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Crítica | Hitchcock

por Ritter Fan
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Hitchcock não é exatamente, como o nome deixa a entrever, uma cinebiografia de Alfred Hitchcock, o Mestre do Suspense. Baseado em livro escrito por Stephen Rebello, com extenso trabalho de pesquisa, o filme é um recorte de um momento importantíssimo na carreira do diretor e que envolve todo o processo de criação de Psicose, da ideia até seu lançamento nos cinemas nos EUA. Assim, a obra é melhor apreciada por aqueles que têm conhecimento mais abrangente do cineasta, seus gostos, seus problemas, seu relacionamento com os estúdios e seus atores. Não que ele não possa ser apreciado por quem não o conheça, mas muitos detalhes serão perdidos.

Anthony Hopkins, debaixo de pesada maquiagem e de um barrigão que chega a ser engraçado nos primeiros momentos, tem uma atuação sensacional, talvez uma de suas mais memoráveis nos último anos. Visivelmente se divertindo no papel, fazendo o máximo para homenagear o grande diretor, Hopkins nos faz facilmente acreditar que vemos Hitchcock passeando por seu set de filmagem, escritório e casa. Ainda vemos Hopkins debaixo da maquiagem, mas, aos poucos, a fusão é completa e a experiência começa de verdade.

Mas talvez o que mais surpreenda aqueles que não conheçam a vida do diretor é o quanto Alma Reville, sua esposa por toda a vida, é importante para absolutamente tudo na vida dele. Vivida pela majestosa e forte Helen Mirren, Alma muitas vezes consegue eclipsar a presença portentosa de Hitchcock/Hopkins na tela, mostrando o acerto na escolha da dupla principal.

No entanto, o acerto na escalação não parou aí. Toni Collette é um grande achado encarnando a essencial assistente de Hitchcock, Peggy Robertson, contratada pelo diretor em 1949, para a produção de Sob o Signo de Capricórnio e que ficaria com ele até o final de sua carreira, com Trama Macabra. É ela que, caçando material para seu chefe, acha uma crítica positiva da biografia romanceada do assassino em série Ed Gein, escrita por Robert Block, lê o livro e convence-o a fazer o filme. Hitchcock fica tão enamorado com o projeto – arriscadíssimo à época, especialmente considerando seu recente fracasso com Um Corpo Que Cai – que investe seu próprio dinheiro nele, negociando com a descrente Paramount e seu executivo principal Lew Wasserman (Michael Stuhlbarg, apenas em uma ponta, mas sempre fascinante) um acordo de distribuição.

E esse olhar de bastidor de uma produção tão importante é algo que por si só merece aplausos. Apesar de Hitchcock sempre ter gostado dos holofotes e nunca ter se esquivado de literalmente confirmar suas técnicas pouco ortodoxas de tratar sua equipe, pouca documentação fotográfica e filmada dos bastidores de Psicose existiam. Assim, ver os detalhes da criação de um futuro clássico é fascinante, mesmo em se tratando de uma obra de ficção. E, para tudo funcionar, era necessário convencer o espectador que Janet Leigh e, claro, Anthony Perkins haviam levantado de seus respectivos túmulos para mais uma vez singrar as telonas. Scarlett Johansson emprega seu talento no papel de Leigh sem nunca verdadeiramente nos convencer de sua transformação, ainda que isso seja bem disfarçado pela pouca ênfase que é dada à atriz. No entanto, James D’Arcy como Perkins está assombroso desde o primeiro segundo em que aparece na sala do diretor até as sequências finais.

Mas o grande trunfo da fita é dividir o foco entre Hitchcock e Alma Reville quase que igualmente. Sem trocadilho – ou talvez com trocadilho, pouco importa – ela é a alma de tudo que Hitchcock fez e a grande força motriz por trás de Psicose. Sua presença na obra é sentida do começo ao fim, trazendo elementos essenciais ao andamento da narrativa. No entanto, o espectador deverá aceitar uma mudança tonal no filme, o que nem sempre funciona. Enquanto as sequências nos sets de filmagem funcionam muito bem, o mesmo não se pode dizer da mudança brusca para a casa de praia de Alma, sua reclusão e sua volta triunfal. Tratam-se de aspectos essenciais ao sucesso da história sendo contada, mas que, paradoxalmente, ao mesmo tempo, quebram o ritmo do filme, talvez ajudado por uma montagem equivocada e uma fotografia diferenciada que causa algum estranhamento. O mesmo vale para as completamente inúteis e surreais sequências focadas em Ed Gein, como partes de sonhos e devaneios do diretor.

O paradoxo, porém, acaba não prejudicando a experiência como um todo de maneira a afastar o espectador da fita. A história em si é interessante demais e as atuações cativantes demais para isso. E aqueles que conhecem a vida de Hithcock e seus parceiros artísticos de longa data ainda terão o bônus de reconhecer e sorrir com as presenças dos já citados personagens, assim como de Saul Bass (Wallace Langham) e Bernard Herrmann (Paul Schackman), além de diversos pequenos easter eggs da vida do diretor espalhados por todos os cantos. E, tenho certeza, uma grande gargalhada de satisfação e triunfo virá com a sequência final, no átrio do cinema em que Psicose está sendo projetado.

Hitchcock (Idem, EUA/Reino Unido – 2012)
Direção: Sacha Gervasi
Roteiro: John J. McLaughlin (baseado em livro de Stephen Rebello)
Elenco: Anthony Hopkins, Helen Mirren, Scarlett Johansson, Danny Huston, Toni Collette, Michael Stuhlbarg, Michael Wincott, Jessica Biel, James D’Arcy, Richard Portnow, Kurtwood Smith, Ralph Macchio, Kai Lennox, Tara Summers, Wallace Langham, Paul Schackman
Duração: 98 min.

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