Home FilmesCríticasCatálogos Crítica | Fora de Controle

Crítica | Fora de Controle

Alguém sabe o que está acontecendo?

por Rodrigo Pereira
1,1K views

Personagens de Fora de Controle na cena do enterro.

Ben (Robert De Niro) é um famoso produtor de cinema hollywoodiano e está para enfrentar uma semana que colocará sua carreira em risco. Enquanto Lou (Catherine Keener), a chefe de um estúdio, demanda mudança no final de um filme estrelando Sean Penn, o produtor precisa convencer Bruce Willis a se barbear para que um outro filme milionário não seja cancelado. Em meio a uma guerra de vaidades e excentricidades, Ben tenta se reconciliar com sua ex-esposa Kelly (Robin Wright), por quem ainda nutre forte sentimento. Não importa por qual ângulo olhemos, a situação parece totalmente Fora de Controle.

Dirigido por Barry Levinson, Fora de Controle é extremamente bem sucedido em passar não só a confusão incontrolável que é a vida de Ben durante alguns dias, mas em retratar todo o cinismo que integra a essência daquela indústria cinematográfica. Indústria essa que, nas palavras do próprio protagonista, somente se importa com poder, pois “você o tem, o quer ou tem medo de perdê-lo”. Todo movimento é realizado pensando nos próximos, já que, em Hollywood, “o poder é tudo”.

Esse frenesi está presente na forma como Levinson usa a câmera em boa parte do filme, com movimentos rápidos, troca frequente de cenários e situações que vão se acumulando enquanto Ben tenta ir de um lugar para outro. Uma das maneiras utilizadas para criar essa sensação de excesso de eventos, que se tornam agoniantes conforme a trama avança, é o celular do protagonista. Não importa com quem esteja ou qual o ambiente, Ben aparecerá falando ao celular com outra pessoa (às vezes até mais de uma) tentando resolver tudo ao mesmo tempo, algo que, de fato, nunca consegue e só adia a resolução do problema.

Enquanto Ben tenta dar conta de tudo, percebemos o quão inúteis são suas tentativas por conta do cinismo, das excentricidades e das vaidades que perpassam todo aquele meio. Os chefes de estúdio querem tudo exatamente do seu jeito, pois têm o dinheiro e ponto final; os artistas como Jeremy Brunell (Michael Wincott), apegados a sua arte, se entopem de remédios para suportar a dor das intervenções em sua criação, os tornando imprevisíveis; as estrelas como Bruce Willis e Sean Penn, interpretando a si mesmos, explodem de raiva por coisas banais, como fazer a barba, ou aceitam as condições desde que sejam de uma certa maneira (para não dizer do seu jeito). Tentar controlar qualquer situação estando no centro de tudo isso beira a insanidade, mas Ben não percebe justamente porque também está contaminado por esse meio. Mesmo que tente ser o apaziguador das situações para que tudo ocorra bem, ele não nota que, ainda que seja famoso e reconhecido, não tem poder suficiente para resolver tudo, afetando também sua vida pessoal.

Inclusive, as sequências dele e de Kelly são ótimas justamente por expor como aquele ambiente tóxico impede o acerto entre ambos. É visível o carinho e o amor que há entre os dois, ainda que evidentemente mais da parte dele, e como sua incapacidade de desconexão com o trabalho impossibilita qualquer resgate da relação. Ao longo dos diversos momentos de interação das personagens, a fotografia de Stéphane Fontaine se destaca como o principal artifício para reforçar ainda mais essa situação. Seja com Kelly sendo mostrada em contra-plongée no primeiro contato dos dois na obra para ressaltar sua superioridade naquele momento, com a câmera gradativamente os colocando em mesmo nível conforme a conversa desenrola, sugerindo a disposição das personagens na melhora da relação.

Ou durante a sessão de terapia de casal, quando os dois aparecem sentados em um mesmo sofá, porém distantes um do outro e em fundos completamente diferentes, marcando as diferenças de personalidade de cada um. Enquanto Kelly possui uma sólida parede cinza escura às suas costas, sugerindo que ela talvez não acredite em um final positivo, Ben tem uma pintura abstrata ao fundo, refletindo não somente sua personalidade mas também seu mundo, imprevisível e insano. Esse choque de universos também reflete no ritmo do filme, que passa a ser um pouco menos acelerado nas sequências dos dois, especialmente durante a terapia quando Ben, ao se recusar a atender seu celular, demonstra que realmente quer acertar as contas com Kelly, gerando um comovente momento. O problema é que conforme o protagonista se reaproxima do trabalho, ele perde novamente o controle e retorna para seu modus operandi tradicional, sendo engolido pelo ambiente uma vez mais.

De certa forma, é compreensível como Ben encara essas questões. Não importa tudo o que realizou para ser considerado um grande produtor de Hollywood, sua carreira pode ir por água abaixo em um instante por uma simples vaidade. O caso citado da recusa de Bruce Willis em se barbear é um exemplo disso. Ao conversar por telefone com o executivo do estúdio responsável pelo dinheiro e explicar a situação, ele ouve que tem até o fim da semana para convencer o astro ou perderá o filme. Imediatamente, vemos o protagonista passar por um cemitério, refletindo o que será de sua carreira caso fracasse na tarefa e reforçando a importância da fotografia para a obra.

O que menos agrada na fita é o núcleo de Zoe (Kristen Stewart), filha mais velha de Ben. O pouco desenvolvimento da personagem perde não somente na relação de pai e filha, mas também em abordar uma situação de abuso deveras recorrente em Hollywood, em especial após uma revelação na sequência do velório. Ainda assim, Fora de Controle constrói uma interessante história, mesmo que nada inédita, sobre o mundo de aparências, segundas intenções e poder que faz parte da essência de uma das maiores indústrias cinematográficas do mundo.

Fora de Controle (What Just Happened) — EUA, 2008
Direção: Barry Levinson
Roteiro: Art Linson
Elenco: Robert De Niro, Sean Penn, Bruce Willis, Robin Wright, Stanley Tucci, John Turturro, Kristen Stewart, Lily Rabe, Marin Hinkle, Catherine Keener, Michael Wincott, Jason Kravits, Mark Ivanir, Remy K. Selma, Christopher Evan Welch, Sam Levinson, Paul Herman, Ali Olomi, Lombardo Boyar
Duração: 104 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais