Contagem de Cadáveres é parte integrante do segmento slasher tardio, conjunto de produções do subgênero assassino em série mascarado lançadas após o processo de desgaste da fórmula acampamento + jovens incautos + mortes sangrentas. Era 1986, Freddy Krueger já tinha começado a seguir rumos equivocados, Jason também adentrara numa zona de desgastes e Michael Myers tinha dado um tempo na matança. Pinhead, personagem considerado slasher, mas que me causa estranheza o encaixe neste segmento, traria uma renovação para tais filmes, bem como Candyman, outro monstro slasher com mescla de elementos sobrenaturais e filosóficos.
Dirigido por Ruggero Dedodato, cineasta italiano guiado pelo roteiro de Luca D’Alisera, Alessandro Capone e Sheila Goldberg, Contagem de Cadáveres não trouxe renovação, tampouco se preocupou em refletir criticamente a linguagem slasher. Isso, no entanto, não impediu o filme de ser uma divertida abordagem da temática que fez bastante sucesso no Brasil na era VHS. Quando lançamento, encontra-lo disponível nas prateleiras era bem difícil, tal como a sua serventia enquanto catálogo. Quando não se tinha um terror lançado “da hora”, investia-se nele como opção para ver ou até mesmo rever.
A trama se estabelece da seguinte maneira: um grupo de jovens, em férias, decide acampar numa região desértica do Colorado. Antes, uma jovem é morta numa cena de abertura tipicamente slasher. 15 anos depois é que nos encontramos com as novas vítimas, decididas a se divertir e reabrir o “local amaldiçoado”. Há diversas lendas locais, de origem indígena, que alegam haver uma entidade assassina evocada para a proteção das pessoas que profanam tal território sagrado. Logo mais, um a um, os jovens serão perseguidos e mortos de maneira brutal, bem de acordo com as propostas da cartilha slasher. Nudez, humor e sangue formam a tríade que guia esta produção repleta de irregularidades narrativas, mas deliciosamente divertida.
Sob a direção de Deodato, experiente na abordagem da floresta e de regiões desérticas como espaço potencialmente vigoroso para filmes de terror, haja vista o seu clássico abominável Holocausto Canibal. Com imagens gravadas na floresta de Abruzzo, na Itália, a direção de fotografia, assinada por Emilio Loffredo, peca por não empregar uma iluminação que seja suficiente para as cenas noturnas, num tom de escuridão constante que atrapalha demasiadamente a nossa contemplação do que de fato ocorre em cena. As perseguições, por sua vez, são eficientes, acompanhadas pela esquizofrenia dos sintetizadores da trilha sonora de Claudio Simnetti.
Ao longo de seus 90 minutos, o design de produção de Paolo Biagetti funciona bem, em especial, nas cabanas e demais espaços que servem de cena para os assassinatos. Ademais, ao passo que o filme avança, ficamos divididos entre a diversão dos crimes criativos e burlescos, juntamente com a irritante indefinição do responsável pelos crimes. Afinal, é ou não uma entidade sobrenatural? Será alguém com um trauma do passado, decidido a fazer da matança a sua terapia? Será preciso assistir Contagem de Cadáveres até o final para descobrir. Um pequeno twist tardio ocorre após o suposto desfecho dos assassinatos, aparentemente focado numa continuação que nunca foi produzida.
O que podemos observar no conjunto do filme é a popularidade de Sexta-Feira 13 e seu posto de queridinho slasher. É óbvio que Halloween – A Noite do Terror, com a sofisticada direção de John Carpenter, apresenta-se como um filme esteticamente melhor que qualquer episódio da franquia de Jason, mas ainda assim, quase todas as produções slashers posteriores focaram em assassinatos em acampamentos com passado sombrio. Freddy Krueger ainda é o queridinho da crítica, pois considera-se sua formação enquanto personagem mais complexa, mas ainda assim, o psicopata da máscara de hóquei possuía e ainda mantém uma legião de fãs bem maior.
A comprovação destas afirmações está na estrutura dramática de Contagem de Cadáveres, basicamente toda emulada de Sexta-Feira 13. O gordinho atrapalhado, a “puta” que será morta por ser sexualmente livre, a fornicação como ato espúrio com garantia de punição fatal e outros elementos, tais como as climáticas cenas de perseguição nos bosques. Os corpos que somem sem ninguém sequer sentir a ausência, a falta de verossimilhança dos ataques da entidade maligna, as ações questionáveis dos personagens diante do perigo e o segredo do passado que retorna para recobrar uma dívida sanguinária.
Contagem de Cadáveres (Body Count, Canadá/Itália, 1986)
Direção: Ruggero Dedodato
Roteiro: Alessandro Capone, Luca D’Alisera, Sheila Goldberg
Elenco: David Hess, Bruce Penhall, Mimsy Farmer, Luisa Maneri, Andrew J. Lederer, Nicola Farron, John Steiner, Cynthia Thompson, Nancy Brilli
Duração: 90 min