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Crítica | Convenção das Bruxas (2020)

por Fernando JG
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Com nomes de peso dentro e fora das câmeras, Convenção das Bruxas (2020) prometia, até então, um longa sofisticado e atualizado da história de bruxas do romancista Roald Dahl. Propondo um remake de uma de fábula já adaptada e batizada no cinema, Robert Zemeckis arrisca-se ao decidir retrabalhar um queridinho da fantasia dos anos 90. Em um ano de refilmagens, 2020 tem sido um exemplo ao nos relembrar os motivos de um clássico ser um clássico. Rebecca (2020) e Convenção das Bruxas (2020), ambas adaptações de romances, que, no entanto, já foram adaptados para as telas pelas mãos de Alfred Hitchcock e Nicolas Roeg respectivamente, não demonstram os motivos de suas refilmagens, visto que não atualizam o que já foi feito, e muito bem, pelos seus antecessores.

O romance de Roald Dahl, As Bruxas, que inspirou os filmes, é perturbador ao modo característico dos medos infantis mais comuns e gerais. Com uma trama um tanto interessante no livro, o filme passa por aí e entretém pela narrativa e pelo curso dos acontecimentos, que são muito divertidos. Ainda que Zemeckis não tenha a intenção de fazer uma cópia da película de 1990, e sim uma releitura a partir do romance, lhe faltam os aspectos que compõem o terror infantil contido no livro. O trabalho com a imaginação primária da infância falha. Apesar dos pesares, é um filme divertido, mas se perderá na sombra dos anos.  

A narrativa gira em torno da história de um rapazinho (Jahzir Bruno) e em como ele se tornou um rato – já que o filme inicia com uma fala dele numa palestra sobre bruxas. A partir daí, o filme volta e conta desde o início tudo o que aconteceu até aquele momento. É o usual e conhecido por todos: um menino que é criado pela avó (Octavia Spencer) está acostumado a ouvir as histórias de bruxas narradas por ela e, nesta histórias, a avó conta o quanto elas odeiam crianças. Em dado momento, o menino tem um contato verdadeiro com uma dessas maldosas criaturas apavorantes. Hospedados em um hotel, o menino descobre um salão perfeito para brincar e passar o tempo, quando, repentinamente, a porta se abre e o grupo de bruxas ocupa o lugar; assim, o garotinho descobre, por acaso, que está em uma convenção de bruxas, cuja intenção é aniquilar todas as crianças, transformando-as em ratos.

O primeiro ato é interessante, pois acompanhamos o processo de luto do garotinho logo após perder os pais em um acidente de carro. A fotografia tem requintes de magia,  o filme começa bem e a trama dá sinais de novidade ao introduzir uma narrativa ambientada nos anos de 1960 no estado do Alabama, com toda a bagagem social que essa década carrega na história dos Estados Unidos. Ao escalar uma família negra, inserida num contexto complicado da história norte-americana, o diretor parece caminhar para tentar compor uma obra autoral, com uma unidade estilística afiadíssima. Mas não. Ele para por aí. 

O elenco conta com nomes titânicos, como Anne Hathaway (O Diabo Veste Prada, Os Miseráveis), Octavia Spencer (Histórias Cruzadas, A Forma da Água) e Stanley Tucci (O Diabo Veste Prada, Capitão América), além de uma equipe de produção refinada, com direção de Robert Zemeckis (De Volta Para o Futuro, Forrest Gump); produção de uma das mentes mais criativas e badaladas dessa geração: Guillermo Del Toro (O Labirinto do Fauno, Forma da Água), e do excelente Alfonso Cuarón (Roma, Gravidade). Apesar do aparato de guerra, inacreditavelmente os efeitos computadorizados não funcionam. Artificial e inverossímil, a película de 2020 peca quando o filme caminha para se tornar uma animação. Próxima do picaresco, Anne Hathaway, que faz o papel da Grande Bruxa, está muito longe da elegância e da antipatia de Anjelica Huston com a sua soberba e lendária atuação como Grande Bruxa no longa de 1990.

O sotaque é constrangedor e a cena em que ela pronuncia a palavra garlic é forçosamente horripilante. Se por um lado o papel de Anne Hathaway desliza, Octavia Spencer brilha. Spencer constrói uma personagem coesa, interessantíssima e com protagonismo no papel de avó. Nas cenas finais, quando ela se safa de ser interrogada pelo administrador do hotel em relação aos ratos que haviam na sua bolsa, Spencer entrega um momento brilhante, dissimulado e notável para o longa. Um dos únicos.  Já que estamos falando de algum acerto, tenho de reconhecer que a estrutura narrativa, em primeira pessoa, é boa e dá a aparência de ser um conto de fantasia; um conto de fadas na voz do Chris Rock

Com uma CGI preguiçosa, a fantasia não orna, e é devastador relembrar todo o esforço na montagem de equipe para a produção do filme, que tem as mãos do sempre brilhante de Del Toro, que, desta vez, não fez a diferença. O diretor da sequência de De Volta Para o Futuro (1985), Robert Zemeckis, não se destaca tanto na direção, mas traz sua marca pessoal, sobretudo quando decide não trabalhar a metamorfose da Grande Bruxa, como acontece no primeiro filme. A gente espera que ela se transforme num monstro, mas a mudança não é tão radical, o que surpreende e inova. Mas também não tem tantos momentos marcantes, como a câmera-rato do primeiro filme, em que é gravado em perspectiva rasteira, quando os meninos se tornam ratinhos. Ou quando a Grande Bruxa empurra um carrinho de bebê ladeira abaixo, no precipício. Tinha tudo para ser uma grande refilmagem, mas não é. 

O longa, que conta com uma estrutura gigantesca, decepciona de modo geral. Apesar disso, é divertido, comum e esquecível depois de assistir. Nada impressiona, mas o filme prende pelas peripécias, igual a tantos. Mas nada de especial. Para os adultos, vale a pena conferir principalmente pelo romance,  pela adaptação de 1990 e pelo elenco, fora isso, não sei se é tão interessante quanto esperava que fosse.

Convenção das Bruxas (The Witches – EUA,  2020)
Direção: Robert Zemeckis
Roteiro: Robert Zemeckis, Kenya Barris e Guillermo Del Toro.
Elenco: Anne Hathaway, Octavia Spencer, Jahzir Bruno, Stanley Tucci, Chris Rock, Codie-Lei Eastick, Kristin Chenoweth, Charles Edwards, Morgana Robinson, Josette Simon, Orla O’Rourke,  Penny Lisle, Simon Manyonda
Duração: 106 min.

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