Home LiteraturaAcadêmico/Jornalístico Crítica | História dos Vampiros: Autópsia de Um Mito, de Claude Lecouteux

Crítica | História dos Vampiros: Autópsia de Um Mito, de Claude Lecouteux

Uma análise apurada do mito dos vampiros pelo olhar de um historiador.

por Leonardo Campos
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A mitologia em torno dos vampiros não é algo originado apenas dos circuitos literários e cinematográficos que há eras radiografam este ser usurpador de energias alheias. Quando mencionamos estas criaturas, geralmente fixamos os nossos olhares em Drácula, de Bram Stoker, bem como em seus antecessores, a literatura prévia ao monstro que consagrou as principais características destas criaturas conhecidas por sugar o sangue de suas vítimas e buscar manter os padrões de suas vidas eternas Nesta malha densa de textos, temos Carmilla: A Vampira de Karnstein, de Sheridan Le Fanu, O Vampiro, de John William Polidori, A Nevrose da Cor, de Julia Lopes de Almeida, dentre tantos outros contos imortalizados ao longo da tradição literária ocidental. Por isso, para compreender a presença destes seres em sociedades e culturas diversas, adentrei pelas 212 páginas de História dos Vampiros: Autópsia de Um Mito, publicado por Claude Lecouteux, professor de Literatura e de Civilização Germânica da Idade Média na Universidade de Paris IV-Sorbonne, intelectual conhecido por suas variadas publicações sobre mitos sobrenaturais, tais como lobisomens, feiticeiras, elfos, demônios, dentre outros.

Além da elucidativa introdução e dos apêndices, o livro é dividido em oito capítulos: O Mito do Vampiro; O Homem, A Vida e a Morte; A Vida dos Mortos; Os Precursores dos Vampiros, As Denominações dos Vampiros; Como Se Proteger de Vampiros?; Identificar e Matar o Vampiro; Perguntas e Respostas. Logo na introdução, Claude Lecouteux explica que a volta dos mortos para afligir os vivos é uma questão que “se perde na noite dos tempos”, isto é, vem de tempos tão remotos que não podemos definir com exatidão seu ponto de partida, algo que de fato não é de interesse dos historiadores. Passando por narrativas desaparecidas dos primórdios do cinema e trafegando por produções mais contemporâneas, o autor delineia as explicações de sociólogos em torno dos vampiros com base no florescimento de temas reunidos em torno de doenças, mortes, sexualidade e religiosidade. A mitologia vampírica, além das tenebrosas histórias de horror, passa também pela política, com os “monges comendo às custas dos reis e dos povos”, como disse Voltaire em alguns de seus textos, ou Karl Marx, em suas considerações sobre os capitalistas como sugadores de sangue. É uma introdução riquíssima, bastante elucidativa.

O vampiro é, então, aquele que simboliza por meio da morte e da violência, as inquietações que nascem de fissuras da ordem social do tempo que vagueiam. Basta olhar as metáforas de Drácula para a sífilis, o surgimento da “nova mulher” ou o estremecimento da cultura britânica imperialista diante dos estrangeiros. Em seu primeiro capítulo, o escritor desenvolve breves análises sobre as contribuições de Sheridan Le Fanu, Polidori, Bram Stoker, Tolstoi, dentre outros, delineando também como as enciclopédias trouxeram informações que ajudaram na calcificação deste imaginário em torno das criaturas sugadoras de sangue, presentes também por meio de outras metáforas no espiritismo. No segundo capítulo, há descrições sobre a relação da humanidade com a morte, formas de sepultamento e a maneira como culturas distintas encaram os seus defuntos. Mais adiante, noutras incursões ao longo do livro, temos informações sobre o cristianismo e as tradições populares, bem como os precursores dos vampiros: o evocador, o batedor, o visitante, o nonicida, etc. Nos demais capítulos, Lecouteux traz outras denominações e as informações ficam mais populares ao passo que o livro se aproxima de seu encerramento, com detalhes que já conhecemos pela abundância de temáticas vampíricas na mídia.

A alcunha de professor universitário, importante, não deve afugentar o leitor que não tem uma relação muito frequente com textos de estrutura acadêmica. Em História dos Vampiros: Autópsia de Um Mito, Claude Lecouteux passeia pelos registros históricos sem deixar que a leitura se torne um feudo exclusivo para adeptos ao academicismo. É uma leitura muito acessível. Um livro de referência na área, base para todos aqueles interessados em compreender melhor os rastros deixados por folclores de culturas distintas, amalgamados nos mencionados clássicos da literatura abordados anteriormente. Traduzido por Álvaro Lorencini, a publicação da UNESP traz em sua capa avermelhada um representante de peso na iconografia vampírica, o Conde Orlok, monstro de Nosferatu: Uma Sinfonia de Horror, a polêmica narrativa expressionista de 1922, dirigida por F. W. Murnau, adaptação não autorizada do livro de Bram Stoker que rendeu processos judiciais e ainda hoje gera muitos debates sobre temas múltiplos, dentre eles, a formação da linguagem cinematográfica. Lançado em 1999 na França, o livro aqui apresentado chegou ao Brasil em 2003 e já ganhou uma série de novas edições.

História dos Vampiros: Autópsia de Um Mito (Histoire des Vampires: Autopsie D’un Mythe – França, 1999)
Autoria: Claude Lecouteux
Editora no Brasil: Editora UNESP
Data de publicação no Brasil: junho de 2003
Tradução: Álvaro Lorencini
Páginas: 211

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