Não sou adepto leitor de quadrinhos, mas as histórias do anti-herói John Constantine sempre me chamaram a atenção por estarem a um passo próximo do meu gênero favorito: o terror. Coisa que razoavelmente foi transportada pela sua primeira adaptação cinematográfica de 2005, com Keanu Reeves, embora, muito se reclame da pouca fidelidade para com a saga original: Hellblazer. Desse modo, o velho nerd conhecido, David S. Goyer, roteirista responsável pela trilogia Blade e Cavaleiro das Trevas, ganhou a missão de comandar uma nova adaptação de Constantine para a TV, que pelos benefícios da estrutura episódica e divisão de temporadas, teria tempo suficiente para desenvolver um material mais respeitoso com as histórias primárias do personagem e ainda ter espaço para adquirir uma personalidade enquanto obra isolada.
Infelizmente, a primeira temporada de Constantine se concentra tanto em ser uma transcrição que se esquece de lhe dar vida e identidade, mais parecendo uma produção genérica da CW do que uma série caprichada nos moldes da NBC. O piloto até começa promissor. Somos apresentados a um Constantine (Matt Ryan) enérgico, com aquela personalidade despojada, cínica e individualista puxada diretamente das HQ ‘s; mas ele é ao mesmo tempo falho, carregado de conflitos dramáticos relevantes que cercam suas responsabilidades como mestre do ocultismo. A introdução do personagem adjunto da mitologia livre de anjos, demônios e outros elementos sobrenaturais na terra que precisa administrar parece bastante crível porque, apesar de ter um caráter de incidente isolado, o roteiro do primeiro capítulo abre portas para outras possibilidades interessantes na temporada, em especial, a investigação de um caso maior denominado “Escuridão Crescente”.
Contudo, os demais episódios não conseguem, dentro da sua estrutura procedural de “caso da semana”, desenvolver uma crescente nesse teórico ponto central estabelecido no piloto. Assim, fica a ligeira impressão de que ou os demais episódios são fillers, ou que a força do primeiro episódio estava na sua execução isolada e não na constituição de uma narrativa principal que somente é pincelada em pequenas conexões nos capítulos próximos do final da temporada. Tirando três ou quatro episódios isoladamente razoáveis, por (de alguma maneira) explorarem o passado do protagonista ou colocá-lo numa situação mais desconfortável do que o comum – como é o caso do dueto em que é ele que precisa ser exorcizado –, a maioria dos enredos são simplesmente desinteressantes.
Há pouca criatividade no exercício de gênero, tanto na concepção de um entretenimento mais leve, no molde de Supernatural, guiado pelas interações entre Constantine e seus parceiros Zed (Angélica Celaya) e Chas (Charles Halford) – carentes de metade da presença e carisma do protagonista –, quanto na tentativa de aprofundar e trabalhar o background dos personagens secundários que sofrem das ameaças sobrenaturais. Sem contar que imageticamente é uma série muito pobre, não só nos efeitos visuais mal-acabados – que vez ou outra quebram totalmente a imersão –, mas principalmente na falta de construção atmosférica sombria circundando a conceituação de monstros e demônios que, parecem todos iguais e não passam nem um pouco o temor que deveriam. Matt Ryan até se esforça em adicionar cargas emotivas à artificialidade das tramas, mas chega determinado momento em que a sua atuação cheia de trejeitos (que ainda é a melhor coisa da série) também cansa, e o investimento do telespectador na continuidade do enredo torna-se insustentável.
Fica difícil ter, em 13 episódios, ainda que em duração curta de 40 e poucos minutos, 10 histórias com o sentimento de que aquilo não vai a lugar algum, sendo a maioria de qualidade no máximo “regular” e extremamente repetitivas. Por consequência, Constantine corre riscos de uma não renovação, pois não estamos falando de CW. Ainda que seja em TV aberta, tenho minhas dúvidas se haverá apelo popular clamando por sua continuidade. Uma pena, porque é um personagem com potencial que segue não sendo explorado completamente no audiovisual.
Constantine – 1ª Temporada | EUA, 2014 – 2015
Criação: Daniel Cerone, David S. Goyer
Direção: Romeo Tirone, Neil Marshall, John Badham, Nick Gomez, T.J. Scott, Steve Shill, John F. Showalter, David Boyd, Mary Harron, Sam Hill, Thomas J. Wright
Roteirista: Daniel Cerone, David S. Goyer, Sneha Koorse, Brian Anthony, Christine Boylan, Jerry Siegel, Mark Verheiden, Cameron Welsh, Rockne S. O’Bannon, Carly Wray, Davita Scarlett, Jamie Delano, Garth Ennis
Elenco: Matt Ryan, Harold Perrineau, Angélica Celaya, Charles Halford, Michael James Shaw, Mann Alfonso, Jonjo O’Neill, Jeremy Davies, Claire van der Boom, Emmett J Scanlan, David A. Gregory, Jose Pablo Cantillo
Duração: 13 episódios de 43 min. cada