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Crítica | Fargo

por Guilherme Coral
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estrelas 4,5

O primeiro elemento que nos recebe na obra dos irmãos Coen é o comunicado de que ela foi baseada em acontecimentos reais. Apesar disso, Fargo nos tira do lugar comum, nos entregando uma história nada menos que imprevisível, na qual cada ação é, ao mesmo tempo, plausível e inacreditável.

O filme nos conta a história de Jerry Lundegaard (William H. Macy), um inseguro pai de família que, endividado, bola um plano nada convencional para conseguir dinheiro de seu sogro rico. Sua ideia é ter sua esposa raptada para que o dinheiro do resgate seja fornecido pelo sogro – assim, Jerry dividiria com os sequestradores contratados a quantia. Não é preciso dizer que os planos não seguem seu caminho esperado e que o filme constrói grande parte de sua tensão a partir dos inúmeros imprevistos ocorridos.

O trunfo do roteiro de Fargo, contudo, se apresenta na construção de seus personagens. Há uma grande simplicidade em cada um deles, garantindo reações únicas a cada um dos acontecimentos. Em uma cena na primeira meia hora do longa-metragem, por exemplo, dois policiais conversam casualmente sobre o assassinato que testemunham – três corpos estão diante deles e o tom de voz (carregado pelo sotaque interiorano) não sofre a menor mudança, como se a paz daquele lugar jamais tivesse sido abalada. O destaque aqui vai para Frances McDormand, no papel da detetive Gunderson, que simboliza esta paz da região.

Ao mesmo tempo temos o cada vez mais nervoso Lundegaard, também retratado de forma brilhante por William H. Macy. A insegurança de seu personagem chega a ser palpável, ao ponto que fica claro a impossibilidade de qualquer um de seus planos não sair de seu controle. Isso se intensifica ainda mais devido à dupla encarregada do rapto – um sujeito que cheira à inexperiência (interpretado por Steve Buscemi) e um completo psicopata (Peter Stormare). Dessa forma, os irmãos Coen desenvolvem a tensão crescente de seu filme, dividindo o foco em três narrativas complementares, cada uma desenvolvendo um humor através do foco em personalidades distintas – cada uma mais singular que a outra.

O humor e a tensão dividem espaço com a sensação de solidão, criada pelos cenários invernais, repletos de neve e neblina. O frio cria o oposto do aconchego gerado pela simplicidade dos personagens da subtrama policial. Amplificando tal sensação, a montagem realiza diversas transições utilizando o fade trabalhando ainda com a monotonia que é expressada pela relação entre Gunderson e seu marido.

Fargo é uma obra de roteiro impecável e execução singular que consegue criar diferentes reações do espectador, conseguindo trazê-lo para dentro do filme, imergindo-o completamente. Seu trabalho com três narrativas paralelas garante uma dinâmica única ao filme que é, ao mesmo tempo veloz e lento sem, jamais, perder a harmonia. Definitivamente possui material o suficiente para ser explorado na recente adaptação para série televisiva, ainda que seja uma aposta arriscada. É um filme imperdível que nos deixa com a dúvida se aqueles eventos realmente ocorreram.

p.s. Leia a crítica da série de TV baseada em Fargo aqui.

Fargo (idem – EUA/ Reino Unido, 1996)
Direção: Joel Coen, Ethan Coen
Roteiro: Ethan Coen, Joel Coen
Elenco: William H. Macy, Frances McDormand, Steve Buscemi, Peter Stormare, Kristin Rudrüd, Harve Presnell, Tony Denman, Gary Houston, Melissa Peterman, Steve Reevis
Duração: 98 minutos

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