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Crítica | Finch (2021)

Wilson, só que com inteligência artificial.

por Ritter Fan
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Já começando com uma digressão, a primeira coisa que pensei quando Finch acabou é que eu gostaria muito de ver Tom Hanks fazendo papel de vilão, daqueles bem malvados mesmo. Isso provavelmente nunca ocorrerá, mas é que o ator simplesmente já esgotou todas as facetas do “cara gente boa por quem é impossível não se apaixonar”, o que por vezes leva a uma inevitável repetição dramática. Por outro lado, claro, ver Hanks em qualquer filme é como um porto seguro, uma garantia quase que absoluta de no mínimo dos mínimos uma boa atuação em um filme para levantar o espírito.

Finch, produção da Universal Pictures originalmente anunciada como BIOS que teve sua estreia atrasada em razão da pandemia e que, subsequentemente, teve os direitos de distribuição adquiridos pela Apple para lançamento em seu serviço de streaming (o segundo filme de Hanks comprado pela empresa, com o primeiro tendo sido Greyhound), é mais uma obra pós-apocalíptica como já vimos outras vezes, só que, desta vez, tentando ser uma segunda versão de Náufrago, substituindo a bola Wilson pelo robô Jeff (voz e captura de performance de Caleb Landry Jones) e aguando e açucarando ao ponto de transformar em caramelo a ambientação, as discussões mais cerebrais e, claro, todos os conceitos de sobrevivência e solidão. Trata-se de um longa que descaradamente e a todo custo quer ser um filme para nos fazer sentir bem, algo que é até bem-vindo nos tempos atuais, lógico, mas que não vai um passo além disso, não arrisca nada nem sequer por um segundo.

Na história, explosões solares destruíram a camada de ozônio, levando a Terra na direção de seu fim  e, neste cenário desolador em que os raios do sol literalmente queimam a pele, o engenheiro Finch Weinberg (Hanks) constrói um robô para que ele cuide de seu precioso cachorro Goodyear (Seamus) e os três – quatro se contarmos com Dewey, um robô menos evoluído que ele  já tinha – partem em uma road trip de St. Louis, onde eles não mais podem ficar em razão da formação de uma super tempestade, até São Francisco, que pode ou não ser mais seguro. Ao longo da jornada, Finch vai piorando de sua condição causada pelos raios ultravioleta enquanto Jeff vai evoluindo a passos largos em seu processo de aprendizado sobre o que ser humano.

O roteiro é fiel à sua premissa e mantém o protagonista essencialmente sozinho com seus amigos robóticos e caninos do começo ao fim, com outros humanos aparecendo somente em brevíssimos flashbacks, o que, claro, abre espaço para toda aquela típica doçura de Hanks amplificada pelas presenças do simpático, ainda que às vezes chatinho, robô e do obediente cachorrinho. Mesmo quando há tentativas de construção de suspense, a direção de Miguel Sapochnik (em apenas seu segundo longa, mas que ganhou renome como diretor de alguns dos melhores episódios de Game of Thrones) não excede nunca um limite de velocidade extremamente conservador, mantendo a temperatura do longa sempre morna apesar do perigo solar que cerca o trailer modificado de Finch. É, basicamente, uma sucessão de clichês simples usados de maneiras pouco inspiradas que cumprem a mínima função de fazer o longa avançar um tanto quanto vagarosamente até seu destino costeiro.

Apesar de ser Hanks que, para variar, carrega o filme nas costas, há que se louvar a captura de performance que dá vida a Jeff, além do uso de um robozinho integralmente de controle remoto para ser Dewey e o que desconfio que sejam retoques em computação gráfica em Goodyear, provavelmente para economizar alguns takes. Há uma boa naturalidade entre os três personagens principais, o que ajuda muito na forma como nós nos identificamos com eles, o que definitivamente não demora a acontecer. O uso de muita filmagem em locação, como nos desertos ao redor de Albuquerque, Santa Fe e outras cidades do Novo México, além do belíssimo parque nacional de White Sands, permitiu que o diretor de fotografia Jo Willems, responsável por todos, menos o primeiro longa da franquia Jogos Vorazes, transmitisse com aquela típica beleza inquietante toda a desolação dessa distopia, o que ajuda a passar o tempo considerando que a minutagem do filme é bem maior do que precisava ser, mesmo entendendo e apreciando a pegada levemente mais contemplativa do que o normal.

Mesmo com a premissa de fim de mundo, Finch não é mais do que um passatempo leve, descompromissado e fundamentalmente positivo que despudoradamente clica em todos os botões que tornam impossível a tarefa de simplesmente descartar a obra completamente. Sem dúvida continuo querendo ver Hanks como um sanguinário vilão um dia desses, mas também não há problema algum se ele ficar apenas nessa sua agradável zona de conforto.

Finch (Idem – EUA, 05 de novembro de 2021)
Direção: Miguel Sapochnik
Roteiro: Craig Luck, Ivor Powell
Elenco: Tom Hanks, Caleb Landry Jones, Seamus, Marie Wagenman, Lora Martinez-Cunningham, Oscar Avila, Emily Jones
Duração: 115 min.

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