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Crítica | Hienas (1992)

por Luiz Santiago
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Apesar de ser o filme narrativamente mais fácil do diretor Djibril Diop Mambéty, Hienas (1992) segue demonstrando um tema recorrente na filmografia do diretor, que é a exploração da questão de classe, colocando em tela conflitos comportamentais, ideológicos e de interesses baseado na falta, na busca ou na posse de dinheiro — o que muitas vezes significa “ter ou não ter o que comer“. Neste filme, o próprio diretor adapta de forma aplaudível a famosa peça A Visita da Velha Senhora (1956), do dramaturgo suíço Friedrich Dürrenmatt, homenageado nos créditos finais do longa.

SPOILERS!

Nesta adaptação, Mambéty segue a estrutura de crítica aos mais diversos grupos sociais, primeiro contextualizado esse espaço geográfico, sua gente, seus arranjos políticos nada elogiáveis e suas necessidades, para logo depois trazer a riquíssima Linguère Ramatou (Ami Diakhate), que retorna à sua vila natal décadas depois de ter sido expulsa de lá, estando grávida de um homem que comprou testemunhas para livrar-se de ter que assumir a criança. Nos primeiros momentos do filme, todavia, não sabemos de nada disso. Aos poucos é que o diretor começa a nos mostrar a realidade do lugar e como as pessoas se comportam diante de uma novidade, especialmente uma envolvendo dinheiro.

Como afirmei antes, a questão de classe sempre esteve como ponto de destaque no cinema de Mambéty, e aqui ele executa de forma cínica e ácida a sua crítica ao pensamento pós-colonial dos senegaleses, que facilmente caíram no consumismo deixando valores e senso de comunidade para trás. Esse “senso de comunidade” é muitíssimo importante quando falamos da maioria das culturas na África subsaariana, e aqui em Hienas essa dinâmica já se apresenta de forma manca na primeira parte do filme, dentro de um foco político viciado que mais adiante mostrará seus frutos numa instituição viciada. Quando a questão do dinheiro se fixa, esse senso é destruído e outro é negativamente construído pela população, a fim de manter as sua hipócrita consciência limpa.

Mambéty utiliza o tecido social dessa vila para mostrar dois tipos distintos de corrupção: a material, que afeta a todos os desejosos de consumir; e a jurídica, que pode estar a serviço daqueles que conseguem comprá-la ou enganá-la sem muita dificuldade. Notem como no início a intenção do povo era bajular a rica visitante, a fim de receber dela alguma compensação em dinheiro. A antigamente próspera e agora pobre vila necessitava disso. Nesse primeiro momento da obra, o tom adotado pelo cineasta é o da comédia, através da qual compreendemos o funcionamento das instituições locais e as relações entre os indivíduos. Já na segunda parte, quando é imposta ao povo uma decisão direta sobre o criminoso Draman Drameh (Mansour Diouf) a atmosfera muda para um drama onde as escalas da justiça recebem maior atenção e onde dilemas morais e éticos batem de frente com uma promessa financeira irrecusável.

Os habitantes de Colobane têm diante de si uma proposta complexa, e as máscaras passam a cair à medida que o cercamento psicológico, e depois o físico, se abatem sobre o homem acusado. O julgamento de seus crimes do passado só é considerado a partir da promessa monetária que se apresenta ao povo, e essa promessa é o bastante para que novas ondas de consciência e novos valores sejam forjados e executados com a aprovação de todos. A vingança e o preço da vida são os temas centrais aqui, com o diretor expondo de maneira muito ácida alguém em uma abusiva posição de poder, seu controle total sobre a economia da cidade e principalmente o que ela é capaz de fazer com todo esse controle, podendo inclusive comprar a alma das pessoas para fazerem algo que serviria apenas ao seu prazer pessoal.

Hienas (Hyènes) — Suíça, França, Senegal, Reino Unido, Países Baixos, Itália, 1992
Direção: Djibril Diop Mambéty
Roteiro: Djibril Diop Mambéty (baseado na peça de Friedrich Dürrenmatt)
Elenco: Mansour Diouf, Ami Diakhate, Faly Gueye, Mamadou Mahourédia Gueye, Omar Ba, Issa Samb, Calgou Fall, Kaoru Egushi, Mbaba Diop, Abdoulaye Diop, Rama Thiaw, Oumi Samb, Tcheley Hanny
Duração: 110 min.

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