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Crítica | Fábulas Ruins

por Kevin Rick
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Conforme o monólogo inicial diz, Fábulas Ruins é inspirada em “uma história verdadeira; a história verdadeira é inspirada em uma história falsa; a história falsa não é muito inspirada”. Esta expressão inicial nos dá o tom do filme que tem um viés impressionista, de forma que, os diretores Damiano e Fabio D’Innocenzo, em vez de interpretar, buscam descrever as sensações e emoções de seus personagens. Situado em um subúrbio romano burguês onde muitas neuroses e repressões estão escondidas sob a aparência idílica das coisas, Fábulas Ruins segue quatros famílias italianas, decidindo por não usar os residentes adultos como foco, mas os atores infantis são os protagonistas, em uma parábola infantil terrível, na qual seus pais servem como álibis das transgressões humanas. E, muitas vezes, os próprios genitores são os perpetuadores dos terrores, afinal, todo conto de fadas precisa de monstros.

A série de personagens é perturbadora. Homens e mulheres com um passado difícil e um presente terrível que não pode ser completamente escondido atrás da falsa existência burguesa, gerando uma crueldade cheia de afetividade, raiva e ódio prestes a explodir a qualquer momento. Os filhos são a mira da barbárie, tentando imitar seus pais que não têm orientação moral em sua vida. Vemos crianças de 10 a 12 anos assistindo pornografia no celular do papai juntas, combinando de fazer sexo e conversando sobre quando estão “transando de verdade”. Os pais aconselham seus filhos a pegar meninas que estão muito dispostas. Os mais pequenos usam quase sempre biquínis ou peças semitransparentes que dão destaque ao corpo.

O problema de Fábulas Ruins é que as cenas passam de um grupo de personagens para o outro sem uma ligação lógica. Mesmo que seja interessante o contexto de várias fábulas dentro da temática de irracionalidade proposta, a falta de um contorno definido ou uma linha tênue da narrativa tornam o filme inconclusivo, com vários momentos terminando de forma abrupta. Ouso até dizer que a fita é um tanto pretensiosa, escolhendo chocar o espectador ao invés de expressar sua mensagem. Os cineastas estão retratando o realismo periférico, e de repente “bum!”, uma cena surreal que parece ter saído de uma fábula negra acontece. Como se quisesse dizer, você não estava esperando isso, te surpreendemos e talvez te choquei e chateei, agora vamos para outro conto, repetir a mesma estrutura. Tudo isso transforma o enredo que deveria ser impactante em básico, com arcos violentos, fisicamente e psicologicamente, porém simples e vazios.

O filme também consegue ser bastante obsceno. A sexualidade é um dos temas que permeia toda a narrativa, fazendo um contraposto da vulgaridade corrupta com a inocência infantil. Essa perturbante sordidez infante é exposta de uma forma incômoda, criando um grande mal-estar, que não sabemos se é bom ou não. Atos gratuitos de exposição infantil chocam, mas também soam incompreensíveis e desnecessários.

Quanto ao elenco, todos os atores infantis realizaram um trabalho impressionante, trazendo nuances às emoções que são chamados a expressar, e a recusa dos diretores em dar à geração mais velha quaisquer características redentoras, mesmo em face de eventos extremos, parece revigorante e fiel às falhas de seus personagens.  

Lenta e inexoravelmente a explosão final devastadora se aproxima. Ela explode violentamente, de forma perturbadora e grotesca, arrancando lágrimas. Entretanto, a jornada até esse momento é confusa, e a mensagem final transposta da mesma forma. Não se entende se o filme quer ser uma história de amadurecimento, uma interpretação de masculinidade tóxica, ou uma crítica ao disfuncional ambiente suburbano. No final, parece que os irmãos D’Innocenzo evocaram todos esses temas apenas para chocar. 

Fábulas Ruins (Favolacce / Bad Tales) – Itália, Suíça, 2020
Direção: Damiano D’Innocenzo, Fabio D’Innocenzo
Roteiro: Damiano D’Innocenzo, Fabio D’Innocenzo
Elenco:  Elio Germano, Tommaso Di Cola, Giulietta Rebeggiani, Gabriel Montesi, Justin Korovkin, Barbara Chichiarelli, Lino Musella, Ileana D’Ambra, Max Malatesta, Aldo Ottobrino, Cristina Pellegrino, Giulia Melillo, Laura Borgioli, Enrico Pittari, Sara Bertelà, Frederico Majorana, Raquel Electra, Giulia Galiani, Massimiliano Tortora
Duração: 98 min.

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