Home FilmesCríticas Crítica | Hércules (2014)

Crítica | Hércules (2014)

por Guilherme Coral
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Após um terrível exemplo deixado por The Legend of Hercules, estrelado por Kellan Lutz, era de se esperar que Hércules já viria com certo preconceito embutido. Para piorar, os títulos de ambas as obras foram traduzidas de maneira identica no Brasil, solidificando, de vez, o paralelismo inevitável entre os dois filmes. Onde o primeiro, contudo, nos traz uma retratação praticamente copiada de Spartacus (com direito a arenas romanas em pleno período grego), Hércules, de Brett Ratner, ainda que se devesse se chamar Héracles, se apoia nas origens mitológicas do herói, criando um interessante diálogo entre o homem e a lenda.

De fato, é essa a força motriz de toda a projeção, algo já anunciado desde os minutos iniciais, quando, com uma narração em off, nos é contado sobre a origem do semi-deus e alguns dos doze trabalhos – mais especificamente o Javali de Erimanto, a Hidra de Lerna e o Leão da Neméia. Após um corte que nos leva para o presente da narrativa, contudo, a contestação de tais fatos já é iniciada. Seriam apenas glórias criadas, histórias criadas para solidificar a fama desse homem? A questão aumenta quando descobrimos que Hércules atua junto de um bando de mercenários, através de uma divertida cena que, bem mesclada com uma ação em tom mais leve, já denota o toque de comédia presente na obra.

Ratner, porém, não caminha até o fim em sua desconstrução da lenda – ele para na metade, nos colocando na perfeita dúvida, nos colocando com exatidão no papel não só dos companheiros do herói quanto dos cidadãos comuns, ambos os grupos incertos sobre a origem do homem (ou semideus). Aproveitando dessa constante indagação, o roteiro de Ryan Condal e Evan Spiliotopoulos, criam situações nas quais Hércules realiza ações nada menos que sobrehumanas. Neste ponto entra a precisa escalação de Dwayne “The Rock” Johnson, cujo tamanho mais que nos convence de tais proezas inumanas, nos remetendo imediatamente ao clássico Conan, com Schwarzenegger, que se apoiava nessa mesma característica de seu ator principal.

Não espere, porém, uma primazia da sétima arte, Hércules não se preza a isso. Trata-se de um filme de ação em sua maior pureza, com um roteiro simples que não nos surpreende, mas cumpre seu papel, garantindo bons momentos de combate mesclados a situações de maior tranquilidade, construindo seus personagens com eficácia. Vale ressaltar, também, que não estamos diante de profundas retratações do ser humano e sim personalidades mais rasas que estão, em sua maioria, ali para divertir. O ponto alto é o grupo de mercenários do herói, cujas relações são bem construídas, criando, rapidamente, um vínculo com o espectador, ainda que, individualmente, não sejam bem explorados. Todos eles, inclusive o próprio protagonista, nos divertem, trazendo inúmeras situações cômicas e dramáticas que nos prendem nessa obra de sandálias e espadas.

Para os interessados em História, o filme ainda oferece alguns interessantes paralelismos, ainda que conte com belos anacronismos além de diversos outros deslizes, que não chegam a constituir um defeito, já que a obra, em nenhum momento, visa uma precisão histórica. O maior desses deslizes e, também, o ponto mais chamativo de tais detalhes, é o treinamento que o herói oferece às tropas da Trácia, cujo rei o contrata. Aqui vemos Hércules introduzindo táticas da infantaria romana, além de um equipamento que somente dispensa o gládio. Apesar de constituir um evidente rompimento com a realidade, podemos observar este ponto como uma referência às próprias crenças romanas, que colocavam o semideus como a origem mítica de seu povo.

Esses elementos anacrônicos, contudo, exercem um papel de destaque no filme, garantindo uma das melhores cenas de combate da antiguidade desde 300. Tratam-se de sequências de caráter bastante caótico, bem coreografadas, que fazem bom uso da mixagem de som para construir uma evidente tensão no espectador. O tom grave escutado a cada acerto do porrete de Hércules é especialmente chamativo, conseguindo criar, com exatidão, a percepção da força do herói, além de uma evidente brutalidade em cada combate. A montagem de Dante Spinotti, felizmente não cai no velho problema dos filmes de ação e não apenas confunde o espectador através de cortes constantes.

Tais momentos de maior heroísmo por parte do protagonista ainda são apoiados pelas distintas melodias de Johannes Vogel, que consegue captar com eficiência o caráter épico da narrativa. Por outro lado, a trilha parece apagada nas sequências de menor tensão, não oferecendo músicas memoráveis.

Com tais características em mente, Hércules logo se firma como uma boa surpresa de 2014, saindo do limbo criado por The Legend of Hercules e se firmando como um bom filme de ação, que cumpre seu papel. Seu roteiro simples não atrapalha e cria uma interessante dúvida se o que vemos é um homem ou o filho de Zeus, sabendo se apoiar tanto no realismo quanto na fantasia. Está longe de ser uma obra-prima, mas certamente trará diversão para a audiência.

Hércules (Hercules – EUA, 2014)
Direção:
Brett Ratner
Roteiro: Ryan Condal, Evan Spiliotopoulos (baseado nos quadrinhos “Hercules” por Steve Moore)
Elenco: Dwayne Johnson, John Hurt, Ian McShane, Rufus Sewell, Aksel Hennie, Ingrid Bolsø Berdal, Reece Ritchie, Joseph Fiennes, Tobias Santelmann, Peter Mullan
Duração: 98 min.

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