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Crítica | Desaparecidos na Noite

Quem faz o que?

por Luiz Santiago
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O fato de Renato De Maria ter passado uma boa parte de sua carreira dirigindo obras que tivessem a ver com personagens ou situações ligadas ao mundo do crime, certamente influenciou muitas de suas escolhas aqui em Desaparecidos na Noite (2024). Às vezes é difícil fugir do hábito. O que o diretor não percebeu é que, neste caso, o suspense deveria ter o grande destaque e toda a compensação do enredo precisaria repercutir essa classificação narrativa. Em vez disso, o diretor nos enrolou o tempo inteiro, fazendo-nos crer que estávamos diante de um thriller. Ao final, cedeu tudo o que deveria à mais baixa facilidade dramática, descompensando coisas que poderiam fazer com que o filme fosse “apenas mediano“. A sensação maior, após a última cena, é que perdemos muito tempo acreditando em uma história que faz toda questão de se destruir por completo do meio para o final.

Particularmente, gostei do exercício do diretor em 2019 (Nada Santo), com sua visão de caráter familiar ligada à máfia milanesa. De certa forma, ele procura fazer o mesmo aqui, só que num Universo de gênero completamente diferente, o que torna o filme problemático na própria essência. Temos novamente o ator Riccardo Scamarcio no papel principal, que precisa atravessar o inferno para conseguir uma altíssima quantia em dinheiro, a fim de libertar os dois filhos das mãos de sequestradores. A premissa é tensa e deixa o espectador à flor da pele. Não digo que a direção consegue transmitir bem a atmosfera de apreensão, mas até mais ou menos o meio do filme, temos um trabalho visual que lança boas sementes de dúvidas, suspeitas e possibilidades. Não são as mais admiráveis, mas definitivamente não se comparam ao festival de horror técnico-narrativo que desfila nos 40 minutos finais.

A tensão do filme é sustentada até o momento em que Pietro tem o “choque de realidade“, numa revelação pretensiosamente hitchcockiana que me fez rir bastante. O drama se encerra cedo demais aqui, e tudo o que vem depois da grande revelação não consegue compensar o que se tinha construído até então. Ao contrário. O roteiro vai ficando cada vez mais insuportável, os diálogos cada vez mais vergonhosos e até mesmo a intriga dos minutos finais, com seu resultado um tantinho medonho, é pisoteada na última cena. É como se nada que tenha gerado o mínimo de perigo, abandono ou tristeza no filme realmente tenha conseguido passar pelo teste de durabilidade — e quem sofre com isso é o espectador, que está o tempo inteiro realinhando expectativas, lidando com os caminhos apresentados, mas não conseguindo atinar com as incoerências da direção.

Ao apresentar um filme com um título que sugere investigação, ação de procura e suspense em torno de algo verdadeiramente preocupante, o mínimo que a produção deveria fazer era ater-se à proposta e ao menos valorizar o conflito criado. No entanto, Desaparecidos na Noite tenta fazer uma mistura de gêneros (que não dá certo nem no texto, nem na imagem) e criar reviravoltas a todo custo, prejudicando a experiência do público, que é o tipo de experiência cinematográfica bipolar e irritante, sem fixar-se em nada. Aquilo que de melhor foi apresentado no primeiro ato e no desenvolvimento da película não é concluído, e o conflito acaba sendo guiado para um lugar completamente diferente… e pior. Surpresa não é sinônimo de desarticulação de algo que poderia ser bom. A despeito de alguns acertos como figurinos e trilha sonora, a obra peca (e muito!) na direção geral, na direção de atores, no roteiro — que traz diálogos infantis, especialmente após o retorno de Pietro — e uma anti-conclusão capaz de deixar qualquer um descrente do que está vendo. Este vai para a longa lista dos filmes que nos ensinam “o que não fazer” na condução de uma obra.

Desaparecidos na Noite (Vanished Into the Night / Svaniti nella notte) — Itália, 2024
Direção: Renato De Maria
Roteiro: Patxi Amezcua, Alejo Flah, Luca Infascelli
Elenco: Riccardo Scamarcio, Annabelle Wallis, Massimiliano Gallo, Gaia Coletti, Lorenzo Ferrante, Gerhard Koloneci, Radu Murarasu, Elena Riccardi, Bruno Ricci
Duração: 92 min.

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