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Crítica | Evil – 2ª Temporada

O mal em todos nós.

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas das demais temporadas.

Como comentei na crítica, a primeira temporada de Evil foi uma de minhas maiores e mais genuínas surpresas audiovisuais recentes, seja por sua capacidade de mesclar gêneros, seja pela fluidez entre episódios soltos e os que contam uma história única ou pelo elenco afiado. Confesso que, ao mesmo tempo que fiquei com muita vontade de começar a assistir à segunda temporada imediatamente, também tive um certo receio de me decepcionar, de esperar demais e receber bem menos do que minha jornada pelo primeiro ano. No entanto, uma coisa era certa: não teria como Evil me deixar tão surpreso novamente.

E, como já esperava, não tive o mesmo nível de surpresa na segunda temporada, mas isso era, sinceramente, impossível e uma expectativa completamente irreal e até boba, do tipo perigoso por ter o potencial de estragar experiências. Por outro lado, é sempre uma enorme felicidade quando uma série que começa muito bem continua muito bem e esse definitivamente é o caso da criação do casal Robert e Michelle King. Aliás, diria que a dupla de showrunners, provavelmente sentindo-se já mais confortáveis na oposição do ceticismo à crença, do científico ao sobrenatural, e tendo apresentado com muita eficiência os personagens, a mitologia e a mecânica desse universo, mergulharam com mais vontade no bizarro, no provocador e em uma narrativa mais una, menos dependente de “exorcismos da semana”.

Ainda há um pouco da mescla de estruturas à la Arquivo X, mas, no geral, percebe-se que a segunda temporada parece bem mais preocupada em fazer a trama conspiratória mais ampla envolvendo o vilão Leland Townsend (Michael Emerson) andar de verdade, mesmo que, para isso, precise “complicá-la” ainda mais ao levar Townsend a manipular a Igreja a exorcizá-lo com objetivos escusos, envolver fortemente Sheryl Luria (Christine Lahti), mãe da protagonista, nesse lado marcadamente sobrenatural, com direito até a um altar com um boneco sinistro a quem ela faz oferendas, e ao introduzir mais um vilão, o sinistro influenciador Edward Tragoren (Tim Matheson) como uma espécie de segundo mentor para ela. Mas o espessamento desse lado da história só beneficia o todo, pois abre espaço para as reais estranhezas que a equipe de roteiristas – exatamente a mesma da temporada anterior – parece ter prazer em criar.

De maneira semelhante, a trinca central de investigadores parece mais focada em lidar com o mistério mais amplo que envolve a clínica de fertilidade RMS que, conforme eles desconfiam, é uma “fábrica” de demônios ou de psicopatas, dependendo a quem você perguntar, claro. Há até a introdução de uma nova e preciosíssima personagem, a Irmã Andrea (Andrea Martin), que logo percebe a vilania real de Leland e o quão David (Mike Colter) é especial, tornando-se ao mesmo tempo uma aliada poderosa para o grupo e uma mentora do aspirante a padre, ajudando-o com suas dúvidas. Mas, logicamente, como a série não dispensa – e não deveria dispensar mesmo – as missões dos investigadores, há episódios mais despregados da narrativa central que são fenomenais, como o traumático e assustador E de Elevador, o fortemente crítico P de Polícia e o desafiador por quase não ter diálogos e também nojento em razão das moscas varejeiras S de Silêncio.

E, claro, o cliffhanger da primeira temporada, ou seja, o assassinato de Orson LeRoux (Darren Pettie) por Kristen (Katja Herbers) ganha um tratamento muito raro de se ver em séries, mesmo as melhores por aí: ele não é resolvido rapidamente. Muito ao contrário, ele se torna um tema recorrente que ameaça destruir a personagem psicológica e fisicamente por completo ao longo de toda a temporada, com o último episódio do segundo ano inclusive comunicando-se diretamente com o último do primeiro, em um belíssimo movimento circular que, por sua vez, leva a outro cliffhanger que também promete ganhar foco ao longo do terceiro ano, o beijo apaixonado entre ela e David que mal acabara de se tornar padre.

O que mais impressiona é que ninguém é esquecido. Se Kristen e David têm seus problemas pessoais naturalmente mais destacados, Ben (Aasif Mandvi) também ganha os seus, sejam as constantes e ótimas visitações de um súcubo fêmea, seja o trauma dele no poço do elevador ou a surreal história da irmã de sua namorada Vanessa (Nicole Shalhoub). Mas os coadjuvantes também têm suas presenças sentidas e bem costuradas na trama, como a já citada Sheryl, as adoráveis quatro filhas de Kristen (com uma delas inclusive ganhando um inteligente episódio inteiro – Z de Zumbi – que é também carregado de bem sacadas críticas socioeconômicas), o marido de Kristen que mesmo aparecendo só esporadicamente, cumpre importante função de colocar a esposa em xeque, e até mesmo o Dr. Kurt Boggs (Kurt Fuller), psiquiatra de Kristen, com direito até a uma visão demoníaca só para ele.

Se os mistérios são resolvidos? Claro que não! Trata-se, afinal, apenas da segunda temporada da série. Mas os mistérios ganham força e muito tempero carregado de pimenta, com uma abordagem ainda mais debochada e sinistra do lado de Leland e perturbadora e irresistivelmente sexy do lado de Kristen, com pitadas de humor e muitas críticas relevantes que nem de longe perdoam a Igreja Católica. E, muito sinceramente, eu não espero que tudo seja resolvido por completo, pois séries com elementos sobrenaturais quase que naturalmente precisam ser menos objetivas e diretas que outras de teor mais realista. O que espero – e o caminho adotado na temporada sob análise parece sólido nesse sentido – é que haja uma lógica interna interessante que faça pelo menos muitas (não todas) de suas peças se encaixarem no final para que tenhamos o vislumbre do todo. Mas, como dizem por aí e eu tenho cada vez mais notado que é um aforismo muito verdadeiro para a vida, o que importa é a jornada e não o resultado final. E a jornada de Evil tem sido fascinante.

Obs: Que aberturas criativas para os títulos dos episódios, não? E foi ainda melhor ver o livro de pop-up aparecer também dentro da série no final.

Evil – 2ª Temporada (Idem – EUA, de 20 de junho a 10 de outubro de 2021)
Criação: Robert King, Michelle King
Direção: Nelson McCormick, John Dahl, Frederick E.O. Toye, Alethea Jones, Ron Underwood, Robert King, James Whitmore Jr., Clark Johnson, Stacey K. Black, Kevin Rodney Sullivan
Roteiro: Rockne S. O’Bannon, Davita Scarlett, Dewayne Darian Jones, Robert King, Michelle King, Patricia Ione Lloyd, Aurin Squire, Louisa Hill, Nialla LeBouef
Elenco: Katja Herbers, Mike Colter, Aasif Mandvi, Kurt Fuller, Marti Matulis,  Brooklyn Shuck, Skylar Gray, Maddy Crocco, Dalya Knapp, Christine Lahti, Michael Emerson, Ashley Edner, Ciara Renée, Andrea Martin, Darren Pettie, Nicole Shalhoub, Kristen Connolly, Patrick Brammall, Peter Scolari, Renée Elise Goldsberry, Brian Stokes Mitchell, Stephen Dexter, Brian d’Arcy James, Anthony DeSando, Tim Matheson, Boris McGiver
Duração: 729 min. (13 episódios)

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