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Crítica | Green Card: Passaporte para o Amor

Um filme pouco característico do diretor.

por Ritter Fan
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Sociedade dos Poetas Mortos foi, merecidamente, um gigantesco sucesso de crítica e de público de Peter Weir, algo providencial para sua carreira nos EUA em razão do fracasso do longa imediatamente anterior, A Costa do Mosquito. No entanto, curiosamente, o projeto seguinte do cineasta, Green Card: Passaporte para o Amor, representou, sob diversos aspectos, um passo atrás, seu longa menos característico até esse ponto de sua filmografia e seu primeiro e único trabalho solo de roteiro que foi ostensivamente escrito como uma espécie de peça publicitária para solidificar a carreira do francês Gérard Depardieu em Hollywood, algo que funcionou até certo ponto.

Não quero com isso dizer que o filme é imprestável, pois ele está longe de ser isso, mas sim que, apenas, Weir vinha em uma sucessão impressionante de grandes acertos autorais desde que colocou Confusão em Paris, seu primeiro e sem dúvida mais bizarro longa-metragem, nas telonas australianas. Green Card, mesmo premiado como foi (levou Golden Globes de Melhor Filme de Comédia ou Musical, Melhor Ator e concorreu ao Oscar de Melhor Roteiro) e mesmo sendo diferenciado no meio bastante tumultuado e genérico das comédias românticas, ainda é um representante do referido gênero que tem todas as marcas de “filme de encomenda”, de uma produção mais simples que, claro, todo diretor tem todo direito de fazer, mas que, no final das contas, pouco agrega ao corpo de seu trabalho.

A premissa lida com duas pessoas que não se conhecem, a horticultora americana Brontë Parrish (Andie MacDowell) e o compositor francês Georges Fauré (Depardieu) que se casam por conveniência, ela porque quer alugar o apartamento de seus sonhos cujo condomínio só aceita pessoas casadas e ele porque quer obter o status de residente permanente nos EUA, o green card do título. Mas, claro, só casar não basta e o departamento de imigração exige que os dois comprovem que realmente se casaram para conviver, para dividir a vida juntos e não algo de fachada, o que exige que Georges se mude para o apartamento de Brontë, levando-os a se conhecerem melhor, e, mais do que obviamente, se apaixonarem. Ou seja, nada de novo no front das romcoms.

Mas, como eu disse, Weir executa sua premissa de maneira elegante, imprimindo aí – e só aí – seu estilo que normalmente trabalha com narrativas de queima lenta e um cuidado, um carinho grande com seus atores e personagens. No caso em questão, é interessante notar que o cineasta faz do peculiar apartamento de Brontë um personagem importante na história, pois sua característica principal, ou seja, ter uma grande estufa/jardim de inverno em seu interior, com uma enorme variedade de plantas, paredes de vidro, chão de porcelana com escoamento para água e uma claraboia que pode ser aberta para receber chuva, é como uma projeção da personalidade de sua inquilina e se torna imediatamente cativante. Weir mantém sua obra por muito tempo em espaço confinado, investindo tempo primeiro na relação de Brontë com o apartamento e, depois, dela com Georges no apartamento, o que me leva então à segunda característica peculiar: o lado romântico é quase que completamente platônico, com os dois somente se beijando quando o filme já está para acabar. Dessa forma, Weir afasta-se do óbvio ululante, do que todo mundo espera e ganha tempo para fazer com que sua câmera observe a dupla (trinca, contando com o apartamento) com vagar e ritmo.

Mesmo assim, porém, Green Card não exatamente decola, talvez porque Depardieu não funcione bem como galã ou talvez porque a história em si seja mais afeita à um curta-metragem, por faltar substância e uma mensagem que vá além das banalidades básicas de obras do gênero. Diria até mesmo que Weir pecou na forma como mergulha na personalidade de Brontë e Georges, ou, melhor dizendo, como ele não mergulha nelas, pois os dois ganham abordagens consideravelmente rasas, ainda que simpáticas, que talvez só atraia aqueles mais suscetíveis ao romance que fica no ar constantemente, ainda que nunca chegue às vias de fato de verdade.

Se tem uma coisa que posso dizer com muita certeza é que, se Green Card: Passaporte para o Amor tiver sido mesmo um filme “de encomenda”, pelo menos essa encomenda foi feita a Peter Weir, um cineasta de mão cheia que, mesmo quando não está particularmente inspirado, consegue entregar algo que, de uma maneira ou de outra, tem um je ne sais quoi que faz a jornada valer a pena. Se a premissa não é particularmente memorável e se a dupla de atores funciona bem, mas não bem o suficiente para segurar o filme nas costas, Weir consegue dar seu jeito ao colocar a narrativa em banho maria para fazer o espectador apreciar a forma como os personagens aos poucos se aproximam no curioso apartamento com seu próprio jardim botânico.

Green Card: Passaporte para o Amor (Green Card – EUA/França/Austrália, 1990)
Direção: Peter Weir
Roteiro: Peter Weir
Elenco: Andie MacDowell, Gérard Depardieu, Bebe Neuwirth, Gregg Edelman, Robert Prosky, Mary Louise Wilson, Lois Smith, John Spencer, Ann Dowd, Larry Wright, Ethan Phillips
Duração: 107 min.

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