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Crítica | Duelo Final (City Primeval), de Elmore Leonard

Dever e rivalidade.

por Ritter Fan
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Para todos os efeitos, o detetive de homicídios Raymond Cruz, da polícia de Detroit, é um proto-Raylan Givens, que só seria criado mais de uma década depois pelo mesmo Elmore Leonard. Não que outros policiais e pistoleiros de Leonard, ao longo de sua prolífica carreira, não guardassem semelhanças com o delegado federal que usa um anacrônico chapéu de caubói, mas Cruz, de maneira semelhante ao mais famoso Givens (graças à série de TV Justified, lógico), é alguém que tem um desejo subconsciente de criar uma imagem própria de durão, algo que ele faz por intermédio de um bigode que, dentre outros assuntos, é objeto de discussão, via entrevista com uma repórter, logo no começo de Duelo Final (título nacional de City Primeval quando de sua publicação por aqui). Pode-se dizer que o bigode está para Cruz assim como o Stetson está para Givens, ainda que Cruz pareça mais inseguro que sua contrapartida literária.

E talvez essa tenha sido uma das razões pelas quais o romance sob análise tenha sido escolhido para ser a base do revival de Justified, que carrega o subtítulo City Primeval e que, por sua vez, ganhou uma tradução para direta para o português, Cidade Primitiva. Uma segunda possível razão é que a história escrita por Leonard é universal e também carrega semelhanças com todo o arco narrativo de Raylan Givens na televisão, a ponto de Desafio Final, em inglês, ter o subtítulo High Noon in Detroit ou, em português, Matar ou Morrer em Detroit, em uma referência direta ao clássico faroeste de 1952 de Fred Zinnemann, estrelando Gary Cooper, ou seja, aponta para um conflito mortal e inevitável entre dois inimigos.

De um lado, temos o já mencionado detetive Raymond Cruz que, ao investigar dois homicídios ocorridos no mesmo dia, o de um juiz criminal detestado por muitos dos dois lados das contendas, e uma mulher, acaba, por pura intuição, fazendo uma conexão imediata entre eles e, via de consequência, com o assassino contumaz Clement Mansell, conhecido como Selvagem de Oklahoma que, claro, é o outro lado do conflito. O que segue, daí, é uma perseguição de gato e rato entre Cruz e Mansell, com direito a inversões de papeis entre caça e caçador, com Leonard, como é seu estilo, dedicando seu sempre econômico e preciso trabalho a desenvolver os dois lados de maneira quase que equânime.

Se Cruz é um ótimo, mas inseguro detetive, Mansell é um impulsivo, mas extremamente seguro de si bandido que, tendo escapado de uma condenação por homicídio há anos por uma tecnicalidade, acha que o Sistema Judiciário é facilmente manipulável. Em meio a essas duas personalidades opostas que, aos poucos, vão convergindo, há a brilhante advogada Carolyn Wilder, que defende Mansell e a completamente manipulável Sandy, namorada de Mansell, ambas constantemente esbarrando com o detetive que, de maneiras completamente diferentes, tenta extrair informações delas, com o destaque ficando com Wilder que é tão esperta quanto é bonita, criando diversos momentos excelentes de diálogos entre os dois.

Obviamente, porém, que o coração de Duelo Final é o conflito entre Cruz e Mansell que, não demora, vai além da rivalidade natural entre polícia e ladrão e começa a entremear a vida pessoal dos dois, como cada um passando a ser a obsessão do outro, obsessão essa que faz com que Cruz comece a trabalhar fora das regras usuais e Mansell a ficar cada vez mais destemido em suas abordagens. Interessantemente, fugindo um pouco de seu padrão, Elmore Leonard não tenta fazer o leitor gostar também do vilão. Se Cruz é caracterizado como o detetive que tenta, mas não necessariamente anda em linha reta, sempre mantendo camadas acinzentadas, mas jamais vilanescas, em sua personalidade, Mansell é constantemente asqueroso e violento, incapaz de qualquer tipo de compaixão, ainda que jamais desprovido de camadas que vão se revelando cada vez mais complexas.

Duelo Final realmente é Matar ou Morrer em Detroit, ou seja, uma atualização do clássico do Cinema em forma literária, mas, ao mesmo tempo, uma típica história de Elmore Leonard em que seus personagens falam mais alto do que qualquer tiroteio ou qualquer momento de ação típica de obras do gênero. E o resultado é contagiante, um romance que é difícil parar de ler até que o “duelo final”, que poderia muito bem ser transposto para Justified, realmente ocorra.

Duelo Final (City Primeval – EUA, 1980)
Autor: Elmore Leonard
Editora original: Arbor House
Data original de publicação: 1980
Editora no Brasil: Círculo do Livro
Data de publicação no Brasil: 1990
Páginas: 368

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