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Crítica | Godzilla vs. Megaguirus

"Sai, inseto!"

por Luiz Santiago
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Se Godzilla 2000: Millennium ignorou todos os acontecimentos dentro da série até aquele momento, com exceção dos ocorridos no filme de 1954, este Godzilla vs. Megaguirus dobra a aposta e também ignora a exposição de Millennium, apresentando a sua própria cronologia dentro da Nova Série. Nessa realidade, apenas os fatos do Gojira clássico são considerados. A capital do Japão foi transferida para Osaka, o país ‘supostamente’ se livrou de tudo o que diz respeito à energia nuclear e um modelo tecnológico, extremamente avançado, faz parte da realidade desse mundo que odeia o destruidor de maquetes. É um reinício de franquia… dentro de um reinício. E por incrível que pareça, não foi uma iniciativa desprezível da Toho, ao contrário, o resultado aqui é consideravelmente melhor do que o que foi visto na estreia dessa nova fase de filmes.

Talvez o ponto que mais constantemente afasta os espectadores deste filme seja a presença de um aparato tecnológico não correspondente ao mundo dos anos 2000, o que é compreensível, até certo ponto. O que temos que considerar é o fato de que o filme deixa muito claro que esta representação do Japão e do mundo não são um espelho da nossa realidade. Quando entendemos isso, fica mais fácil abraçar a ideia geral da obra e relativamente aproveitar os exageros e as maluquices tecnológicas que o roteiro de Hiroshi Kashiwabara e Wataru Mimura (ambos vindos de Millennium) inventa aqui. Compreendida essa abordagem, vale ressaltar que a ideia para uma tecnologia ligada a um “buraco de minhoca controlado” é sim absurda e não condiz com o avanço científico que vemos nesse cenário, basta focar a parca cobertura industrial para além do centro de pesquisas além da fragilidade desse mundo aos ataques dos invasores.

Esse lado do roteiro, contudo, recebe um equilíbrio aceitável de outras faces da história, uma delas, o núcleo humano, que neste filme tem uma das melhores exposições que eu já vi em uma obra com kaijus. O arco dos cientistas faz sentido e, mesmo que não seja perfeito em sua concepção total (a patética “vingança monstruosa“, iniciada no filme anterior, continua ativa aqui), cumpre o seu propósito com uma linha de ação que pende para o humor leve e, noutra ponta, para o engajamento de uma militar que honra a memória de um companheiro morto no combate a Godzilla. A direção também faz uma abordagem interessante dos habitantes das cidades afetadas pelo lagartão e pelo Meganula/Megaguirus, com cenas bem pensadas para as paisagens inundadas e destruídas — o que não significa que o “efeito maquete” tenha desaparecido. A opção por representar frontalmente a “capacidade de inteligência humana contra os monstros gigantes” continua como mote da Era Millennium, assim como uma grande dose de emoção no tratamento dos personagens principais, sem apelar para o melodrama.

Efeitos como a ressonância gerada pelo bater das asas de Megaguirus, e a sua capacidade de extrair parte da energia atômica de Godzilla são os maiores destaques do inseto. Seu voo rápido também é interessante porque consegue desorientar o lagartão, garantindo pelo menos 20 minutos de uma luta encarniçada, ao mesmo tempo em que os humanos tentavam utilizar sua tecnologia impossível para mandar o Rei dos Monstros para outra dimensão. No processo, o espectador precisa ter muito boa vontade para ignorar as toneladas de coincidências narrativas, pois em alguns pontos, fica difícil lidar com as decisões do grupo de cientistas. Em contrapartida, é justamente desse núcleo que sai um dos momentos mais legais da saga, indicando corrupção do governo e desejo de poder, de algum político, ao usar vidas humanas inocentes para manter Godzilla ativo e atacando. Até aqui, o tratamento da série Millennium para o titã é o seguinte: ele deve ser exterminado, por ser um inimigo pleno, e todos os esforços estão direcionados para o extermínio dessa ameaça.

O caminho percorrido para a revelação Megaguirus e a forma como o inseto vai dominando a cena nos faz questionar a inteligência dos cientistas dessa realidade. Eles notam que Godzilla quer eliminar a bizarrice voadora — que, aliás,  só existe por conta de um experimento dos próprios cientistas com a arma de “buraco de minhoca controlado” –, mas continuam com a ideia fixa de que o lagarto atômico deve ser eliminado para sempre. Um tipo de burrice que, ao menos dessa vez, não torna o roteiro estúpido; antes, cede oportunidades para que a trama avance até os confrontos divertidos e um final cheio de suspense, com um alerta nas entrelinhas que assusta um pouco: agora que o Rei dos Monstro não está mais na Terra, o que será dos humanos se outra grande ameaça incontrolável aparecer? As mesmas armas que serviram para levar Godzilla para outra dimensão, poderão funcionar em outra criatura? A sensação que fica, é a de uma aparente vitória que a humanidade nunca deveria ter tido.

Godzilla vs. Megaguirus (ゴジラ×メガギラス / Gojira tai Megagirasu: Jî shômetsu sakusen) — Japão, 2000
Direção: Masaaki Tezuka
Roteiro: Hiroshi Kashiwabara, Wataru Mimura
Elenco: Misato Tanaka, Shôsuke Tanihara, Masatô Ibu, Yuriko Hoshi, Toshiyuki Nagashima, Kôichi Ueda, Kôichi Yamadera, Yûsaku Yara, Kôji Katô, Tsutomu Kitagawa, Minoru Watanabe, Shigeo Katô, Susumu Kurobe, Masaaki Tezuka, Masanobu Katsumura, Motoko Nagino, Katsuo Nakamura
Duração: 105 min.

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