Home FilmesCríticas Crítica | Dogman (2018)

Crítica | Dogman (2018)

por Gabriel Carvalho
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“Eu quero ver seu rabo abanando
Vamos ficar sem coleira.”

Um cachorro enfurecido, com os dentes à mostra, surge perturbando o espectador com a sua apresentação, mostrando uma selvageria supostamente incontrolável, mesmo em um estado de acorrentamento. Supostamente, pois a cena conclui-se com o término da rebeldia do animal, então se submetendo aos cuidados de Marcello (Marcello Fonte), um inofensivo tosador de cachorros. É uma premonição, sem muitas surpresas até, do que Dogman propõe em seu conceito, misturando correntes, animais, raiva e domesticação. Os comportamentos animais, seja o do pacifismo, seja o da agressividade, são transportados para os seres humanos presentes na obra, tão bichos quanto.

O protagonista Marcello, por exemplo, seria o que entenderíamos como “melhor amigo do homem”, querido por todos, desgostado por ninguém. O seu jeito passivo, com olhar cabisbaixo e pouco amedrontador, postura encurvada, molda um conjunto que Fonte compreende muitíssimo bem. E o texto, para criar mais vínculo do personagem com o espectador, ainda conecta-o com a sua filha, aumentando o seu viés de sujeito simpático. Mas tem alguém marcando no território de Marcello, importunando-o – uma cena mostra esse antagonista manifestando-se enquanto o protagonista urina na rua. Será que Marcello irá se desamarrar das correntes postas por esse violentíssimo ser?

O responsável por Dogman, o italiano Matteo Garrone, portanto, cria uma jornada de emancipação, pontuada por passagens que vão mostrando que a ferocidade animalesca pode ser, na verdade, uma inerência à natureza do homem, não menos um animal. É quase um status, para muitas pessoas, expor a brutalidade como uma virtude – principalmente para os homens, vistos por alguns como tais apenas caso sejam clássicos “machões”. Simone (Edoardo Pesce) está ensinando, no caso, Marcello a ver o mundo com outros olhares. Contudo, o que se tem para aprender verdadeiramente com alguém que nunca conquistou respeito, apenas temor dos outros para ele?

Tudo em Dogman, em suma, é coberto por simbolismos. Garrone recorre à saliva escorrendo pela boca de um personagem em uma cena. Já em outra, anterior, dentes são expostos graficamente, com a gengiva sobressaindo-se da mandíbula do mesmo homem, agora criatura. Imageticamente, Garrone enxerga potencial na performance de Marcello, que cumpre muito bem o seu papel, encerrado coerentemente com a ótima sequência resolutiva. Diminui, nos planos, a presença do protagonista, que seria como um poodle frente a um pitbull. Uma cena que mostra uma competição entre tosadores exemplifica quem é Marcello. Dentre os três animais vencedores, o seu é o menor.

Dogman, assim como é uma jornada de emancipação, como apontado, também é um jornada de reencontro às raízes, prévias à civilidade aparentemente adquirida pelo ser humano. Engana-se, porém, quem pensa que o homem que não coloca as mãos na massa, em contrapartida, é bondoso, mais homem – no sentido de humano. Todos aqueles ao redor de Marcello, críticos a ele em sua derrocada – e nisso o roteiro força um pouco -, são contraditórios em moralidade. Simone é um cachorro louco, de fato, mas merece morrer? Garrone, nesse ponto, entretanto, pouco ajuda o personagem de Edoardo, que também é um ator muito fraco. Pois o protagonista é mais adestrado.

Dogman – Itália, 2018
Direção: Matteo Garrone
Roteiro: Ugo Chiti, Matteo Garrone, Massimo Gaudioso
Elenco: Marcello Fonte, Edoardo Pesce, Nunzia Schiano, Adamo Dionisi, Francesco Acquaroli, Alida Baldari Calabria, Gianluca Gobbi, Laura Pizzirani, Giancarlo Porcacchia
Duração: 103 min.

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