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Crítica | Heartstopper – Vol.2: Minha Pessoa Favorita

Descobertas e responsabilidades.

por Luiz Santiago
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Em Dois Garotos, Um Encontro, primeiro volume da série em quadrinhos Heartstopper, a desenhista e roteirista Alice Oseman se preocupou em criar um encontro muito bonito entre dois meninos do Ensino Médio que acabam se apaixonando e, por estarem em momentos diferentes de suas vidas (em termos de entendimento de suas próprias sexualidades) precisam encontrar um terreno firme para pisar e ver se esse encontro e se o sentimento que rapidamente passaram a nutriz um pelo outro irá levá-los para algum outro lugar. Embora o volume inicial termine de maneira reticente e com atmosfera um tanto melancólica, a mensagem de esperança, companheirismo e profundo sentimento entre esses dois amigos (que se gostam mais do que simples amigos) é a grande estrela do volume e a verdadeira face dessa série, que aqui em seu segundo volume, Minha Pessoa Favorita, lida com o que foi plantado anteriormente.

Para quem chegou aqui após a adaptação desses quadrinhos para a TV ou do primeiro volume publicado, já tem uma boa noção de como Alice Oseman desenha situações de conflito, de como ela diagrama as suas páginas para caber em momentos marcantes da narrativa e de como o seu letramento também é uma forma de representação das emoções dos personagens e até mesmo de um bloco inteiro do drama, o que faz desse segundo volume uma leitura ainda mais gostosa que a do primeiro, porque entendemos melhor essa linguagem e porque temos mais páginas e mais situações onde podemos ver tudo isso  melhor representado — aliás, há que se elogiar as páginas de diário dos garotos ao final do volume e o belíssimo conto da sala de música que mostra a revelação da sexualidade de Tara Jones e Darcy Olsson.

Aqui, o destaque narrativo é Nick e sua descoberta da sexualidade, sua luta para deixar claro para o mundo que ele não tem medo de ser quem é. É impossível ler essas páginas e não se sentir aquecido ou, para pessoas LGBT, não se sentir genuinamente representado pela maneira como a autora coloca essa luta interna para entendimento e exposição pessoal para o mundo. Mesmo para quem teve uma saída de armário tranquila, dentro e fora de casa, a crise de identidade, a pressão social, o medo ou receio diante dessa “novidade pública” nos colocaram em situações tão angustiantes na adolescência que quase nos sufoca, e Heartstopper exibe isso com muita verdade, mostrando as muitas formas de ver essa situação, algo que certamente irá servir de auxílio para adolescentes desta e de futuras gerações que tiverem contato com a obra. Dá até para ficar emocionado.

Nessa luta pela descoberta, vemos também a proximidade cada vez maior entre Nick e Charlie, ao passo que conhecemos muito mais sobre os dois. As fichas de moda da dupla, ao final do volume, completam essa visão geral a respeito deles e adicionam um novo item de fofura à longa lista. A esta altura, já é bastante comum ouvir dizer que tanto a série quanto os quadrinhos de Heartstopper são fofos. Eu estava pensando em algumas cenas das duas mídias e tentando buscar elementos narrativos e visuais que são explorados de maneira tão forte e tão bela que conquistaram tantas pessoas. A conclusão a que que cheguei é que Alice Oseman conseguiu traçar uma linha representativa que faz com que adultos lembrem-se com um olhar nostálgico dos momentos mágicos (ou até dos momentos difíceis) dessa travessia; e faz com que adolescentes vejam ali um pedaço real de suas vidas. A honestidade na criação do drama é a chave de tudo. E o tom que a autora escolheu para trabalhar (amor e felicidade como principais armas contra o mundo aterrorizante) faz toda a diferença.

Minha Pessoa Favorita mostra um romance nascendo, o começo de um namoro entre duas pessoas que nunca namoraram antes. E isso tem um sentido especial aqui porque além da novidade dos sentimentos, do contato físico, das conversas bonitas, da companhia, da felicidade de ter por perto alguém que se importa com você e que realmente tem sentimentos por você, há essa ideia de um porto seguro em relação à sexualidade recém-exposta. Ao contrário do que algumas pessoas dizem por aí, Heartstopper não “força” uma realidade inexistente e fácil demais. Não há um único quadro ou uma linha de roteiro nessas HQs que indiquem isso. A questão é que esta série mostra um lado que, na maioria das vezes, as ficções representativas escolhem ignorar. Como se pessoas LGBT também não tivessem momentos lindos e felizes em suas vidas. E talvez por isso esta série tenha feito tanta diferença. Ela não se esconde das durezas do mundo. Mas também não faz desses obstáculos a única coisa que existe. Apesar dos pesares, a vida é maravilhosa. E se torna ainda melhor quando amamos e somos amados. Basicamente, isso é o que vemos retratado aqui.

Heartstopper – Vol.2: Minha Pessoa Favorita (Heartstopper: Volume Two) — Reino Unido
Roteiro:
Alice Oseman
Arte: Alice Oseman
Editora original: Hachette Children’s Group, 11 de julho de 2019.
No Brasil: Editora Seguinte, 2021
320 páginas

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