Se há um gênero musical onde há um risco enorme de uma banda cair no vale do “mais do mesmo”, esse é o rock. Uma quantidade absurda de bandas já se tornaram piada por sua estratégia digamos… mais confortável, ou por sua sonoridade única. AC/DC, Red Hot Chilli Peppers, Motorhead, entre outras sempre ficaram marcados por uma mesma sonoridade que se repetia constantemente a cada álbum. No entanto, ninguém deve sofrer mais com esse debate do que o Foo Fighters, grupo sempre muito criticado por manter uma sonoridade rockeira já um tanto padronizada demais e confortável.
Concrete & Gold recebeu uma descrição no mínimo peculiar por Dave Grohl durante a divulgação. Nas palavras do vocalista, eram canções que resultavam do encontro de Sgt. Peppers Lonely Club Hearts Band (clássico álbum dos Beatles) com a fúria do Motorhead. E embora chegue perto de ser uma heresia tal comparação, de certa forma é até que válida. Não, não se trata de um disco inovador ou sequer corajoso do Foo Fighters, mas encontramos aqui algumas das sonoridades mais frescas e diversificadas da banda em anos.
“Eu não quero ser rei/ Eu só quero cantar uma canção de amor” – os melhores versos de abertura que escutei esse ano também devem ser os mais honestos que já vi Dave Grohl proclamar. Aqui, o frontman do Foo Fighters declara de coração aberto que não busca pretensões em sua música, uma referência tanto a críticas diretas a seu grupo, quanto à necessidade de muitos artistas em expressar conteúdo político em uma caótica indústria musical pós eleição de Trump.
Nunca foi vista tanta influência de Beatles em uma obra do Foo Fighters como em Concrete & Gold. Happy Ever After (Zero Hour) parece chupada das canções mais acústicas da banda inglesa – qualquer semelhança com Blackbird e derivados não é mera coincidência. Todo o amplo aspecto melancólico do disco recaptura lembranças da banda de Liverpool, seja através das suaves cordas aconchegantes de Dirty Water e Sunday Rain – que recordam os momentos intimistas do White Album – ou a produção um tanto “George Martiniana” da faixa homônima, com uma série de efeitos sonoros e rica harmonia.
A voz de Dave sussurra ou canta de forma leve pela maior parte do trabalho. Óbvio que seus guturais característicos e gritos aleatórios estão presentes em demasia, mas é interessante ver o vocalista através de vocais mais contidos, conseguindo provar seu competente timbre. Run, a faixa mais everfescente do disco, sabe dosar bem o peso das guitarras e do gutural sem deixar de construir uma canção essencialmente comercial, carregando o fardo de principal single do álbum. E se você é um desses fãs que sentem falta do início da carreira do Foo Fighters, a magnífica The Line pode te dar um vislumbre dos tempos áureos da banda que um dia já compôs clássicos como My Hero e Everlong.
Apenas não se engane, o mais recente trabalho do Foo Fighters é genérico (e aqui eu digo no sentido literal da palavra) desde sua capa. No entanto, temos aqui alguns dos momentos mais interessantes do grupo em anos, apostando em um belo teor mais melancólico. Sou obrigado a admitir: mesmo com uma sonoridade tão padronizada, se o Foo Fighters ainda se mantém relevante no atual e cada vez mais extinto mercado musical do rock, alguma razão especial existe. E provavelmente essa razão é a honestidade e paixão de seu líder com a música que deseja produzir: o bom e velho rock n’roll
Aumenta!: Happy Ever After (Zero Hour)
Diminui!: The Sky Is A Neighborhood
Concrete & Gold
Artista: Foo Fighters
Lançamento: 15 de setembro de 2017
País: Estados Unidos
Gravadora: RCA
Estilo: Rock