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Crítica | Gato de Botas (2011)

por Davi Lima
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gato

Dentre os personagens da trupe franqueada de Shrek, Gato de Botas sempre teve o perfil de ter um spin off mediante a tantas histórias que ele contava sobre o passado, assim como suas características heroicas de Zorro. Reunindo essas qualidades de um coadjuvante clássico, alá Han Solo, o felino fora da lei e caçador de recompensas tem sua origem e seu lado honroso contado em meio a uma grande casca de ovo que o protagonista precisa descascar. A tática do diretor Chris Miller conversar a comédia do filme com o gênero faroeste hispano-americano e o romance dançante diferenciam o longa animado, mas tudo isso fica encruzilhado em Humpty Dumpty, a casca de ovo a ser desvendada e que o protagonismo do Gato de Botas escorrega.

Essa ambiguidade da casca de ovo parte muito da armadilha que o filme Gato de Botas projeta para si. O conceito do personagem Humpty Dumpty é o perigo de um ovo cair de um muro e se quebrar, e esse perigo vem de sua estrutura física insegura de se apoiar, andar, enfim, se movimentar. De certa forma a história de um fora da lei como Gato de Botas se envolve com esse movimento pendular, em que por um lado ele seja herói e por outro como vilão, estilo Robin Hood de San Ricardo, cidade que órfão Gato pertence no longa. Dessa maneira, os dois personagens, Humpty e Gato, não apenas funcionam em amizade por essa junção de conceito e fora da lei, mas pela personalidade de cada personagem no filme, em que um é galanteador imponente e comicamente é um felino frágil, assim como o ovo de ares britânicos não consegue se manter estável em sua índole. Por isso, há uma completude dramática, e o passado deles em conflito anseia por uma grande pausa no filme para ser declamado pelo Gato, enquanto Kitty Pata Mansa dorme, ou reclama de sua introdução “senta que lá vem a história.”

Infelizmente, esse projeto de paralelismo entre os dois personagens e os vários momentos cômicos ao longo da jornada pelos canyons e desertos com Dumpty, Gato e Kitty em busca dos três feijões mágicos não passam de uma casca de ovo para resolver o conflito de traição dos personagens complementares. O problema não é haver uma resolução para isso, e sim o desenvolvimento narrativo da obra em busca dos ovos de ouro e do pé de feijão são passagens para se disfarçar o rancor dos personagens, não para dramatizar o ovo e as botas. Porque o ovo é instável, prestes a cair e descascar se posto em pé, e as botas do gato, como comentado no filme, são um símbolo de honra que visual e nominalmente é o diferencial deslocado do personagem felino, que as retirando pela-o. 

É certo que a franquia Shrek sempre debochou, “intertextualizou” e desvirtuou os contos de fadas, por isso a história principal da animação Gato de Botas ser ir atrás dos ovos de ouro assim como o João Pé de Feijão contraria a linguagem estabelecida pela Dreamworks, a princípio. Não há enganação do filme quanto a isso, em vista que é perceptível como Dumpty não é um personagem confiável em sua atuação como personagem, como ele anseia muito que o Gato vá com ele atrás da galinha dos ovos de ouro por meios românticos de Kitty, e a periodização posta na obra cinematográfica de transição no objetivo dos ovos contém um ritmo relativamente acelerado em situações para indicar que o escopo do segundo ato, ou melhor, do filme, não é o desafio de roubar os ovos de ouro. Então qual seria o problema dessa dita casca de ovo amarrada no longa?

Durante o filme há uma apreciação grande para que o personagem Humpty Dumpty seja vilanizado, especialmente envolvendo o passado “prelúdico” da infância a adolescência dos dois personagens, quando Humpty incrimina o Gato num assalto, assim como ele atrapalha o aparelhamento, tanto de espécie, dança e conversa, dos dois gatos Kitty e Gato de Botas que criam um clima romantico caliente. Enquanto isso é cumulativo, o clímax na virada para o terceiro ato enraivece ainda mais o espectador, que certamente já estava na corda bamba de desconfiar do ovo de sua amizade e seus planos. Diferente acontece com o Gato que é descascado muito anteriormente no cronômetro da história. Os patamares dos dois personagens, por isso, não se equivalem no ato final, e por essa razão a entrega de redenção, ou do que há por trás da casca de ovo é um discurso humanista em uma música mal rimada. Mediante um ovo central no filme, não só as piadas de fritar, chocar e estrelar entram em discussão de qualidade, e sim como a casca de ovo narrativa e material serve para ser quebrada e desvendar quem é o Gato de Botas, e para desvalorizar o deboche “shrekriano” com os contos de fadas como uma mera armadilha vingativa. 

Refletindo-se o que há por dentro de Humpty Dumpty, tanto o anseio sonhador e aventureiro do personagem pelos feijões mágicos como para ter brilho, assim como ele teve ciúme de Gato receber as botas como herói de San Ricardo, são legítimos e harmônicos com o bambolear de motivações do personagem e sua casca. Até certo ponto, o pouco tempo que resta de escolha de redenção e drama no ato final do filme ajuda o ovo a se desequilibrar do muro de maneira intensa, fatídica e impactante, mas o impulso para isso acontecer é refém da farsa do desenvolvimento do filme. A montagem de divisão de tela com variados planos médios, gerais e closes, relatando a inspiração do faroeste como medida cômica, e a trilha sonora de Henry Jackman que valoriza o guitarron mexicano com os momentos dançantes e musicais entre Kitty e Gato, são fatores formais que não se perdem, dando uma cara única para o spin-off, sem dúvida. No entanto, a rima Humpty Dumpty fica alheia em sua casca maldosa, mesmo com um coração dourado que o longa-metragem queira entregar.

Desse jeito, Gato de Botas fica num impasse pouco gentil e pouco evidente ao terminar o filme com a agitação musical da canção Americano de Lady Gaga. Provavelmente, por Gato de Botas ser um personagem facilmente desvendável em sua casca, como normalmente os coadjuvantes se tornam quando são postos como protagonistas sem adições necessárias de personalidade, em que ele mesmo se define facilmente para Kitty, da mesma forma que Lady Gaga delineia um galanteador; Humpty Dumpty precise dar a diretriz da decisão climática entre o ovo e a galinha para um felino. A diversão que suporta o spin off de Shrek é garantido, com Jack e Jill, por exemplo, com piadas certeiras sobre a intimidade do casal, entre outros contextos cômicos realistas que só a Dreamworks permite, mas garante um punhado de insatisfação ao se considerar o filme definitivo do icônico Gato de Botas, o zorro dos contos de fadas contemporâneos do cinema hollywoodiano.

Gato de Botas (Puss in Boots) – EUA, 2011
Direção: Chris Miller
Roteiro: Tom Wheeler
Elenco: Antonio Banderas, Salma Hayek, Zach Galifianakis, Billy Bob Thornton, Amy Sedaris, Constance Marie, Guillermo del Toro, Mike Mitchell, Rich Dietl, Ryan Crego, Tom Wheeler, Conrad Vernon, Tom McGrath, Bob Joles, Latifa Ouaou, Bob Persichetti, Chris Miller, Jessica Schulte
Duração: 90 minutos

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