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Crítica | Doctor Who: A Imensidão Azul (Wild Blue Yonder)

Destruição programada.

por Luiz Santiago
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Se The Star Beast, que foi oficialmente o “Especial de 60 anos” da série, esteve descaracterizado em sua essência de Especial comemorativo, não era de se espantar que A Imensidão Azul (Wild Blue Yonder) fosse qualquer outra coisa, menos um capítulo de Doctor Who que trouxesse alguma ligação evidente com a importante efeméride, não é mesmo? Trata-se, porém, de um episódio muito bom da série, embora não traga situações verdadeiramente memoráveis ou revelações relevantes para o cânone; mas possui um agrupamento de cenas e um conceito geral que são incrivelmente melhor executados do que os do episódio anterior. Em alguns aspectos, até podemos encontrar semelhanças entre as duas obras (especialmente no quesito “provocação de mensagem“), mas ao olhar para o produto como um todo, entendo que os blocos individuais de Wild Blue Yonder estão bem mais polidos. Já é algo para se alegrar.

Como resultado do café derramado no console da TARDIS em The Star Beast, o 14º Doutor e Donna vão parar no fim temporal do Universo, num momento em que não existe mais luz; num momento de morte da existência em todo Universo como hoje o conhecemos. Esse conceito, para início de conversa, é soberbo. Eu sou fascinado por aventuras que se passam em um futuro muito distante e que lidam com problemas que vão além de situações mundanas, ou seja, com ideias tão profundas e tão difíceis, que beiram o “impossível” de se imaginar em nosso tempo histórico. Russell T. Davies optou por criar uma aventura claustrofóbica com essa ideia, e com apenas dois personagens centrais na maior parte do tempo — apenas no final temos a presença de mais pessoas, além da tocante aparição do saudoso Bernard Cribbins, a quem o episódio é dedicado.

Wild Blue Yonder é bem exigente em termos dramatúrgicos, e nele podemos aproveitar a aplaudível presença de David Tennant e Catherine Tate, que têm espaço de sobra para mostrarem diferentes aproximações interpretativas, da voz às expressões faciais e físicas, dando ao espectador um panorama muito claro dessa nova dinâmica Doctor-Donna que, infelizmente, durará pouco. Eu gosto muito da expressiva cumplicidade entre os dois, de como o roteiro aproveita o fato de que eles se conhecem bem e, até em momentos de grande raiva e frustração, conseguem agir de maneira a nos tirar um grande sorriso do rosto e um grande teor de emoção no coração. A direção de Tom Kingsley aproveita o desenho de produção, com os corredores gigantes e vazios, mais a sensação de abandono e silêncio, para explorar a faceta de ação numa linha que flerta com o terror e o suspense, fazendo com que o episódio tenha camadas dramáticas inesperadas.

Para um escritor e showrunner que criou um dos episódios mais bizarros de Doctor Who (Love & Monsters), não é como se fosse uma novidade completa encontrarmos aqui vilões que não possuem noção de dimensões e crescem a ponto de fecharem a altura do corredor de uma gigantesca nave espacial. Evidente que é um tipo físico de vilão que causa desconforto e parece ridículo, mas eu não tenho problema com esse estilo de criação. E no fim das contas, acabo me divertindo com a proposta, até porque esta é justamente a intenção de RTD ao criar essas figuras bizarras e disformes: apresentar uma ameaça, mas deixar o espectador no vale da estranheza e, de uma forma bem peculiar, acrescentar algum humor medonho à situação. O fato é que essas criaturas são definitivamente assustadoras. Só o fato de serem capazes de copiar outro ser vivo, inclusive suas memórias, e o fato de terem aprendido a ser maus só de ouvirem os ecos dos horrores de civilizações distantes, faz deles figuras poderosas e temíveis.

Com um desenvolvimento orquestrado de forma mais organizada, o episódio tem poucas cenas dispensáveis. Alguns momentos nos corredores e a tentativa de criar sustos fáceis no público poderiam ser deixados de lado, mas para nossa sorte, esses momentos são muito curtos. Confesso que não morro de amores pela abertura fria desse episódio, e não entendo a intenção da produção ao escalar Nathaniel Curtis, um ator de descendência indiana, para interpretar o matemático e físico Isaac Newton. Este é um dos raríssimos casos, porém, em que a percepção inicial pode mudar positivamente se, no próximo episódio, tivermos uma explicação precisa e coerente para o que acontece aqui. Notem que a palavra que Newton acha que ouviu é “mavidade” e não “gravidade“, o que provavelmente deu origem a leis da física bem diferente das que conhecemos. Como o Celestial Toymaker está prestes a retornar à série, vou dar o benefício da dúvida e assumir que todas essas (supostas?) pistas estão ligadas aos maléficos jogos do vilão. Por ora, fico um pouco mais aliviado que, aos poucos, Doctor Who está voltando a parecer Doctor Who. Já não era sem tempo!

Doctor Who: A Imensidão Azul (Wild Blue Yonder) — Reino Unido, 02 de Dezembro de 2023
Direção: Tom Kingsley
Roteiro: Russell T. Davies
Elenco: David Tennant, Catherine Tate, Bernard Cribbins, Nathaniel Curtis, Susan Twist, Daniel Tuite, Ophir Raray, Tommaso Di Vincenzo, Helen Cripps
Duração: 55 min.

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