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Crítica | Hellboy e o Homem Torto

Tentando tirar Hellboy de seu inferno astral.

por Ritter Fan
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Nado um pouco na contramão em relação às adaptações cinematográficas de Hellboy, de longe a mais famosa criação de Mike Mignola nos quadrinhos. Considero o primeiro longa da franquia, por Guillermo del Toro facilmente o melhor de todos até agora e não gosto tanto assim de Hellboy II que, para mim, sofre do mal hollywoodiano do “quanto mais melhor”. Sobre a tentativa fracassada de reboot em 2019, o que posso dizer é que também não o detestei tanto quanto a maioria parece ter detestado. Depois de assistir Hellboy e o Homem Torto, tenho a distinta impressão de que continuarei na contramão – escrevo a presente crítica sem ler as impressões de mais ninguém, como é regra minha -, pois o filme de Brian Taylor, que custou 25 milhões de dólares, quantia que não é exatamente baixa, mas que é metade do que Neil Marshall teve à sua disposição, tem todo o jeito de filme B, além de ser uma obra com o Hellboy e não do Hellboy, se é que me entendem.

Adaptação direta de uma das melhores histórias do personagem, a minissérie em três edições The Crooked Man, lançado nos EUA entre julho e setembro de 2008 e que foi originalmente publicada por aqui com o título O Vigarista, Hellboy e o Homem Torto é o primeiro longa da franquia a contar com Mike Mignola nos créditos de roteirista, créditos esses que ele divide com Taylor e Christopher Golden, o que não é exatamente promessa de qualidade, mas que funciona como um chamariz e, pelo que pude notar, uma tentativa bastante válida de se manter bem próximo ao material fonte. Na história, que se passa em 1959, Hellboy (Jack Kesy) e Bobbie Jo Song (Adeline Rudolph), uma agente novata do B.P.D.P. (Bureau de Pesquisas e Defesa Paranormal), acabam, depois de um acidente de trem envolvendo uma aranha gigante, perdidos em meio a um vilarejo nos Apalaches e tendo que enfrentar o Homem Torto do título (Martin Bassindale).

Trata-se de um longa que defenestra tudo que de mais espalhafatoso Hellboy costuma ter no cinema, inclusive o tom forte de sua pele, que é substituído por matiz mais pálida, e a maquiagem mais proeminente em seu rosto que, aqui, poderia ser completamente humano não fossem os cotocos de seus chifres e, claro, a vermelhidão, e tenta criar uma obra de horror de espaço confinado do subgênero folk horror, em que o personagem titular sequer é o protagonista clássico, mas sim uma espécie de condutor da narrativa somente. Não há tentativas de explicar quem é Hellboy e nem de racionalizar o que ocorre ao seu redor, com tudo sendo tratado com um razoável grau de naturalidade, o que pode levar a estranhamento por parte de quem nunca sequer tenha ouvido falar na criação de Mignola.

E o bom de Hellboy nos quadrinhos é que ele funciona bem tanto no macro, quanto no micro, como, aliás, devem ser as melhores criações da Nona Arte. É perfeitamente possível aceitar Hellboy lutando contra demônios superpoderosos em ambiente urbano com o uso generoso de computação gráfica enquanto masca um charuto da mesma forma que é perfeitamente possível aceitar um Hellboy mais humano e relacionável em uma casa mal-assombrada perdida no meio do nada com coisa nenhuma, com direito a clássicos jumpscares e uma mistura suficientemente eficiente de efeitos práticos com CGI. Taylor, talvez mais conhecido por ter escrito e dirigido os frenéticos filmes da franquia Adrenalina, protagonizados por Jason Statham, mas que tem experiências problemáticas com adaptações de quadrinhos (vide seus trabalhos em Motoqueiro Fantasma: Espírito da Vingança e Jonah Hex), apesar da ótima série Feliz!, aproveita-se da versatilidade do personagem e não tem receio algum em tirar toda a possivelmente esperada pompa e circunstância dele, transformando-o quase que em “apenas mais um” sujeito que enfrenta manifestações sobrenaturais.

Mas isso não quer dizer que Taylor acerta sempre. Na verdade, sua direção é problemática na forma como ela tenta construir uma atmosfera desolada que não se sustenta por mais de alguns minutos e que depende demais de tropos narrativos mal aproveitados. Uma coisa é nós sabermos que Hellboy não sofrerá danos permanentes no filme, outra bem diferente é o cineasta telegrafar cada movimento dos personagens e fazer uso de sustos fáceis que nem sustos acabam sendo e de repetições do mesmo tipo de “cena assustadora” em segundo e até terceiro planos, normalmente com manifestações do Homem Torto. Se a sequência climática bipartida tem interessantes continuidades visuais, elas não são suficientes para justificar toda uma estrutura de horror que não exatamente leva a momentos catárticos ou potentes. É como se a história simplesmente acabasse a certa altura e não exatamente chegasse ao seu fim, algo que reputo menos ao roteiro e mais à decupagem insatisfatória de Taylor que acaba forçando uma montagem claudicante.

Hellboy e o Homem Torto é uma tentativa de seguir com Hellboy por um caminho audiovisual diferente, mais contido, menos bombático. No meu livro, Brian Taylor mais acerta do que erra quando tudo acaba, mas, mesmo assim, o resultado final não me parece capaz de levantar novamente o interesse pelo personagem, interesse esse que, mesmo em seu auge, nunca foi realmente tão grande, se quisermos ser francos. Mas quem sabe não estou enganado?

Hellboy e o Homem Torto (Hellboy: The Crooked Man – EUA/Reino Unido/Alemanha, 2024)
Direção: Brian Taylor
Roteiro: Christopher Golden, Mike Mignola, Brian Taylor (baseado em criação de Mike Mignola)
Elenco: Jack Kesy, Martin Bassindale, Jefferson White, Adeline Rudolph, Joseph Marcell, Leah McNamara, Hannah Margetson
Duração: 99 min.

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