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Crítica | Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (Com Spoilers)

Querendo ser grande.

por Kevin Rick
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Devo confessar que tenho uma queda pelos dois primeiros filmes da franquia do Homem-Formiga (e da Vespa) no Universo Cinematográfico da Marvel. Como todos sabem, os longas dos pequenos heróis não são revoluções da sétima arte ou grandes exemplos de blockbusters geniais, mas existe uma certa inocência e uma vibe meio anos 80/90 que me conquista pela simpatia das produções, que também ganham mérito por se distanciarem da maluquice da Marvel para brindar o público com obras contidas, objetivas e de simples entretenimento.

É tudo meio Querida, Encolhi as Crianças ou Os Caça-Fantasmas, mesclando uma premissa tão absurda quanto boba num envelope de divertimento infantil entre as estranhezas conceituais, uma narrativa de desventuras cômicas e dramas universais sobre família e amizade.  É fácil se envolver na mesma medida que é fácil esquecer os dois primeiros filmes solos do herói, mas ainda há o que se apreciar em produções que são simplesmente divertidas, mesmo no senso mais comum e superficial da palavra. Afirmo isso, porém: se o Homem-Formiga tivesse sido lançado nos anos 80, seria considerado um clássico da comédia.

Então, aqui estamos com a terceira aventura de Scott Lang (Paul Rudd) e Hope Van Dyne (Evangeline Lily), dessa vez no Reino Quântico. A proposta de explorar este vasto universo da mitologia Marvel me parecia interessante, principalmente pelas possibilidades visuais e narrativas, mas também me preocupava por parecer indicar um tipo de história grandiosa que não parece se encaixar nesta subfranquia. A participação de Kang (Jonathan Majors) confirmava ainda mais meus temores, pois dava outra tarefa à obra: continuar a introdução do novo grande antagonista da Marvel pós-Thanos.

O começo do filme deixa bem claro seu foco dramático: a relação entre o protagonista e sua filha, Cassie (Kathryn Newton). Isso até me alegrou no início da sessão, pois gosto do envolvimento emocional que os dois primeiros filmes criam entre os personagens. Não é nada incrivelmente profundo, mas existe um motor dramático-empático para o espectador, carregado principalmente pelo carisma e a afabilidade de Rudd.

Neste terceiro longa, também temos um leve e mal trabalhado debate sobre heroísmo. Scott Lang salvou o mundo e agora quer ser um paizão, o que rende algumas piadas boas, outras nem tanto. A cena da livraria é uma boa sacada cômica, enquanto alguns momentos são sem graças pela repetição ou pela simples falta de um bom roteiro humorístico, com destaque negativo para as fotos com os cachorros, algumas frases de efeito repetidas, as trocas de nome do herói e o voice-over de Lang.

Sinto que muitas pessoas reclamam do humor da Marvel pela abordagem cômica das produções, mas penso que o problema às vezes é a falta de criatividade com piadas e situações engraçadas. Tive a mesma reação com o recente Thor: Amor e Trovão, que não é fraco por ser uma obra de comédia, mas apenas por não ser uma boa obra de comédia, entendem? Critiquem a execução, não a proposta.

Só para citar alguns pensamentos, acredito que se a obra fosse um tanto mais sarcástica, poderia até mesmo tirar sarro da atitude de Cassie em constantemente querer salvar o mundo e criticar Scott por não fazê-lo, me lembrando bastante os salvadores da internet, mudando o planeta um tweet de cada vez. E, por outro ângulo, se a obra abraçasse mais o pastelão, talvez as participações de MODOK ou outros coadjuvantes no Reino Quântico seriam mais engraçadas e menos constrangedoras (mais disso à frente).

O bloco inicial, porém, ainda é simpático. Paul Rudd continua arrebentando como o “cara comum que não deveria estar nesse papel”, enquanto o roteiro estabelece com certa eficiência o fio condutor dramático entre o protagonista e sua filha, bem como o estopim da aventura quando a família inteira adentra o Reino Quântico. Também aprecio quão rápido tudo é estabelecido, sem perder tempo com contexto ou explicações.

A sequência que os personagens são sugados para o Reino Quântico é de alta qualidade, prometendo mundos e fundos para a aventura subatômica. Vemos uma característica caleidoscópica no trabalho de direção e efeitos especiais, passando a bizarrice que estamos prestes a assistir… certo? Bem, infelizmente, essa é a única sequência criativa no Reino Quântico, com o restante da produção mostrando uma construção de mundo apática e novamente com diversos problemas de iluminação.

Repito, aqui, as mesma críticas que fiz a Pantera Negra: Wakanda para Sempre sobre a apresentação da nação subaquática de Namor: “… a sequência que nos apresenta Talokan, com fotografia escura, corte rápidos e a falta de criatividade visual mesmo para estabelecer a capital como algo distinto. Me esqueci de Talokan no minuto que a cena terminou“. Este é meu exato sentimento com o Reino Quântico, mas com ainda mais pontuações negativas, porque no filme de Coogler, pelo menos há um belíssimo trabalho com figurinos e a trilha sonora, enquanto Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania não tem um traço de personalidade, uma particularidade ou sequer um design de personagem que seja minimamente memorável.

Em grande porção do filme, vemos apenas dois cenários: uma área rochosa dominada pelos oprimidos e a cidadela do opressor Kang. É completamente irritante a falta de exploração do Reino Quântico, de longe o melhor elemento da produção, com uma narrativa engessada nas mesmas locações, muitas das vezes com tomadas feias e péssimo CGI no background. Chega a ser cômico que um conceito visual tão cheio de oportunidades é minimizado a prisões metálicas, exércitos genéricos e terrenos rochosos. Já vi Doctor Who e Star Trek fazerem muito mais com orçamentos tímidos.

E não apenas em termos de narrativas visuais, mas também na falta de crescimento da história. Nós não vemos nenhum tipo de mitologia desenvolvida neste reino que deveria ser um mar de possibilidades que rivaliza o Multiverso. Não conhecemos mundos, não descobrimos raças e raramente vemos bizarrices dignas do conceito da produção. Um homem de gelatina com furos? Um prédio que é uma nave? É isso o máximo que Peyton Reed e companhia conseguem proporcionar?

É de uma ridicularidade imensa a falta de imaginação da equipe criativa. Até como citei anteriormente, o longa não consegue aproveitar suas estranhezas nem como alívio cômico, considerando que a (boa) piada com MODOK/Darren é utilizada à exaustão, e não temos nada além disso a não ser piadas com buracos…

Ademais, a história em torno do Reino Quântico não traz nenhum impacto para o restante do UCM, considerando que não temos nenhum tipo de repercussão com esta variante de Kang ou alguma indicação de que o Reino Quântico será importante para além de um simples exílio. E o cerne familiar não é devidamente articulado pelo roteiro, com Janet (Michelle Pfeiffer) servindo apenas como um elemento para mover a história; Hank Pym (Michael Douglas) tendo duas ou três cenas com efetiva participação; e, o pior, a Vespa tendo protagonismo apenas no título, com a suposta co-protagonista sendo escanteada pelo roteiro, sem deixar qualquer impressão ou importância na história.

Para mim, com exceção das dificuldades técnicas e visuais, a produção erra justamente em querer ter um antagonista, principalmente um com tamanha importância no futuro da Marvel. É o mesmo problema com a inclusão da Fantasma (Hannah John-Kamen) em Homem-Formiga e a Vespa, só que ainda mais hiperbolicamente atrapalhado em termos de tom, porque essas histórias do Homem-Formiga não precisam de um grande vilão.

Esses filmes “bobos” do personagem florescem quando são sobre os personagens em situações inusitadas, como quando eles estão numa perseguição de trânsito com um laboratório encolhido, com o acréscimo de algum nível de envolvimento emocional com a família que protagoniza a história. O personagem caricato de Walton Goggins é suficiente no segundo longa, assim como MODOK, na minha opinião, deveria ter sido o principal vilão, se aproveitando das características da franquia.

Nesse sentido, até fiz um exercício perigoso: imaginar como “deveria” ter sido a obra. É um campo de análise perigoso para um crítico, mas é difícil não criar esse tipo de pensamento com tanto potencial desperdiçado. O coração deste filme é sobre a família explorando o Reino Quântico, brigando e aprendendo sobre seus relacionamentos enquanto batalham as bizarrices de um universo distinto. Queria ter visto mais de Janet e Hank discutindo sobre o personagem de Bill Murray; mais da relação maternal de Hope e sua mãe; mais dos personagens tirando sarro/ajudando Darren, como uma espécie de parente distante de uma família disfuncional; e, principalmente, mais do Reino Quântico.

E mesmo que a abordagem grandiosa fosse o foco, faltou muitos ingredientes para termos qualquer senso de risco ou sentimento épico com o velho conto de lutar contra um ditador, por mais que Majors mereça mérito por sua forte presença de tela. O terceiro ato em si é bastante genérico na luta dos exércitos, finalizando de maneira anticlimática com o “sacrifício” de Lang e Hope ficarem para trás, já que eles retornam logo depois para a Terra.

Como consequência de tantos problemas e escolhas equivocadas, Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania não se torna um filme grandioso, tampouco aproveita sua qualidade autocontida das obras anteriores. A única subfranquia da Marvel que parecia livre do problema de amarrar continuidade sucumbiu aos cacoetes do estúdio. No fim, a melhor cena do filme é o pós-créditos com Loki, porque é disso que a Marvel vive hoje: promessas.

Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (Ant-Man and the Wasp: Quantumania – EUA, 16 de fevereiro de 2023)
Direção: Peyton Reed
Roteiro: Jeff Loveness
Elenco: Paul Rudd, Evangeline Lilly, Michelle Pfeiffer, Kathryn Newton, Jonathan Majors, Michael Douglas, William Jackson Harper, Katy M.O’Brian, David Dastmalchian, Bill Murray
Duração: 125 min.

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