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Crítica | Doctor Who: A Noite dos Humanos, de David Llewellyn

por Rafael Lima
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Equipe: 11º Doutor, Amy
Espaço: O Giro
Tempo: 250339

Existem livros que achamos boas leituras, outros que acreditamos tratar-se de obras ruins, e outros livros nos deixam com a impressão de que simplesmente não aconteceram. O livro tem seus acertos, mas seus pontos de incômodo são mais difíceis de encontrar, já que em primeira instância não há nada tecnicamente errado com a obra. Neste caso, a pessoa que se meteu a besta de escrever a resenha sobre esse romance deve fazer um esforço maior para identificar o que a incomodou. Foi assim que me senti ao concluir a leitura de A Noite dos Humanos, de David Llewewellyn.

Na trama, situada entre os episódios Victory of The Daleks e The Time of The Angels, tem início com a TARDIS recebendo um pedido de socorro transmitido por todo o tempo e espaço. Seguindo o sinal, o Décimo Primeiro Doutor e Amy Pond chegam ao Giro, no Século 251, um mundo artificial, formado por lixo espacial reunido por milhares de anos ao longo de uma anomalia magnética, em outras palavras, um planeta-lixão. A dupla mal tem tempo de perceber o que esta acontecendo, quando é atacada por dois grupos diferentes. Amy é levada prisioneira pelos alienígenas Sittuun, enquanto o Doutor é capturado por humanos primitivos e hostis que adoram um deus chamado Gobo. Pra piorar a situação, o Giro está apenas a algumas horas de ser atingido pelo Cometa Schuler Khan, que não apenas vai destruir o mundo artificial plano, mas colocar em risco a segurança de centenas de outros planetas, quando os destroços do Giro forem lançados no espaço.

A Noite dos Humanos se utiliza de uma fórmula que parece ser relativamente comum nos romances da série BBC New Séries Adventures, que é separar o Doutor de sua companion logo nas primeiras páginas da história, para juntá-los apenas durante o 3º ato, formato que funcionou muito bem, por exemplo, em Os Monstros Internos, um dos primeiros livros da linha. Entretanto, tal recurso não parece funcionar tão bem aqui quanto funcionou na obra de Stephen Cole.

O título do livro e o prólogo, que mostra um registro de diário de bordo relatando um ataque brutal — que termina com a frase “Os Humanos estão vindo” –, já avisa o leitor que as verdadeiras figuras a se temer nesta história, são os humanos. O autor apresenta aqui um cenário que não é apenas comum na ficção científica, mas no próprio universo de Doctor Who, onde encontramos humanos vivendo no futuro de forma “primitiva”, e que perderam o contato com a própria história. Aqui, vemos humanos, liderados por mãos de ferro por Django, que acreditam estar na Terra, e que seu Deus Gobo (um logo de palhaço com cabelos azuis) irá levá-los um dia de volta para casa, onde tudo é melhor: o Texas. Tais pensamentos são tirados das “imagens sagradas”, velhos filmes western danificados, o que também justifica por quê muito dos personagens tem nomes típicos de personagens do subgênero.

Cenário tão derivativo acaba fazendo com que o leitor vá matando as reviravoltas da trama com muita facilidade, antes mesmo que o Doutor o faça. De resto, todo esse trecho se resume ao Time Lord tentando convencer este povo de que eles precisam aceitar a sua ajuda e a dos Sittun para que milhares de pessoas, crianças incluso, não morram. Claro, ele é sumariamente ignorado repetidas vezes, por mais provas que tente produzir de que a cultura que aquelas pessoas viveram por centenas de anos é uma mentira, o que torna o plot repetitivo. O autor até capta bem o Doutor de Matt Smith, e seu discurso desesperado para um grupo de mulheres e crianças, ao fim, parece remeter ao derradeiro momento de The Pandorica Opens, ao implorar que o escutem. Ainda assim, muito dos trechos mais enfadonhos do livro são justamente os que trazem o Doutor, o que já é um grande ponto contra.

Os trechos trazendo Amy e os Sittuun possuem uma dinâmica melhor. O livro traz uma inversão interessante ao botar a companion em uma situação em que ela precisa resgatar o Doutor, e não o contrário, já que a jovem rapidamente consegue conquistar a confiança dos alienígenas ao provar que ela não é como os humanos que vivem no Giro. Os Sittunn estão no Giro em uma missão para vaporizar o mundo artificial com uma bomba que libera “devoradores nanotecnológicos”, assim, salvando o seu planeta e muitos outros da destruição que seria provocada pelos destroços após a passagem do cometa. A questão do dever contra a emoção é a problemática que guia este núcleo.

Amy desenvolve uma amizade cativante com Charlie, filho do líder da missão Sittun e o único disposto a ajudar a garota a resgatar o Doutor. A provocação entre os dois sobre as diferenças entre as suas espécies e de como um até sairia pelo outro se não pela ausência/presença de um nariz e altura um do outro são muito divertidas. Eu diria que Amy tem uma caracterização mais precisa aqui do que o próprio Doutor, com todo o jeito “moleca” e provocadora que Karen Gillan concedeu á sua personagem muito bem retratado nas páginas.

Ainda são nos trechos dedicados a Amy que surge o personagem mais interessante do livro, Dirk Slipstream. O personagem surge em seu foguete colorido meio do nada, como uma espécie de cavaleiro andante espacial, cheio de firulas heroicas. Mas Slipstream é um golpista e ladrão que tem seus próprios motivos para estar no Giro, estabelecendo-se como um daqueles vilões que adoramos odiar. Outra coisa que se deve dizer a favor da prosa do autor, é como o autor consegue manter o deadline da trama sempre presente através da aproximação iminente do cometa Schuler Khan através da luminosidade cada vez maior do chão, e da chuva de detritos, que vão se tornando cada vez mais intensas e perigosas ao longo da narrativa.

Apesar destas qualidades, A Noite dos Humanos nunca consegue realmente engajar o leitor, e isso em um livro todo construído em cima de um deadline é um grande problema. Falta ritmo à narrativa, que muitas vezes torna-se enfadonha, especialmente nos trechos passados na aldeia dos humanos. Acredito que talvez muito disso se deva à ausência de personagens originais realmente interessantes. Tirando Slipstream e Charlie, nenhum conseguiu chamar a minha atenção. Afinal, qual é o ponto de uma história de iminente fim do mundo se você não liga para os personagens?

O romance de David Llewewellyn ainda consegue terminar com uma nota alta, ao entregar um 3º ato bastante intenso, que fecha bem o arco dramático do 11º Doutor na história, e se utiliza bem da amizade de Amy e Charlie, uma das melhores coisas do livro. Mas a sensação final deixada por A Noite dos Humanos é de uma aventura que não sabe lidar muito bem com os clichês que utiliza e que dificilmente permanecera com o leitor por muito tempo.

Doctor Who: A Noite dos Humanos (Night of The Humans) – Reino Unido, 22 de Abril de 2010.
Autor: David Llewellyn
BBC New Séries Adventures # 38
Publicação: BBC Books.
246 Páginas.

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