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Crítica escrita por Raphael Henrique.
Quando For Honor foi anunciado na E3 de 2015 instantaneamente despertou meu interesse, graças à sua premissa ridícula e divertida: cavaleiros vs vikings vs samurais. Depois, com a liberação de vídeos incluindo jogabilidade, foi revelada a estrutura do combate e o modo de jogo baseado em objetivos chamado Dominion, e minha atenção foi presa. Um ano e meio se passou e participei do beta aberto, que incluía diversos aspectos do produto final, como novos modos e personalização de heróis, e soube que For Honor era um título que eu adquiriria. Hoje, após pouco mais de um mês do lançamento, percebo um jogo maravilhoso mas com severas debilidades, com o potencial de ser uma das minhas experiências multiplayer favoritas, se puder superá-las.
O ponto no qual o jogo se destaca é a forma como oferece o combate – chamada pelos desenvolvedores de “a Arte da Batalha” – e é baseada em lutas coreografadas para peças, séries e filmes, enquanto também puxa elementos de artes marciais históricas. Ao engajar em um duelo um lutador estabelece uma de três guardas ou posturas: alta, direita ou esquerda. O oponente faz o mesmo e, quando qualquer um decide atacar, deve se certificar de investir contra uma das duas zonas desprotegidas do adversário, para que seu ataque não seja bloqueado. Há diferenças entre ataques leves e pesados, pode-se quebrar a guarda de um jogador extremamente defensivo, pode-se rebater o golpe de um jogador impetuosamente agressivo, e até fintar ataques para forçar uma reação no inimigo e abrir novas oportunidades ofensivas. Seu rival é mais habilidoso, mas tem péssima noção espacial? Atire-o de um penhasco, em uma fogueira ou contra espinhos em uma parede. Estas são regras que governam todos os personagens, mas ao se especializar em um determinado herói é possível, e muitas vezes preferível, empregar suas peculiaridades. Além disso, dependendo da classe escolhida por seu adversário, pode ser estrategicamente favorável adotar uma abordagem completamente diferente da habitual. Todos estes elementos compõem uma jogabilidade ao mesmo tempo simples e complexa, variada e intrigante.
Observa-se também muito capricho em diversos componentes da atmosfera e da ambientação. Cada mapa apresenta diferentes tempos – dia ensolarado, chuva torrencial, tempestade de neve, etc. – e personagens das diferentes facções bradam em seus respectivos idiomas: samurais em japonês, vikings em islandês e cavaleiros em latim. As animações foram magistralmente confeccionadas: nota-se o esmero não só na fluidez com que os heróis passam de um movimento para outro, mas também nos movimentos em si e na pesquisa envolvida para criá-los. Utilizando a classe Warden, por exemplo, pode-se executar um oponente com uma decapitação exuberante (para aqueles jogadores que desejam um pouco mais de panache), ou segurando a espada pela lâmina e acertando o inimigo com a empunhadura da mesma, uma manobra histórica conhecida como mordhau, o que transforma a espada em um martelo improvisado, altamente eficaz contra oponentes com armadura. Na verdade, For Honor obteve grande êxito em combinar essas duas facetas e empregá-las na dinâmica do jogo: ao matar pequenos soldados (NPCs) em Dominion seu herói ataca com grandes e impressionantes movimentos: o machado dinamarquês varrendo múltiplos inimigos de cada vez e assassinos saltando por entre a multidão. Ao se deparar com outro jogador, entretanto, as interações tendem a ser mais realistas: rápidas esquivas e estocadas, ou posicionando seu escudo para se defender ao mesmo tempo em que desfere um golpe.
Uma breve nota pessoal: embora For Honor não seja um jogo historicamente preciso (e nem precisa ser), a inclusão de movimentos presentes em manuais de combate medievais e renascentistas me agrada profundamente. Há diversas técnicas não apenas efetivas, mas também interessantes ao olhar de um observador, e se essa tendência fosse adotada de forma mais abrangente poderíamos esperar cenas de lutas mais verossímeis e cativantes.
A experiência do jogo também é altamente customizável. Caso não goste de assegurar zonas de controle em Dominion o jogador pode optar por dois outros modos 4v4 focados em acumular eliminações: Elimination e Skirmish. Se for um fã de jogos de luta e preferir um desafio mais pessoal e menos caótico, Duel (1v1) é o modo ideal para você. Há ainda a opção Brawl (2v2), que eu recomendo ser tomada com um amigo para máximo divertimento. Além dos modos de jogo também é possível personalizar suas classes, modificando suas armas, armaduras, cores e Feats – habilidades especiais vinculadas aos personagens.
Para minha surpresa, For Honor conta com um modo campanha, o qual me deixou com sentimentos mistos. Por um lado, ele é muito melhor do que eu esperava, com momentos épicos e personagens carismáticos, principalmente nas missões iniciais da história. Também exerce uma ótima função de tutorial estendido, familiarizando o jogador com diferentes classes e mecânicas. Em contrapartida, toda a porção final da campanha parece esticada e rasa, sem muito desenvolvimento de personagens, e considerei a conclusão da história muito insatisfatória. Diversas opções de design também me incomodaram, como o aumento artificial de dificuldade por simplesmente subir os valores de vitalidade e dano dos inimigos, a remoção de checkpoints em dificuldades mais altas (outra forma deselegante, ao meu ver, de se intensificar a experiência) ou suplantando uma IA medíocre ao atirar três cópias do chefe contra o jogador – é contigo mesmo, General Tozen!
A interface também me desagradou. Minha impressão é a de que o jogo faz um péssimo trabalho em fornecer determinados dados que você precisa; as informações geralmente estão presentes (há vídeos básicos e avançados explicando cada classe e modos de jogo), mas acessá-las é problemático e confuso. Dicas visuais da Guerra das Facções não são explicadas, e ocasionalmente, ao procurar uma partida multiplayer, uma mensagem de erro indicando que o lobby está cheio conduz o jogador de volta ao menu principal, ao invés de reiniciar a busca automaticamente.
E assim passamos para o primeiro problema sério de For Honor: a conectividade. Uma campanha com defeitos de design só precisa ser jogada uma vez para se adquirir as recompensas, e eventualmente o jogador se acostuma e aprende a navegar pela interface, por pior que seja. Mas a frágil conectividade é um real obstáculo no aproveitamento do jogo. For Honor usa um modelo peer-to-peer (na verdade uma variação do P2P tradicional), amplamente empregado em jogos de luta, e de fato, em Duels (1v1) e Brawls (2v2) minha experiência tem sido suave e bem responsiva. Porém, nos modos Dominion, Elimination e Skirmish, que contam com um maior número de jogadores (4v4), instabilidades são notadas frequentemente, e desconexões são muito mais comuns do que deveriam ser. O matchmaking por vezes é demorado e também tende a ser menos preciso ou equilibrado quanto maior o número de jogadores.
Equilíbrio também é outro ponto fraco do jogo, e se demonstra proeminentemente em dois aspectos. Lembram de todas aquelas maravilhosas peças variáveis de armas e armaduras? Nos modos 4v4 elas interferem em alguns atributos, algo que me deixou receoso quando comecei a jogar, pois quem joga há mais tempo obtém melhores equipamentos e assim usufrui de uma maior vantagem sobre jogadores menos experientes (num jogo de luta, habilidade e perícia deveriam bastar). Além disso, em níveis mais avançados percebe-se que a build de Revenge é ridiculamente mais poderosa do que as demais, tornando-se a única que vale a pena ser construída. Revenge é uma mecânica desenvolvida para dar uma chance a um único lutador rodeado de inimigos, mas um personagem com equipamentos máximos consegue ativá-la múltiplas vezes mesmo lutando contra apenas um. Assim, o único argumento a favor dos modificadores de atributos dos equipamentos, a maior variedade de estilos de jogo, cai por terra.
A segunda forma na qual se percebe um drástico desequilíbrio é na distribuição de poder entre as classes. Em For Honor há heróis como Warden e Warlord, com um leque de opções que os permitem se adaptar a diferentes situações. Há alguns como Conqueror e Shugoki, que, apesar de serem mais restritos em suas estratégias, ainda são muito eficientes. Entretanto, há outros como Kensei, Lawbringer e Raider, que embora exerçam bem seus papéis em 4v4 têm dificuldade de se manterem em duelos devido à falta de opções viáveis de inicialização. Peacekeeper, por outro lado, é uma das melhores personagens do jogo, com rápidas manobras e ataques capazes de causar alto dano. Isso, quando se joga no PC; em consoles, quando se adicionam input lag, zonas mortas nos analógicos que determinam a guarda e apenas 30fps, ela se torna indiscutivelmente a mais poderosa, e de uma forma muito nociva.
Apesar destes problemas, permaneço otimista quanto ao futuro deste jogo. O gestor de comunidade Eric Pope tem feito um ótimo papel como pontífice entre os jogadores e a equipe de desenvolvimento, estando presente em fóruns e promovendo streams semanais nos quais são discutidos tópicos relevantes. Questões de equilíbrio são facilmente resolvidas com balance patches, algo que já foi feito ao concederem um buff à heroína Valkyrie. A conectividade ruim já foi abordada pela equipe como sendo um problema complexo e de múltiplas pequenas soluções, e a primeira delas – o segundo live patch da atual versão – foi implementada nessa semana. Requerimentos de modos ranqueados sem modificadores de atributos e redução de zonas mortas já foram passados para a equipe, que tem se mostrado vocal e receptiva. For Honor é um jogo de imenso potencial, e um trabalho contínuo de comunicação entre a comunidade e os desenvolvedores é o que é necessário para atingi-lo.
For Honor
Desenvolvedora: Ubisoft Montreal
Lançamento: 14 de fevereiro de 2017
Gênero: Ação
Disponível para: PS4, Xbox One, PC