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Crítica | É Assim Que Acaba

Acordando de um sonho.

por Ritter Fan
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  • spoilers para quem não viu nem o trailer.

Adaptação do mais famoso romance de Colleen Hoover e que tem elementos autobiográficos, É Assim Que Acaba traz Blake Lively, em seu primeiro papel em quatro anos em que seu belo rosto aparece, vivendo Lily Bloom, cujo pai acabara de falecer e que está para abrir uma floricultura em Boston, com sua vida sendo realmente mudada quando encontra um quase que literal príncipe encantado na figura de Ryle Kincaid (vivido pelo próprio diretor, Justin Baldoni), um neurocirurgião rico, lindo e sarado que larga sua vida boêmia de solteiro convicto para ficar com ela. A abordagem da história como um conto de fadas faz sentido, ainda que, visual e narrativamente, o filme tenha um primeiro terço problemático justamente por isso.

O roteiro escrito por Christy Hall, em seu segundo trabalho nessa posição, parece feliz demais em transformar o início do romance entre Lily e Ryle em uma fábula totalmente autoconsciente do que é, como se estivéssemos em filme baseado em metalinguagem como é a franquia Deadpool do marido da atriz principal. Tudo soa artificial, distante e plastificado, ou seja, feito para ficar bonito demais de forma que, então, esse sonho possa ser descontruído, deixando a dura realidade do presente e do passado finalmente entrar na história. Não ajuda muito que os diálogos sejam fraquíssimos, que dois dos momentos mais importantes do longa sejam completas e improváveis coincidências – falo de como Lily conhece Allysa (Jenny Slate), irmã de Ryle e de como ela se reconecta com Atlas Corrigan (Brandon Sklenar), conhecido seu do passado –  e que uma mulher que se chama “Lírio Florescente” deseja ser dona de uma floricultura…

Mas o que realmente atrapalha é que a roteirista parece ter sentido necessidade de esconder a “reviravolta” narrativa por quase a metade da duração do filme e, mesmo assim, mantendo enevoada a situação que vai de romance impossível até caso de violência doméstica para bem além da metade. Não sei se, no livro, essa dúvida é cultivada por tanto tempo, mas, se é, imagino que, sem as imagens, isso fique mais fácil. No longa, talvez pela relativa inexperiência de Baldoni como diretor de longas (este é apenas seu terceiro), o mistério é mantido por meio de recursos atrapalhados, como montagem propositalmente confusa na sequência da cozinha e o uso de mascaramento em outra cena importante que tendem a tirar a atenção do espectador para o cerne da questão, transformando o longa quase que em uma investigação do tipo “será mesmo que isso aconteceu?”.

E notem que eu entendo que o ponto do longa é desmistificar a violência doméstica como algo apenas de extremos, a forma “preferida” de abordagem do assunto de muitos filmes e séries, lidando com sutilezas, com situações que podem não parecer o que realmente são tanto aos olhos de quem está de fora quanto dos de quem está dentro da relação, mas o que faltou ao roteiro e à direção foi justamente sutileza para transmitir essa mensagem de maneira orgânica e natural. A mensagem é passada, não se enganem, pois chega um ponto em que tudo é literalmente dito verbalmente e em detalhes, só faltando desenhar, mas a construção da narrativa sofre por roteirista e diretor não conseguirem estabelecer uma história que sobreviva para além de seus maniqueísmos e de contrastes cansados. E eu também reconheço que algumas mensagens precisam ser explicadas para abrir os olhos de muita gente, mas, nesse caso, é preciso de um “algo mais” cinematográfico que exige sofisticação, como é o caso, por exemplo, de Bela Vingança e Elle e esse elemento extra certamente não está presente em É Assim Que Acaba.

Baldoni ainda sofre como ator, pois seu personagem, justamente em razão do começo na linha de conto de fadas, parece o estereótipo do “amante latino” um Rodolfo Valentino com a empáfia de Zé Bonitinho e a insistência de Pepe Le Pew. Chega a ser hilário e não deveria ser. Blake Lively, por seu turno, segura bem as pontas de sua personagem e, mesmo vivendo ela mesma como basicamente todos os filmes em que ela atua, convence quando realmente precisa convencer e torna a jornada mais fincada no chão. Vale também destaque para Isabela Ferrer como a versão adolescente (mesmo parecendo ter a idade que tem, ou seja, 25 anos) de Lily, com a atriz vivendo uma versão melhorada de Lively como a personagem.

É Assim Que Acaba tem uma mensagem importante a transmitir e o longa faz justamente isso. Mas só isso. Ao querer transitar entre contrastes forçados, segredos mal guardados e mistérios a serem “solucionados”, a moral da história acaba diluída e perdida entre indecisões do que o filme quer ser e de como lidar com as exigências da história, o que impede que a narrativa realmente floresça e dê frutos.

É Assim Que Acaba (It Ends with Us – EUA, 2024)
Direção: Justin Baldoni
Roteiro: Christy Hall (baseado em romance de Colleen Hoover)
Elenco: Blake Lively, Isabela Ferrer, Justin Baldoni, Brandon Sklenar, Alex Neustaedter, Jenny Slate, Hasan Minhaj, Amy Morton, Kevin McKidd
Duração: 130 min.

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