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Crítica | Do Mago ao Louco, de Ryoki Inoue

Uma viagem literária ruim pelos arcanos maiores.

por Luiz Santiago
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O paulistano Ryoki Inoue é um escritor reconhecido pelo guinness, desde 1993, como o romancista mais prolífico do mundo — um título e tanto! Do Mago ao Louco, de 1995, é o meu primeiro contato com a prosa do autor, e a escolha dessa obra específica para leitura veio devido à minha relação com o tarô já há alguns anos… e também por achar obras sobre o inconsciente coletivo e sobre conceitos esotéricos, especialmente o de vida após a morte, algo muito interessante de se trabalhar em literatura. Este livro, contudo, não consegue criar um material de peso com isso. Após um começo insosso, apresentando Wilson, sua secretária Carmen e um certo tarólogo, a obra entra nos trilhos e cresce muito de qualidade, chegando, em alguns pontos, a impressionar pela curiosidade que gera no leitor. Mas a partir do momento que o enredo começa a se desenvolver, a qualidade segue ladeira abaixo, sem nunca se recuperar.

Por ter uma formação anterior (em medicina) à sua vida de escritor, Ryoki Inoue consegue criar aqui um personagem patologista crível, não só pela fluidez e boa prosa imagética com que constrói o cenário da Universidade onde Wilson trabalha, mas por encarnar nesse indivíduo um comportamento e um pensamento de época (meados dos anos 90) coerentes para o propósito da obra, contrastando essa visão científica, cartesiana e assumidamente preconceituosa à visão esotérica da existência. O autor foge de uma exposição perfeitinha de “herói urbano”, mas também não exagera nas camadas de imperfeições, como aquelas feitas “apenas para chocar”. Entre passagens machistas — que também pode ser lido como características do autor transpostas para o livro — e posição bastante reflexiva diante das novidades, Wilson representa, no fim das contas, o público leigo, que, como ele, aprenderá sobre os segredos dos arcanos maiores.

O encontro deste médico com Lois pode ter os seus momentos fracos, mas também não é algo desprezível. A entrada de um homem da ciência no campo dos “mistérios da vida e da morte”, vistos através do tarô, começa como uma curiosidade inesperada. Essa abordagem dá errado no momento em que o médico visita o seu novo interesse amoroso, e o livro se transforma em uma aula sobre as lâminas e os mistérios do Tarô de Marselha. Esta não é apenas a parte mais fraca do volume, mas a progressivamente menos interessante. O texto não traz uma boa continuidade para a abertura dos mistérios. É verdade que as cenas de Lois cozinhando possuem um tom mais convidativo, porém, estão entrecortadas por conversas sobre os significados dos arcanos, tirando a graça do momento, dado o tom expositivo e chateante com que a conversa se desenvolve.

Por mais que seja fraca, eu não desgosto da trajetória até o final. Acredito que o autor construiu uma base muito interessante de dúvidas, preparando o ambiente para uma chocante reviravolta. Dado o caráter desta, e pelo modo como o livro termina (quando o tarólogo lá do início volta à cena e, depois disso, não se aproveita quase nada dos eventos que levam Do Mago ao Louco ao seu encerramento), o mistério não cresce em qualidade, mas o leitor respira aliviado depois que as lições arquetípicas terminam e Wilson tenta seguir com sua vida. Aqui, Inoue contrapõe conhecimentos engessados aos falar sobre a vida após a morte, sobre o impossível que pode acontecer diante dos nossos olhos e sobre como a nossa presença neste planeta (pode ser) um jogo muito intricado, pensado por nossas almas imortais. Notem que não é exatamente um tema para todos, mas não é por isso que o livro é ruim. O que estraga a experiência é o seu desmedido desenvolvimento, que deixa a narrativa de lado e infelizmente abraça a “cartilha-quase-dinâmica-de-tarô”. Aí fica difícil defender.

Do Mago ao Louco (Brasil, 1995)
Autor: Ryoki Inoue
Editora: Hemus
211 páginas

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