O cuidadoso desenho de Alessandro Baggi, nesta aventura, é definitivamente a coisa mais interessante que ela nos traz. Apesar de a trama, escrita por Baggi ao lado de Maurizio Colombo, apresentar cenas muito bacanas na cidade de Praga (entregando uma versão lendária de sua fundação, mais um conto sobre um alquimista e estudioso de artes místicas secretas, chamado Vaclav Aloysius), eu senti pouco impacto em tudo o que aconteceu, sendo este um dos enredos mais insossos que eu já li na série Dampyr, apesar de não ser, definitivamente, um enredo ruim.
E nem posso dizer que se trata de uma alta expectativa que foi frustrada, pois eu não fazia ideia do que esperar de O Jardim Proibido, para além das coisas que a série já tinha entregue — ou seja, uma grande quantidade de boas aventuras de terror e instigantes reflexões. Alessandro Baggi já tinha trabalhado na série antes, em Casa de Sangue, e eu estava ansioso para ver, mais uma vez, como o trabalho dele funcionaria nas páginas. Neste aspecto, não fui nem um pouco desapontado. Diferente do ponto mais frágil da narrativa, aquilo que deveria nos levar por suas cem páginas de duração: a história de estátuas que, no passado, foram homens, mas que foram transformados após a intervenção de um demônio, via pedido muito caro de Vaclav Aloysius, querendo se vingar da morte da filha.
Não creio que o andamento dos principais eventos tenham correspondido ao peso dos crimes cometidos pelos ajudantes do velho sábio, o passado, ou tenham dado o devido desenvolvimento para as criaturas, no presente. A narração de Caleb Lost dá a impressão de que um segredo imenso será revelado, mas não é isso que acontece. Já o flashback para o tempo de Vaclav é bom. Porém, sua ligação com o momento atual é apenas… decente, em termos narrativos. A mesma coisa é válida para a investigação dos mocinhos, que praticamente não existe. E encontramos deixas de sobra para que se investigasse melhor os crimes, principalmente com um (possível?) novo direcionamento dado a Tesla, nesta edição, que poderia assumir o papel de suspeita. E apesar de ter um quadro insinuando isso, pela boca de Kurjak, a ideia foi deixada de lado.
Depois de entender que o drama não teria relação direta com a fundação da cidade de Praga, apenas com uma ameaça acidental — poderosa e cruel, mas nada tão interessante a longo prazo, para ser sincero –, eu pensei que Tesla seria o centro das atenções, talvez por acabar cometendo um erro na busca pela verdade, o que também não acontece na história. Ou seja, os autores nos dão diversas pistas interessantes no decorrer das páginas, mas nenhuma delas é desenvolvida e a trama fica o tempo inteiro na superfície, jogando automaticamente com encadeamentos textuais já conhecidos na série, e que não trazem nada que faz o olhar do leitor brilhar.
Bem… a arte de Alessandro Baggi é a exceção, nesse caso. Com um começo meio lírico de O Jardim Proibido e uma pegada mais reflexiva vinda de Tesla, sobra espaço para quadros de contemplação muito bonitos, e eu devo destacar todas as cenas que se passam no “jardim”. Os ângulos, a arquitetura, a relação macabra entre natureza, esqueletos, vidros quebrados e isolamento numa cidade do século XX, é visualmente admirável, e faz um baita trabalho de criação de atmosfera macabra, ganhando muito mais o público do que a história que está sendo contada. Esta é uma daquelas leituras com resultado final positivo, mas diante das quais temos um bom número de adendos e pequenos incômodos.
Local de ação: República Tcheca (cidade de Praga)
Personagens principais: Harlan Draka, Kurjak, Caleb Lost, Tesla
Dampyr – Vol. 26: O Jardim Proibido (Il giardino proibito) — Itália, maio de 2002
Roteiro: Maurizio Colombo, Alessandro Baggi
Arte: Alessandro Baggi
Capa: Enea Riboldi
No Brasil: Editora 85 (outubro de 2021)
Tradução: Júlio Schneider
100 páginas