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Crítica | Demolidor: Prefeito Murdock (2018)

Padres vs ninjas.

por Kevin Rick
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Charles Soule é um patife cruel, dando esperanças aos leitores antes de arrancá-las à força em sua conturbada e inconsistente passagem pelo Demolidor. Depois do começo interessantíssimo de Prefeito Fisk, onde vemos o Rei do Crime assumir a prefeitura de Nova York, o autor gradualmente vai deixando de lado o cenário inusitado de um conflito político e jurídico entre Matt Murdock e Wilson Fisk em posições opostas da lei para dar espaço ao chatíssimo núcleo de Ponto Cego lutando com Muse, com o final do volume anterior escanteando o conceito inicial da narrativa. O próprio gancho da edição 600º é uma contradição: por um lado, temos a ideia intrigante de Matt assumindo a prefeitura na ausência de Fisk; por outro lado, a própria ausência de Fisk é resultado de um encaminhamento estranho do texto, com A Mão atacando o vilão sem uma razão aparente. Ainda assim, o saldo final do volume é bem satisfatório, com espaço para evolução.

No entanto, o que vemos no desenrolar de Prefeito Murdock é uma completa diluição da premissa do arco principal. Não só Fisk fica fora de cena, como o papel do protagonista como prefeito é limitado a lidar com a ameaça da organização de ninjas mortos-vivos (algo que o Demolidor já lidou dezenas de vezes), sem explorar qualquer aspecto mais burocrático ou político que possa enriquecer a narrativa – a posição do herói como prefeito tem seus momentos, principalmente cômicos, mas nada que efetivamente se aproveite das possibilidades temáticas e dramáticas do personagem nesse tipo de cenário. O que temos é basicamente uma desculpa esfarrapada – o fato de Ponto Cego ter feito um pacto com a Besta (Krahllak) durante sua luta com Muse – para trazer o clã ninja para destruir Nova York. Até mesmo a abordagem visual tem uma mudança brusca, com o estilo procedural e investigativo de Stefano Landini e Ron Garney sendo substituído pelo trabalho de ação de Mike Henderson, incluindo um tratamento bem mais colorido por parte de Matt Milla.

As cinco edições que compõem o volume são pura balbúrdia. Por exemplo, completamente do nada, Soule introduz uma organização religiosa milenar de padres especialistas em combate ajudando na luta contra um demônio que solta um gás venenoso em toda a cidade. O caos vira regra em uma narrativa que fica mais e mais absurda à medida que o conflito escalona para um grande desastre local, com heróis variados aparecendo para ajudar (incluindo uma rápida e indiferente participação da Elektra) e até mesmo vilões sendo soltos da prisão para protegerem seus territórios. É inegável que a história tem algum nível de entretenimento ligeiro, sustentado no divertido trabalho visual e no bom ritmo da trama, mas falta algum tipo de elemento no centro disso tudo para dar suporte à aventura. Não tem drama, não tem desenvolvimento de personagem (o próprio Demolidor é meio descaracterizado aqui, fazendo piadinhas em momentos estranhos), não tem senso de urgência e, acima de tudo, não existe qualquer unidade ou encaminhamento narrativo de destaque.

A sensação ao final de Prefeito Murdock é de que lemos páginas e páginas de esquecíveis e razoavelmente divertidas lutinhas com uma arte bonitinha. É um desperdício muito grande pegar o conceito do Demolidor como prefeito de Nova York e transformá-lo em um genérico circo de ação que já vimos milhares de vezes em quadrinhos de heróis. O Soule é tão cara de pau, mas tão cara de pau, que no final do volume é revelado que Fisk corrompeu a eleição, algo que seria uma ideia central fantástica dentro da premissa do arco (tenho minhas dúvidas que ele irá desenvolver isso no seu último volume à frente da série). Só não chego a considerar o arco de todo ruim porque existe algum nível de valor no caos da obra, que acaba sendo uma leitura rápida e que entretém, apesar de ser extremamente frustrante notar como o autor não parece ter controle ou direção alguma de para onde está movendo o protagonista.

Demolidor #601 a 605: Prefeito Murdock (Daredevil: Mayor Murdock) — EUA, abril de 2018 a julho de 2018
Roteiro: Charles Soule
Arte: Mike Henderson
Cores: Matt Milla
Letras: Clayton Cowles
Editoria: Mark Paniccia, Mark Basso, Jordan D. White
112 páginas

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