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Crítica | Curtas do Oscar 2023: Live-Action

Quebras de expectativas e contextos frios para se atentar.

por Davi Lima
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Oscar 2023: Live-Action

No seguinte compilado, você encontrará críticas de todos os indicados a categoria de Melhor-Curtas Live-Action do Oscar 2022. Leia as críticas e mande seu comentário! Oscar 2023: Live-Action

An Irish Goodbye

Na linha clássica do humor britânico, que brinca com a morte – como Ricky Gervais faz na série After Life -, a quebra de expectativa é sempre a linha tênue entre o drama e comédia. Visualmente é como Le Pupille, uma fotografia e uma unidade estilística bonita e formal, usando planos frontais e posicionamento de personagens em cena para usurfruir da atuação dos atores. O chamado humor físico, ou o drama dos gritos, feito por Turlough e Lorcan, os dois irmãos em luto, é o que enche a história. Na simplicidade de uma lista de afazeres para superar a morte da mãe, a graça é semelhante ao filme Dois Irmãos da Pixar: não é sobre a morte, mas sobre o que fazer com a família com vida.

Turlough é o irmão parece seguir em frente após a morte da mãe, enquanto Lorcan, que tem Síndrome de Down, parece não seguir em frente. O humor e o drama se misturam aí, em que nem o padre consegue levar completamente a sério a cremação da mãe deles. Apesar do evidente detalhe que a certa lista de fazeres da mãe em vida não é entregue a Lorcan, ainda assim o curta cria essa possibilidade, na medida que consegue imergir Lorcan e Turlough fazendo várias atividades para a mãe como muita verdade. A quebra de expectativa poderia ir por água abaixo, mas trunfo do curta é menos pela simplicidade da narrativa e mais por sustentar a estrutura audiovisual britânica para criar atmosfera dos climas narrativos.

O título do curta acaba sendo muito sugestivo, em que de fato a caracterização britânica do universo, no quesito cultural, é relevante para entender melhor a qualidade da história. Apesar disso, há uma dependência muito disso no texto, em que qualquer outra alternativa dramática ou cômica posta na produção é homogênea nessa mesmo argumento: somos britânicos. Então, mesmo que os dois diretores entreguem um real “tchau irlandês”, não nada mais que isso. Uma história que também é hermética na sua linguagem, mesmo que trate do tema universal de vida e morte.

A Irish Goodbye (Reino Unido, Irlanda, 2022)
Direção: Tom Berkeley, Ross White
Roteiro: Tom Berkeley, Ross White
Elenco: Michelle Fairley, Paddy Jenkins, James Martin, Seamus O’Hara
Duração: 23 min.

Ivalu

Não quero viver aqui sem você. A irmã de Ivalu, mesmo que seja a personagem que mais aparece em tela, é uma coadjuvante na busca pela real Ivalu. Sua frase sobre não querer viver sem sua irmã, e como a narrativa de flashbacks é a progressão dramática sobre o que é e o que aconteceu com ela, é tão sombrio e fantástico – no sentido mais fantasioso, ou mitológico – quanto seguir um corvo. Ivalu é um curta que torna o mistério em ausência. Quanto mais a paisagem vai se tornando inóspita nas geleiras, mais Ivalu aparece, e mais ela é importante para a irmã. No sentido visual e temático, é um complemento reverso.

Nisso, o diretor compreende o drama circular, em que a crisma, momento de crescimento espiritual e maturação para a juventude se torna uma outra memória. A irmã fala muito do perfume, e seus sonhos com o corvo, até se tornar real, é um reflexo de luto com desespero. Uma fuga vai se tornando morte, pelo que se acha de Ivalu no caminho do corvo – que normalmente indica morte – quanto pelo que a irmã vai rememorando de traumas. Nisso, o drama é bem assertivo, porque mesmo que não tenhamos acesso a protagonista sem o intermédio da irmã, a falta de Ivalu para sua vida completa quem é sua irmã mais velha.

Assim, o flashback bem montado com o percurso da irmã mais nova em busca por Ivalu não é apenas para resolução de mistério, mas uma sobreposição emocional bem estruturada para representar tanto a irmã mais velha quanto a mais nova. Afinal, a ausência pode dizer muito mais sobre a presença, seja pela memória, seja pelos rastros – roupa, perfume, etc. Ivalon, enfim, chega a meandros fantasiosos na mente de uma adolescente, ocupando a tragédia de sua irmã mais velha. Sou a única que sabe onde você está. Eu e o corvo. A frase final diz muito, o entendimento da morte.

Ivalu (Dinamarca, Groelândia, 2023)
Direção: Anders Walter, Pipaluk Kreutzmann Jørgensen
Roteiro: Anders Walter
Elenco: Mila Heilmann Kreutzmann, Nivi Larsen, Angunnguaq Larsen, Tuperna Mette Larsen, Vittu Suluk Olsen, Anna Elionora Olsen Rosing, Anja Geisler Almind
Duração: 16 min.

Le Pupille

O destino opera de maneiras infinitas. Assim dizem as crianças órfãs como moral do conto de Godofredo. Le Pupille é tipo de obra que se faz a partir da quebra da estrutura audiovisual. Toda a criação de mundo do curta é como uma pintura, disciplinada, como um pupilo, ou uma pupila bem branquinha que enrijece a íris que dá cor ao olho. A história é sobre falhar em seguir regras, em que o discurso militar vira dança e música, e a reza é por uma amante conseguir ficar com seu homem. A graça de Serafina, a criança malvada, como a madre diz, é ser parte dessa estrutura disciplinada – a que não canta a música, nem dança, mas decorou a música. Assim, a ideia moral, com mais realismo, se torna uma verdadeira dúvida.

Para uma obra que busca ensinar algo do Natal, apenas mostra a realidade do pecado, do mal olhado, do adultério e da descoberta da maldade como algo bom. Comer comida do chão, compartilhar bolo e não pagar o Godofredo da chaminé. Tem vários erros, uma estrutura fílmica que gosta do erro, da aceleração da cena – como comédia – e da pausa de frames – como terror. O corte do bolo de 70 ovos que a amante entregou para as crianças é uma verdadeira tortura contra o alimento, enquanto as crianças cantam sobre a história que elas participam, como um deboche da história de Natal sobre Godofredo – que descobrimos no final que é o limpador de chaminés.

Em geral, esse curta distribuído no Disney + é um bom exemplo de ser violento, sexual e aterrorizante sem ser explícito. Envolta das crianças, da pretensa inocência que se carrega na imagem italiana, da metade do século XX, dentro de um orfanato para meninas com madres católicas, toda a quebra de expectativa é desenvolvida. Entre crianças passivas, com atitudes repressoras o pecado sempre surge de novo. Não adianta disciplinar sem ensinar arrependimento. Ou seja: Serafina é a malvada, então ela se torna a boa. Aí estão os infinitos do destino.

Le Pupille (Itália, EUA, 2022)
Direção: Alice Rohrwacher
Roteiro: Alice Rohrwacher
Elenco: Alba Rohrwacher, Greta Zuccheri Montanari, Carmen Pommella, Lady Maru, Valeria Bruni Tedeschi, Melissa Falasconi, Febe Sapia, Francesca Uccelli, Mila Buganè, Maria Renata Corelli, Olivia Ascari, Alma Palmas, Margherita Righi, Sofia Bendya, Miriam Forcella, Heidi Viola, Dalia Tonioli, Margherita Greco, Matilde Jacchia, Lavinia Tassi, Olimpia Tassi, Eugenia Tassi, Maria Luisa Briguglia, Nora Luce Briguglia, Carla Briguglia, Anna La Barbera, Anita Crucitti, Luciano Vergaro, Fabio Gaetani, Leo Mantovani, Daria Deflorian
Duração: 37 min.

Night Ride

Se apresentando nas três categorias do Oscar em relação aos curtas-metragens, o The New Yorker distribui Night Ride, o encontro da inclusão social. Uma mulher com nanismo e um transexual numa noite em que a pressa e o trabalho não combinam. Muito do que a história conta é baseado em conflitos que parecem cômicos, seja no trabalho de dirigir um bonde, seja na protagonista fazer esse trabalho por tentar fugir da noite fria. Mas a inclusão social acontece nesses momentos não ordinários, em que a sociedade entra em conflito, ou se resolve por entender os espaços que convém. Quem trabalha no resto da noite, e quem se senta no banco do bonde, afinal?

Se a mulher com nanismo do curta queria tanto fugir do frio, no final se aquece com a companhia do transexual. A motivação de sair do bonde para ajudar o trans é a resolução de todos os dramas. Enquanto os transfóbicos trabalham, continuando dirigindo o bonde, como castigo. Night Ride não é bem fácil de assistir, pois desenvolve uma tensão que muita coisa ruim pode acontecer no ambiente público, num transporte público. Mas também muita coisa boa pode acontecer de justiça social nesse mesmo ambiente. Na brincadeira pelo desespero de dirigir um bonde, tudo se torna sério para parar de dirigir.

Os dois diretores, enfim, conseguem atingir o alvo: inclusão social mediante contextos extraordinários – quando nos atentamos mais ao redor. Se a anã não estivesse dirigindo tudo seria diferente, seja no trans perder a peruca, seja em ajudá-lo. Essa é a graça de Night Ride, e o seu drama. Entre causa e consequência, no conflito inesperado, nos atentamos mais ao redor, e assim incluímos e fazemos justiça…mesmo no frio da noite.

Night Ride (EUA, 2022)
Direção: Michael Kruger, Casey Crocker
Roteiro: Michael Kruger, Casey Crocker, Hunter Jarman
Elenco: Sydney Beauchcene, Eliott Glasser, Hunter Jarman, Leeah Jones, Michael Kruger, Jon Ripley, Luke Schuck, Mackenzie Wynn
Duração: 9 min.

The Red Suitcase

Como um grande efeito Monalisa – assim como o zoom do último plano provoca – a percepção do olhar muda toda a arte. O que o diretor Cyrus Neshvad faz muito bem é dar peso aos objetos e as distâncias. A mala vermelha – que dá nome a história – o desenho com nome que confere a identidade do passaporte, as flores, o dinheiro, o lenço na cabeça…há sempre esse close de tensão. A claustrofobia da narrativa é muito mais perspectiva do que cumulativa. Mesmo que pareça que a protagonista fuja, o seu esposo parece muito mais uma figura do medo do que uma dinâmica realista de conveniência de encontros dentro do aeroporto.

Quando o audiovisual é bem trabalhado, cenas como a protagonista escondida no lado esquerda da tela e o esposo esbravejando no celular no lado direito cria a ideia de proximidade, mas a perspectiva determina distância, medo e tensão. Esconder a maleta vermelha e adentrar no ônibus são as ações que quase provocam alívio, mas a presença do esposo sempre reaparece, como outro tipo de medo, um medo num país europeu. A nova vida imposta pelo pai vai além do casamento. Por isso a retirada do lenço é tão icônica, a troca do dinheiro e todo o sistema do aeroporto. The Red Suitcase envolve muito mais que um casamento arranjado.

Por isso, mesmo com a maleta sendo despachada, mesmo que a arte da protagonista seja perdida, se a princípio ela parece livre do esposo arranjado, mediante os sacrifícios que faz para se esconder, ainda é tudo triste. O efeito Monalisa é sempre estar atento ao rosto, aos detalhes da pintura de Da Vinci diante da posição que você olha. Assim é esse curta, que no alívio e na tensão, por detalhes eles se invertem facilmente, tudo por uma perspectiva transformada.

The Red Suitcase (Luxemburgo 2022)
Direção: Cyrus Neshvad
Roteiro: Cyrus Neshvad, Guillaume Levil
Elenco: Nawelle Ewad, Sarkaw Gorany, Anne Klein, Céline Camara, Jerome Funk, Denis Jousselin, Oscar Martin
Duração: 18 min.

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