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Crítica | Demônio dos Mares

Filme de tubarão com atmosfera sobrenatural debate meio ambiente, mas falha em sua execução.

por Leonardo Campos
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Depois de dois grandes destaques na seara do horror ecológico, tendo os tubarões como tópico temático na década passada, com os lançamentos de Águas Rasas e Medo Profundo, produções exemplares dentro deste segmento, mais uma vez adentramos por um período de hibernação deste tipo de narrativa. Megatubarão foi um sucesso de bilheteria, repleto de efeitos visuais oriundos de um orçamento potente, mas a história em si não o transformou num marco, apesar de sua continuação chegar com pompa em 2023, junto com Demônio dos Mares, marcando um ano com veiculação dos perigosos predadores marinhos nas salas de cinema, algo que ocorre com pouca frequência, afinal, a maioria das tramas deste segmento ganha lançamento no streaming ou sequer são lançadas oficialmente no território brasileiro. Dirigido por Adrian Grunberg, a produção analisada não chega a ser um grande filme, mas traz alguns pontos interessantes que o deixam trafegar no limiar entre a média e o abaixo do razoável.

Explico: Demônio dos Mares não teve uma boa campanha de lançamento, tampouco um trailer atrativo. A sensação que tive, ao conferir, era a de lidar com mais uma tentativa fracassada de trazer este animal marinho como antagonista. Depois, temos as críticas. É impressão minha ou parece que o nosso terreno de reflexão caminha um tanto preguiçoso? Quando não temos textos que confundem release com análise, encontramos um feixe de escrita remendada por pontuações sem conexões. Não se compreende o subgênero, há comentários impressionistas demais ou então, a básica recomendação que transforma o texto num guia de consumo. Enfim, após mapear os textos publicados sobre o filme, tornei a caminhada de espectador um sofrimento contínuo, no entanto, ao terminar de conferir, tive a certeza de que havia me precipitado.

Não, desde já, assumo que não vou defender Demônio dos Mares só porque sou um apaixonado por filmes de tubarões. Há problemas diversos no roteiro de Carlos Cisco e Boise Esquerra, desde alguns diálogos pouco envolventes ao processo de extensão de uma narrativa que se resolveria muito melhor com, talvez, 20 minutos a menos. Também não posso dizer que o desempenho dramático de Josh Lucas como o herói da narrativa é emocionante, pois aqui o ator não faz um dos seus melhores trabalhos. Os efeitos visuais supervisionados por Jendrich Cervenka tentam ao máximo dar credibilidade ao tubarão de proporções gigantescas, mas a presença da criatura é reduzida demais para uma história deste subgênero. Ao longo de seus 100 minutos, o megalodonte não chega a ter mais que cinco minutos de aparições. Um pecado.

Há, por sua vez, um amontoado de pontos interessantes que tornam a trama relativamente satisfatória: em Demônio dos Mares, além do tubarão, temos uma atmosfera sobrenatural trabalhada além da média. Vozes que sussurram, bonecos representativos da cultura mexicana, ruas vazias e uma estação petroleira bem delineada pela equipe do design de produção, setor supervisionado por Carlos Osorio. Apesar da narrativa se passar um pequeno trecho de seu primeiro ato em terra firme, um espaço, aliás, ermo e silenciosamente assustador, é na tal plataforma que as coisas se transformam em maiores problemas, pois sem a devida comunicação, os personagens precisam lidar com um tubarão que vai além das forças físicas da natureza.

Conforme as crenças dos habitantes da Baia de Baja, o animal é uma entidade despertada pelo caos causado pela Nixon Oil, a empresa na qual Paul (Josh Lucas) é responsável pela documentação referente aos processos de regulamentação de serviços. Com a destruição do meio ambiente, perpetrado pela corporação, as forças da natureza entraram em estado de ódio e o deus da chuva Talhoc, em ritmo de vingança, teria enviado o megalodonte para eliminar os humanos que por ali se arriscam a passar. No caso de Paul, ele segue em viagem para uma observação dos serviços, tendo companhia da esposa Ines (Fernanda Urrejola) e de seus dois filhos. Ele a deixa em terra firme e pede algumas horas enquanto vai até a plataforma e volta, com promessa de diversão para todos após cumprir a sua carga horária.

O problema é que as coisas não dão muito certo no bar da praia. Depois de ser assediada por homens de caráter duvidoso, a esposa que esperava pelo marido em sua travessia decide pegar uma lancha com um habitante local e ir atrás de proteção. O que ela e seus dois filhos não esperavam é a presença de uma enorme criatura marinha tomada por ferocidade. Acompanhamos, do lado de cá da tela, algumas passagens criativas da direção de fotografia de Antonio Riestra, eficiente na maioria do tempo (mas não o tempo todo), funcional como o design de som de Aldo Cândia, responsável pela sensação de onipresença do mal. Para alguns, do bem, afinal, o megalodonte veio, em nome da natureza, cobrar o desastre oriundo de outra força maligna: o capitalismo, sistema que pavimenta uma trilha de dor e morte na região, bem como desemprego e outras facetas do sofrimento. Por este lado, a vingança é plena e justa.

Em linhas gerais, Demônio dos Mares é um filme de tubarão com pouquíssimas aparições desta criatura fascinante. O sangue derramado é parco se comparado aos demais exemplares do subgênero e a lição, como em grande parte dos filmes que seguem a cartilha do horror ecológico, é a que precisamos preservar mais o ambiente para assegurar a sobrevivência das nossas próximas gerações. A missão é cumprida neste quesito, mas por faltar ação, o filme perde a chance de se tornar um candidato ao posto de “clássico” da temática. Fica na superfície, ou num trocadilho, no conforto de sua plataforma temática. Não é ridiculamente ofensivo como a maioria das tramas deste segmento, mas deixa bastante a desejar. Dentre os problemas está a direção de Grunberg, incapaz de criar o devido clima de tensão quando estamos na antecipação da chegada do megalodonte. Numa cultural onde muitas vezes menos é mais, aqui, em especial, mais seria o ideal para tornar a aventura mais emocionante. Agora é esperar Megatubarão 2.

Demônio dos Mares (The Black Demon, EUA – 2023)
Direção: Adrian Grunberg
Roteiro: Carlos Cisco, Boise Esquerra
Elenco: Josh Lucas, Fernanda Urrejola, Venus Ariel, Julio Cesar Cedillo, Omar Chaparro, Bolivar Sanchez, Carlos Solórzano, Raúl Méndez, Arturo Duvergé, Luis del Valle, Omar Patin, Héctor Jiménez, Edgar Flores, Emilio Vásquez, Jorge A. Jimenez
Duração: 100 min

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