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Crítica | Invasão Secreta – 1X02: Promises

Um Nick Fury surpreendente.

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

Resurrection foi um ótimo episódio de começo de temporada que talvez tenha sofrido um pouco pelo peso de ter que reintroduzir Nick Fury ao Universo Cinematográfico Marvel, estabelecer as bases da trama sem fazer uso exagerado de textos expositivos (nem sempre conseguindo) e criar uma situação bombástica, como foi o atentado em Moscou e, principalmente, a morte de Maria Hill, para mostrar seriedade e comprometimento. Promises, que não carrega esse fardo, chega para mostrar que aquilo que vimos há uma semana não era enganação e que Invasão Secreta promete (he, he, he) ser uma minissérie diferenciada nesse universo super-heróico, seja por não ter super-heróis, seja por contar com algo que tem sido cada vez mais raro em obras do gênero: diálogos multifuncionais de qualidade que desenvolvem a trama, constroem seus personagens e trabalham naturalmente subtextos socioeconômicos relevantes sem subestimar o espectador.

Começando do ponto em que o episódio inaugural parou, mas fazendo uso de flashbacks espertamente inseridos logo na largada para ajudar a contextualizar e explicar as ações de Gravik a partir da promessa não cumprida de Nick Fury de achar um novo lar para os Skrulls, Promises trabalha uma sucessão de sequências que fazem o oposto do que normalmente se espera de séries assim, ou seja, prezam pela conversa, pelo diálogo, deixando a ação quase que completamente de lado. Do lado macro, temos os ânimos exaltados das potências (e não tão potências) mundiais sendo deixados sem resposta por um Coronel James Rhodes carregado de uma arrogância inesperada para o personagem que funciona quase que como um porta-voz da presidência da belicosa Era Reagan, o que funciona perfeitamente para uma série que tenta justamente emular a Guerra Fria. Don Cheadle, impassível e seguro de si, faz seu personagem galgar alguns degraus na hierarquia interna do UCM ao rechaçar as alegações contra o seu país basicamente dizendo que ninguém ali tem o poder que ele tem por trás dele, em uma sequência muito eficiente, ainda que propositalmente ufanista.

E a presença diferenciada de Cheadle na série não para por aí, já que, no momento seguinte, nós vemos Rhodes sentado na mesa com um Nick Fury que vem com o chapéu na mão pedir-lhe ajuda como um irmão até o momento em que ele percebe que esse novo Rhodes definitivamente não é o bom e velho Máquina de Combate de outrora. O diálogo tenso que é travado entre os dois é um dos melhores exemplos de como o roteiro de Brian Tucker consegue trabalhar o desenvolvimento da trama sem perder profundidade, sem deixar de comentar algo latente e presente na conversa entre dois afrodescendentes que sabem muito bem que não chegaram onde estão com a mesma facilidade de pessoas com menos pigmentação. E é fenomenal ver Samuel L. Jackson transformar seu personagem diante das câmeras, sem que por um momento sequer duvidemos do realismo do que estamos assistindo. Fury começa enfraquecido, quase que subserviente, mas, aos poucos, diante da frieza de Rhodes, dá pistas do antigo Fury, alterando postura e tom de voz, até que ele, em um piscar de olhos, toma controle físico da situação ao subjugar e desarmar o segurança que quer levá-lo embora, solta aquela frase esperta – “Eu sou o Nick Fury. Mesmo quando estou fora, estou dentro.” – criada cirurgicamente para fazer o espectador vibrar e que cumpre esta exata função e, no momento seguinte, já fora do restaurante, reverte ao Fury cansado, claramente destreinado e fora de forma, ofegante em um banco.

Mas essa sequer é a primeira vez que um diálogo dessa qualidade é visto no episódio, já que a conversa entre o mesmo Fury e Talos funciona exatamente da mesma forma, mas com outra função. Há o mesmo subtexto na história que o protagonista conta sobre seu passado quando só podia viajar nos vagões segregados dos trens e que serve para ele deixar bem claro ao amigo que ele sabe que há algo que ele não contou, algo que ele extrai logo em seguida: a invasão silenciosa dos Skrulls não está para acontecer, ela já aconteceu. A traição “benigna” de Talos, claro, não é bem recebida e abre uma porteira gigantesca que coloca em xeque todos os humanos desse universo, algo que é amplificado logo de imediato na ótima sequência em que Gravik executa seu golpe de estado perante o Conselho Skrull formado de personalidades importantíssimas da política mundial.

Aos que se perguntam “onde estão os super-heróis que soltam raios pelas mãos?”, o roteiro também não se esqueceu de vocês e entrega não uma, mas duas respostas. De um lado, Fury não quer os super-heróis envolvidos agora para evitar que os Skrulls transformem-se neles, o que é uma desculpa que até pode soar fraca, mas que carrega sua lógica. Do outro lado, Gravik tem plena consciência de que os Vingadores são um problema, com boa parte do episódio sendo dedicada à descoberta, por parte de G’iah, de que os Skrulls estão experimentando provável ampliação de poderes à la Super-Skrull dos quadrinhos com amostras de Groot (não preciso dizer quem é, não é?), Cull Obisidian (da Ordem Negra de Thanos), de um monstro do gelo de Jotunheim (da mitologia de Thor) e até mesmo da nanotecnologia Extremis criada por Maya Hansen e Aldrich Killian (lá de Homem de Ferro 3, mais conhecido como o mais subestimado e incompreendido filme da Marvel que eu vou defender até a morte) justamente com o objetivo de baterem de frente com o pessoal dos trajes espalhafatosos.

Pode parecer fora de contexto, mas é que eu estou me obrigando, independente de qualquer coisa, a falar dela: o que dizer de Olivia Colman , hein? Sua personagem Sonya Falsworth, do MI-6, foi introduzida no primeiro episódio em um tête-à-tête com Nick Fury e eu confesso que não esperava vê-la de volta tão cedo porque Colman é Colman e não… uma Emilia Clarke da vida, mas eis que nós a temos de volta protagonizando uma cena que carrega um certo bis in idem, mas que só por a ter já vale o episódio. Afinal, quando é que poderíamos imaginar ter essa atriz, aparentemente divertindo-se como se não houvesse amanhã, arrancando dedo de lagarto alienígena (ops, será que fui politicamente incorreto aqui?) e injetando sei-lá-o-que em seu derrière (francês duas vezes no mesmo parágrafo, oh là là!) para torturá-lo e isso logo antes de se arrastar por um túnel para fugir? Será que nós a teremos de volta, arma em punho, para lutar ao lado de Fury no clímax da minissérie? Será um massacre, pois, afinal de contas, não tem como ganhar briga alguma contra esses dois juntos!

E, quando achamos que o episódio acabou, eis que ganhamos uma outra reviravolta, só que esta o exato oposto da tragédia que foi a morte de Maria Hill: Nick Fury, quem diria, casou-se com uma Skrull (seu nome é Priscilla, segundo os créditos, vivida por Charlayne Woodard, que, por sua vez, viveu a mãe do personagem de Jackson na Trilogia Corpo Fechado). Se ele sabe que ela é uma Skrull, bem, ele é o Nick Fury e o Nick Fury, mesmo velho, ainda é o “modafoca” Nick Fury, então sim, ele sabe. Podemos entrever, aí, um pouco mais da vida secreta do personagem que vem sendo descortinada na série e que, claro, tem ligação muito próxima com o destino da raça alienígena que, ao que tudo indica, já comanda boa parte do planeta com pouca gente sabendo que seu vizinho pode ter pele verde, orelhas pontudas e queixo sulcado. Essa camada a mais e inesperada para Fury é bem-vinda, pois ajuda a humanizar o personagem que é normalmente visto como mais invencível do que o Hulk.

Já em seu segundo episódio, Invasão Secreta confirma que não veio para brincar, mas sim para oferecer uma minissérie que tem tudo para ser de alta qualidade por seus próprios méritos e, de quebra, afetar todo o UCM no processo. Resta só torcer para que isso não seja apenas uma ilusão de ótica ou uma série que pareça algo, mas acabe se transformando em outra coisa.

Invasão Secreta – 1X02: Promises (Secret Invasion – EUA, 28 de junho de 2023)
Desenvolvimento: Kyle Bradstreet
Direção: Ali Selim
Roteiro: Brian Tucker
Elenco: Samuel L. Jackson, Ben Mendelsohn, Kingsley Ben-Adir, Emilia Clarke, Olivia Colman, Don Cheadle, Killian Scott, Samuel Adewunmi, Dermot Mulroney, Richard Dormer, Charlayne Woodard
Duração: 57 min.

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