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Crítica | Eu, Capitão

A dura realidade de seguir o próprio sonho.

por Roberto Honorato
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A base de Eu, Capitão é construída no debate da imigração, um tema de enorme complexidade geopolítica que envolve diversas abordagens possíveis, e uma das principais ideias que o diretor Matteo Garrone (Gomorra e Dogman) propõe nos primeiros minutos é uma crítica na forma como a ideologia de países imperialistas consegue seduzir a população colonizada por conta da construção de uma imagem artificial através de suas produções midiáticas. Para além do comentário sociopolítico temos uma jornada épica através do deserto e uma narrativa sobre amizade fortalecida através das adversidades.

Essa primeira parte introdutória consegue representar bem o mundo utópico construído na mente de seus protagonistas, dois adolescentes senegaleses com o sonho de deixar a África para procurar uma nova vida na Europa. A abordagem carrega um tom bem mais leve do que estaria por vir, e a dinâmica entre as personagens principais funciona quase como uma comédia, mas logo a sensação de horror e desespero tomam conta da narrativa com cada nova etapa do plano dos jovens em fugir do seu país da mesma forma precária que muitos fazem todos os dias. 

A dupla Seydou (Seydou Sarr) e Moussa (Moustapha Fall) não demora para se dividir, isso faz com que a narrativa compartilhe não só as aventuras de cada um, mas as várias histórias de outras pessoas prisioneiras da situação. É fácil assumir que o longa chegue ao ponto de romantizar alguns aspectos do plano inicial da dupla de personagens e o ideal de uma nova vida na Europa, e não ajuda o fato do diretor Matteo Garrone, que é italiano, se utilizar de elementos fantasiosos para amenizar um pouco dos horrores da jornada. Segmentos oníricos entram em contraste com sequencias de tortura e interrogação, destruindo o que resta da inocência das personagens.

Há uma necessária denúncia de crise humanitária, a qual infelizmente tem sido pauta de incansáveis debates, por isso o longa tem sucesso quando procura uma crítica dessa imagem idealizada de países colonizadores, colocando alguns personagens como porta-voz dos horrores da viagem que os dois jovens estão prestes a realizar. Porém, ao mesmo tempo que temos um filme de forte crítica, há uma confusão na forma como assistimos a desumanização dos imigrantes pela mão de agentes trabalhando para a elite ao mesmo tempo que os poucos momentos de alívio surgem através desses exatos agentes.

Eu, Capitão se faz confortável em sua jornada épica de amizade e companheirismo mesmo que não esteja completamente resolvido com seu lado político, que é claro na intenção, mas contraditório em algumas partes de sua execução. Matteo Garrone se utiliza do fantástico para tirar um pouco do peso de algo que pode deprimir o espectador, mas talvez um pouco da realidade seja necessário para completar de verdade sua denúncia. É uma decisão criativa que compreendo, mas não acredito ter o efeito necessário para qualquer tipo de indignação.  

Eu, Capitão (Io Capitano – Itália, Bélgica, França, 2023)
Direção: Matteo Garrone
Roteiro: Matteo Garrone, Massimo Ceccherini, Massimo Gaudioso, Andrea Tagliaferri
Elenco: Seydou Sarr, Moustapha Fall, Issaka Sawadogo, Hichem Yacoubi, Doodou Sagna
Duração: 121 minutos 

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