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Crítica | Invencível – 1X01 a 03: Já Estava na Hora / Ou Vai ou Racha / Quem Você Chamou de Feia?

por Kevin Rick
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Invencível
  • Há spoilers. Leia, aqui, as críticas das HQs de Invencível.

É interessante notar como adaptações de quadrinhos sobre super-heróis tomaram o Cinema e a Televisão por assalto nos últimos anos, e toda a construção, desconstrução, desenvolvimento natural e quebra de expectativa vista em décadas na Nona Arte, têm acontecido em uma velocidade absurda no audiovisual. Desde filmes/shows mais simples e clichês (CW, alguém?), obras focadas em construção de personagens e Universo mais… comuns, por assim dizer, como no UCM, até obras mais “maduras” no breve período da Marvel na Netflix, chegando, mais recentemente, em sátiras, algumas com uma veia cômica como Deadpool, e outras paródias mais dramáticas e profanas como The Boys. Invencível 

Não é como se tais adaptações não existissem antes – V de Vingança, Kick-Ass, entre outros -, mas a super exposição heroica na mídia tornou o que era antes pontuais filmes/séries dentro deste “gênero” em uma obsessão geral pela próxima grande obra inovadora sobre super-heróis. A mais nova série da Amazon, Invencível, baseada no quadrinho criado por Robert Kirkman, acaba sendo um produto desse tempo que anseia por novidade e renovação em histórias desse tipo, espelhado no período em que Kirkman desencadeou o massivo crescimento de quadrinhos independentes nos EUA, junto da Image Comics, justamente fazendo isso, quebrando paradigmas e convenções na Nona Arte com suas duas criações mais célebres: o próprio Invencível, e uma outra não tão conhecida chamada The Walking DeadE a mais nova adaptação do criador vem com o intuito de fazer um splash com a audiência, tal como TWD fez alguns anos atrás. Será que terá o mesmo alcance/êxito?
Invencível Invencível  Invencível  Invencível  Invencível  Invencível  Invencível 

Já Estava na Hora
1X01

Invencível

Logo de cara, quero deixar claro que não irei fazer muitas comparações com o quadrinho que deu origem à série, pois a adaptação necessita – melhor dizendo, deve! – criar sua própria identidade, andar com suas próprias pernas em termos mais leigos. Dito isso, e já me contradizendo, preciso abrir um pequeno espaço da linguagem desse Universo. Não irei trazer spoilers dos quadrinhos – aliás, quem quiser trazer esse assunto nos comentários, fique à vontade com o uso de tags -, mas a abordagem apresentada no primeiro episódio é bem próxima da proposta da fonte original, só mais… corrida.

Primeiro que a idealização de Kirkman à obra é um paradoxo: ele quer homenagear o mito de super-heróis ao mesmo tempo que o satiriza, tirando sarro de clichês e trazendo muita, muita – em negrito e itálico mesmo – violência. E o encadeamento dado ao primeiro episódio relembra bastante os primeiros volumes, mas, novamente, apresentado de modo bem mais ágil, inicialmente deixando o espectador em um aconchego narrativo da típica jornada do herói. Nosso protagonista, Mark Grayson (Steven Yeun), um garoto perfeitamente normal que descobre, aos 7 anos, que seu pai Nolan (J.K. Simmons) é secretamente Omni-Man, o amado equivalente do Superman em seu mundo. A história então começa – depois de um divertidíssimo embate da Liga da J… Guardiões do Globo –  logo após Mark completar 17 anos, no dia em que seus próprios poderes finalmente se ativam. O drama em quase todo o episódio é bastante clichê, mas é um clichê bem feito. Essa palavra acaba sendo bastante utilizada pejorativamente nos dias atuais, mas a verdade é que uma convenção do gênero, se feita com esmero e cuidado, é uma delícia de se assistir.

A busca para corresponder ao legado do pai, a turbulência interna com a demora do ganho de poderes e a própria culpa/ressentimento em relação a si mesmo e a sua figura paterna, abrem muito bem o arco do protagonista – melhor que na HQ, na minha opinião. A dinâmica familiar é extremamente divertida, sobrando louvor ao elenco – Sandra Oh é espetacular como Debbie Grayson -, além de que o drama adolescente romântico ganha um ótimo pontapé. Mas o grande foco aqui é, como disse anteriormente, homenagear o mito do super-herói, recapturando o que nosso atual excesso de ficção de super-heróis em grande parte perde de vista: o prazer que os super-heróis devem sentir ao exercer seus poderes. E não necessariamente o deleite de ajudar os oprimidos, mas a satisfação de voar, ser livre e poderoso para infligir dor naqueles que merecem.

E a parte técnica merece elogios, especialmente nas sequências de batalhas. A animação tem uma pegada anos 2000, meio cartunesca e até com um quê clássico na estética, mas a fluidez em combate é um negócio lindo de se ver, principalmente nas cenas de voo dos personagens que passam uma ótima sensação de libertação e autoconfiança em planos abertos e dinâmicos. Aliás, é preciso notar o conjunto sonoro ao show, que me lembra John Hughes em sua proposta de independência e autonomia juvenil com uma trilha sonora animada, contagiante e bem expressiva.

E então nós temos o grand finale insano do episódio, inesperado – para quem não conhecia os quadrinhos – no grande elemento desta obra: quebra de expectativa do que espera-se da ficção heroica. E qual a melhor maneira de utilizar isso senão com violência extrema e muito gore? Contudo, cabe aqui uma crítica minha, não a violência em si, mas a forma como ela foi proposta. Não existe uma construção para esta mudança bruta de abordagem, e que funciona bem como surpresa, mas a correria para esse determinado momento me pareceu… gratuita. Não é uma palavra que gosto de usar, mas achei uma transição de tom um tantinho mal feita, mas que personifica a linguagem da série: comédia/drama adolescente que brinda o heroico e ultraviolência para chocar e satirizar o mesmo. Um ótimo começo para Invencível.

Ou Vai ou Racha
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Invencível

Depois de Nolan assassinar os Guardiões do Globo, a Terra ficou indefesa sem seus maiores protetores, inclusive o próprio Nolan que encontra-se hospitalizado após a batalha, identificado como uma das vítimas. Isso dá espaço para o roteiro jogar Mark na ação, afinal, o mundo precisa de heróis que possam substituir os ausentes defensores, além de trazer a equipe adolescente composta por Robô, Atom Eve, Rex e Dupli-Kate para o meio do caos. Dessa forma, começa o arco de quebra de realidade do protagonista em relação ao heroísmo.

Toda a situação com a invasão dos aliens manuseia a violência na concepção do cinismo e choque do personagem, assim como o espectador. Aqui, ainda vejo um certo exagero com o gore na transição de dramas do episódio, mas a selvageria atua melhor no elemento de conflito da visão otimista e prazerosa do protagonista. Ademais, a dinâmica com a equipe já acostumada com essa situação desenvolve o quadro ambíguo da série, no qual cada relacionamento de Mark ganha uma construção diferente: antagonismo e antipatia com Rex; distanciamento de Robô; e o afável relacionamento com Eve. Personagens e mais personagens são introduzidos, mas o roteiro faz um bom trabalho de tornar suas inserções orgânicas à trama violentamente satírica do capítulo.

Ainda tenho algumas ressalvas pela estrutura posterior a esse evento, pois o encadeamento dado relembra bastante o da HQ, numa série de contos desgarrados sequenciais, subtramas jogadas aqui e ali, enquanto a história “principal” do episódio é diluída, o que torna o ritmo deslocado às vezes. Senti isso na cena com Allen, o Alien (Seth Rogen), que parece fora de lugar. Dito isso, é mais um ótimo episódio, que usa a satisfação do protagonista com a descoberta dos poderes e do manto protetor do primeiro capítulo para aumentar a quebra de realidade e o tratamento cínico do heroísmo, além de desenvolver o bom núcleo investigativo em torno da morte dos Guardiões do Globo com Cecil Steadman e Damien Darkblood.

Quem Você Chamou de Feia?
1X03

Invencível

Quem Você Chamou de Feia? é o episódio mais ordinário até aqui, pois move pouco a trama geral da série, além de apresentar um ou outro núcleo de elaboração para ameaças posteriores. O discurso do roteiro é mais focado no drama adolescente com paqueras, traições e términos de namoros. É bem divertido, e ajuda a manter o estilo duplo da série, mais atenuada e pessoal fora do combate grotesco e brutal. Dentro disso, gostei muito da narrativa em torno de Eve, Rex e a (s) Dupli-Kate (s), que dá mais espaço para personagens secundários e seus dramalhões fora do traje.

Isso é acompanhado pelos Graysons, tanto na desconfiança e mudança de comportamento do Nolan – não sei se gosto muito dessa versão antipática dele -, quanto no (possível) relacionamento de Mark e Amber. Aqui, vemos o clássico problema de tempo e comparecimento dos heróis em sua vida privada, remetendo-se à HQ’s do Homem-Aranha. Novamente, essa parte mais intimista e ordinária da narrativa abraça o clichê por completo, mas os diálogos e o belo trabalho de voz dos atores não transformam esses momentos em algo raso ou maçante – adorei a sequência de triagem para os novos Guardiões do Globo, me dando um sentimento de nostalgia com a habitualidade simplista que me lembra animações clássicas.

A trinca de episódios lançados pela Amazon fazem um ótimo trabalho em equilibrar a sátira e homenagem propostas por Kirkman, com um toque contemporâneo à piadas, diversificação étnica e ambiente juvenil. A pegada violenta é identidade do quadrinho, e definitivamente não precisa ser dosada na adaptação, mas necessita existir em prol de algo, seja cinismo ou ambiguidade, e sinto um certo exagero gráfico pelo exagero mesmo, com propósito de chocar. Mas é um pequeno – bem pequeno mesmo, já bem retificado no segundo episódio – incomodo para uma série que tem tudo para ser especial. Uma ode e paródia ao mito heroico, dispondo de belos visuais, um trabalho vocal irretocável e uma abordagem narrativa que exprime com louvor no audiovisual tudo que Kirkman fez nesse belo Universo.

Invencível – 1X01 a 03: Já Estava na Hora / Ou Vai ou Racha / Quem Você Chamou de Feia? (Invincible – 1X01 to 03: It’s About Time / Here Goes Nothing / Who You Calling Ugly?, EUA, 26 de março de 2021)
Criado por: Robert Kirkman, Cory Walker, Ryan Ottley
Direção: Jeff Allen
Roteiro: Simon Racioppa, Chris Black
Elenco: Steven Yeun, Sandra Oh, J.K. Simmons, Gillian Jacobs, Zazie Beetz, Walton Goggins, Jason Mantzoukas, Grey Griffin, Kevin Michael Richardson, Zachary Quinto, Andrew Rannells, Chris Diamantopoulos, Mark Hamill, Melise, Khary Payton, Clancy Brown, Jeffrey Donovan, Jon Hamm, Ross Marquand, Djimon Hounsou, Lennie James, Sonequa Martin-Green, Lauren Cohan, Seth Rogen
Duração: 44 min. (cada)

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