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Crítica | Fúria Primitiva (Monkey Man)

Aparentemente, um "John Wick indiano".

por Luiz Santiago
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Depois de uma atribulada produção (leia-se: pandemia), mudança nos acordos de distribuição (que inicialmente seria da Netflix) e até problemas com recursos durante as filmagens, especialmente após o ator e diretor Dev Patel ter que passar um tempo parado, porque se machucou durante uma sequência de luta, Fúria Primitiva (Monkey Man) chega para o grande público e reflete um pouco dos problemas que envolveram a sua criação. Estreia de Patel como diretor, o filme é, em essência, uma história de vingança; mas por conta de uma ideia do jovem cineasta — que também coescreve o roteiro e interpreta o papel principal — sobre como representar esse gênero, vemos a adoção de diversos outros caminhos dramáticos, levando a obra para lugares interessantes, mas que infelizmente não se completam e, muitas vezes, acabam não se conectando bem com a unidade do filme.

Um dos grandes problemas de expectativa aqui, residiu na propaganda de distribuição do longa, vendendo-o como um “John Wick indiano“. Claro que existe um motivo para isso, até porque a essência da ação violenta toma conta da película, mas o diretor deixa bem claro que não quer apenas a ação-pela-ação… e também não quer fazer de todo o tempo fílmico uma corrida incessante de porradaria e fugas. Ao construir as camadas de sua história, Dev Patel acrescenta algo para além da briga, do sangue e dos enfrentamentos, e é por isso que faz da saga de vingança um espelho da narrativa hinduísta de Hanuman (deus-macaco que era uma das encarnações de Shiva) e uma crítica social estendida a questões religiosas, políticas, de gênero e de castas. Não é preciso pensar muito para entender que essa miríade de facetas se desencontra no desenvolvimento do enredo e comprometem a criação de uma história sólida e com aceitável foco.

Para um marinheiro de primeira viagem atrás das câmeras, até que Patel consegue bons momentos. Por mais que a montagem a seis mãos atrapalhe o aproveitamento de algumas sequências (especialmente nas duas últimas lutas, mas é bom deixar claro que este setor técnico é problemático o filme inteiro), o ritmo interno e a mistura de aspectos sociais aos muitos espaços de ação plena dão à obra uma cara diferente e prendem o espectador em toda a 1ª hora de projeção, que é boa. Daí para frente, ou seja, em toda a 2ª hora da fita, os desvios narrativos se tornam tão frequentes e são tão grandes, que fica difícil aproveitar a passagem entre os blocos de treinamento do protagonista, seu passado, as ações infames do Chefe Rana e as cordas políticas manipuladas por Baba Shakti, um líder espiritual que tinha outras coisas em mente para além das questões divinas.

Como não consegue satisfazer todos os núcleos abertos, Fúria Primitiva termina em uma nota menor, após um clímax cheio de nuances dúbias; aqui agradando, ali causando estranheza visual, como as saias das lutadoras do templo rodando na frente da câmera ou o encerramento do grande bloco de ação que empurra o filme para o seu final. Em contrapartida, o protagonista cativa e engaja o público, que entende as condições que o empurram para aquela missão. Na mesma medida, fica relativamente difícil aproveitar tudo o que está ligado ao personagem, pois as linhas que separam um bloco do outro (como as cenas de luta livre, por exemplo) são tênues e, mais uma vez, atrapalhadas por uma montagem que não tem constância e não respeita a proposta das cenas.

Gosto muito da direção de fotografia aqui, assim como da trilha sonora, que pelo menos consegue manter o compasso de ação sem muitos exageros. Em sua ânsia de criar um “filme de ação mais cerebral” Dev Patel acabou realizando mais uma obra de violência pela violência, embrulhada num enredo que aponta para muitos lados, acerta apenas alguns alvos e acaba abandonando a maioria deles por falta de interesse. Talvez os problemas de produção do longa tenham definido muito desse seu padrão final, que mesmo sendo irregular na totalidade, não deixa de divertir e criar uma boa torcida no público. De “John Wick indiano“, porém, sobra pouco. Bom mesmo seria terem encontrado outro caminho de marketing.

Fúria Primitiva (Monkey Man) — EUA, Canadá, Singapura, Índia, 2024
Direção: Dev Patel
Roteiro: Dev Patel, Paul Angunawela, John Collee
Elenco: Dev Patel, Pitobash, Jatin Malik, Sikandar Kher, Sobhita Dhulipala, Makrand Deshpande, Ashwini Kalsekar, Vipin Sharma, Adithi Kalkunte, Jomon Thomas, Pehan Abdul, Brahim Chab, Suhaimi, Vijay Kumar, Jino A. Samuel, Kalih Dewantoro
Duração: 121 min.

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