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Crítica | Halston

por Kevin Rick
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Eu gosto de biografias sobre a ascensão e queda de artistas, pois majoritariamente trazem um retrato realista entre o talento, o mercado e a auto-sabotagem que permeiam a arte e o artista. Este discurso da desarmonia entre a arte e o meio artístico, assim como a genialidade natural sombreada pela crescente indulgência do excesso, criam uma interessante discussão da moralidade e a realidade dentro do comércio da arte e da vida pessoal de quem a cria. Halston, a mais nova minissérie da Netflix, fruto da parceria milionária com Ryan Murphy, assume essa premissa que disse como cerne da biografia do estilista americano Roy Halston Frowick (Ewan McGregor), ícone fashion dos anos 60 até a década oitentista.

O show coloca em evidência o nome Halston, seja ele identificado como o artista monômio, uma palavra que significa designs minimalistas e deslumbrantes de ultrasuede que viraram febre, um império da moda, e, principalmente, a marca Halston como empresa. O roteiro preza bastante pela deslocação da arte do protagonista para o negócio, desenvolvendo muito bem a divergência entre comércio e talento, desde a relutância inicial de Halston em vender seu nome para o magnata David Mahoney (Bill Pullman), caindo na “armadilha” ao se ver sem dinheiro, até os problemas em manter o processo criativo com exigências empresariais, e por fim seu desapego da criação ao mergulhar nas consequências do império: riqueza, luxo, sexo, drogas e ego. A jornada proposta pela minissérie é a diluição da arte e do artista através do crescimento da marca enquanto empreendimento, afinal, o nome como sinônimo de talento artístico sobrevive frente a comercialização e a vida excessivamente suntuosa?

Quando Halston se atém a esse debate e os questionamentos em torno do mercado da moda, a obra consegue um interessante olhar introspectivo, até crítico, à infeliz conexão entre o prazer do ofício e o meio que é exportado. Acredito que os problemas iniciam-se quando a narrativa parte para o âmbito privado do protagonista, pois o roteiro de Sharr White e Ryan Murphy, apesar de continuamente colocar foco no nome Halston, faz bem pouco para trazer identidade ao personagem titular. Primeiro que a proposta é a comum derrocada do gênio narcisista enamorado com o estilo de vida exagerado, e eu não vejo muito problema nesse tipo de construção, pois, bem, é o que aconteceu, e o arco da consequência da fama, a despeito do clichê, funcionaria como proposta paralela ao embate arte vs mercado. O problema é que não existe pessoalidade.

Halston tem traumas infantis, e o show continuamente insere flashbacks do personagem na casa de seus pais, mas esse núcleo é completamente esquecido. O protagonista tem problemas com drogas, e a narrativa vez ou outra toca na questão da reabilitação, mas o vício é mais representado como um problema do mundo da moda que necessariamente para o estilista. E essa toada de superficialismo vira regra, pois bem pouco é dito ou mostrado do seu processo criativo – e a culpa aqui é da direção branda e pouco exploratória da profissão estilística -, personagens secundários como Joel Schumacher, Elsa Peretti e Liza Minnelli vem e vão sem uma construção dramática pessoal ou de desfecho no relacionamento com Halston, a comunidade LGBT e a dramaticidade da vinda da AIDS são resignadas a momentâneos panos de fundo, e o romance entre o ícone fashion e Victor Hugo é mais sexual do que complexo, o que, aliás, termina sendo minha crítica principal ao estudo psicologicamente superficial de Halston: a minissérie propõe complexidade sem dar motivo, traz conflito pessoal sem demonstrar o porquê da discórdia interna do personagem. O que é uma pena, pois Ewan McGregor está soberbo no papel, desde seus maneirismos, mudança de voz e a caracterização narcisista + solitária do personagem, dando um toque de singularidade a um personagem mal trabalhado.

Além da falta de pessoalidade, acredito que a obra peca na sua estrutura, que a despeito da duração de cinco episódios, não encontra uma objetividade temporal, continuamente costurando determinados eventos da vida de Halston entre o sucesso e a perda, sem um meio-termo de passagem ou respiros narrativos para esticar algum núcleo ou, e já retornando a crítica anterior, momento de construção de algum elemento identitário do protagonista. A obra acaba caindo na maior problemática de biografias ao se ater à transmissão de informações do personagem real ao invés de focalizar a adaptação em uma proposta ficcional própria.

Por fim, Halston é interessante no seu discurso da perda da arte e do talento no mercado, todo o foco no nome e na marca do personagem, até com pequenos toques de legado, traz um bom conflito dramático do retrato do mundo da moda pelas lentes do épico de ego e traição na carreira do estilista titular. E esteticamente falando, a obra não é espetacular, mas convence com seus belos figurinos e cores exageradas, mantendo o vermelho do amor/luxúria em evidência no caráter de excesso desta vida extravagante. Infelizmente, quando o roteiro sai das questões mercadológicas e artísticas e adentra o privado de Halston, a obra se mostra um raso e estruturalmente comum estudo pessoal. Termina por serem cinco episódios curiosos mergulhados no ordinário.

Halston (EUA, 14 de maio de 2021)
Desenvolvimento: Sharr White (baseado no livro Simply Halston de Steven Gaines)
Direção: Daniel Minahan
Roteiro: Ian Brennan, Ryan Murphy, Ted Malawer, Tim Pinckney, Kristina Woo, Sharr White
Elenco: Ewan McGregor, Rebecca Dayan, David Pittu, Krysta Rodriguez, Bill Pullman, Gian Franco Rodriguez, Sietzka, Megan Gerald, Molly Jobe, Maxim Swinton, Deya Danielle Drake, Sullivan Jones, Eric T. Miller
Duração: 237 min. (05 episódios)

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