – avisando indiretamente o fenômeno chegando –, é pancadaria pura. No entanto, Iron Maiden não é um disco inteiro “cru”, por assim dizer. Por mais que não goste dessa ideia de colocar nome álbum como autointitulado da banda, porque geralmente indica preguiça e falta de criatividade ao conceber uma ideia para o disco, no caso do Maiden, conforme a história e amadurecimento temporal provariam, esse disco, representa tudo o que a banda seria.

Peguemos uma música como Remember Tomorrow, uma das mais diferentes da rítmica agitada do disco. É uma composição que, estruturalmente, em sua curta duração, adequa o cerne dos épicos progressistas no século XXI. Com a introdução, lenta e instrumentalmente contemplativa, até o estouro do clímax igualmente conduzido de maneira lenta, dando abertura para um dueto de solos envolventes e berrantes que, quando finalizados, retomam a canção para o seu estado de calmaria. Tratando-se de épico mesmo, temos Phantom of the Opera, que apesar de puramente agitada pelo instrumental constante, já contém uma narrativa de adaptação historiográfica na qual  a banda apostaria fortemente em seus próximos discos – além de ser a simbolização máxima do New Have, uma ópera agitada e pesada.

Falando em narrativa historiográfica, Charlotte the Harlot, introduz uma das características mais legais das letras do Maiden, que é a criação de personagens próprios. Mais para a frente, eles seriam encaixados em contextos históricos emulados pela musicalidade. Algo que acontece, de maneira mais descompromissada, com o enredo da prostituta na letra. A lírica acaba justificando as inúmeras pausas entre as acelerações do instrumental, que na fase Bruce Dickinson traria também as transições de tom nos vocais e marcariam outra característica primordial do Maiden. Di’Anno não tinha característica para tais mudanças de timbre, mas, para essa música, nem precisava, já que a harmonia atingida por cada pausa fazia o vocal se destacar de maneiras distintas. É impressionante o efeito diante da velocidade da canção, que, ratifico, tinha propósito na construção narrativa quase para emular o sexo viciante de Charlotte – mencionada em várias canções futuras como 22 Acacia Avenue, Hooks in You, From Here to Eternity… É uma música simplesmente absurda! Minha favorita do álbum.

Por fim, vale destacar, Strange World, seguindo a linha mais contemplativa em tom de balada setentista, mostrando a versatilidade que vez ou outra a banda entrega, provando que sabe compor canções emocionalmente poderosas, poéticas, melancólicas, pessoais. Uma música rara e extremamente bela, que poderia facilmente, se fosse feita hoje, ser um épico, caso acoplado à quinta faixa, nomeada Transylvania. Essa que é puramente instrumental, representando também outra raridade na banda, a de compor músicas exclusivamente nesse formato. Poderosa e disparadamente a melhor instrumental do grupo até hoje, apesar de desfavorecida ao parecer meio solta no contexto do álbum (que já é meio assim por natureza), sua finalização da passagem ao início de Strange World, me fazendo pensar quão grandiosa seria a música que juntaria as duas em uma. O caos desinibido e extorsivo de Transylvania, representando o mundo estranho que o eu-lírico de Strange World presencia. A perfeita mudança de estar no meio da tempestade, para a melancolia incerta quando se sai um pouco dela para refletir.

Dava para ser fácil uma das cinco melhores canções do Iron Maiden, no entanto, esse meu exercício imaginativo não anula que a sequência dessas duas músicas, uma após a outra, na track list, busca o efeito descrito. A ordem é outro fator fundamental para a imersão irretocável no disco. Temos a agitação primária que nos captura, a calmaria que nos descansa, uma nova agitação para nos embrulhar no espírito de um épico, que depois de seu clímax volta à calmaria para refletir um pouco mais, surgindo do nada uma transa para superar a depressão momentânea e uma nova finalização, em tom de empolgação. Iron Maiden é literalmente um passeio por Iron Maiden, num amadorismo que expunha tudo o que a banda já tinha de melhor e que ainda conseguiria melhorar no futuro.

Aumenta!: Prowler, Strange World e Iron Maiden
Diminui!: Running Free???
Minha Canção Favorita do álbum!: Charlotte the Harlot

Iron Maiden
Artista: Iron Maiden
País: Reino Unido
Lançamento: 14 de abril de 1980
Gravadora: Kingsway Studios
Estilo: Heavy Metal

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