Já não é mais novidade termos narrativas envolvendo super-heróis, ou uma subversão do gênero em algum nível, mas ainda podemos encontrar uma história ou outra que consegue trazer algo diferente o suficiente para chamar a atenção do espectador, o que infelizmente não é o caso de Como Virei Super-Herói, que pode até ter alguns elementos promissores, mas não passa de mais uma abordagem óbvia para uma premissa que já não é subversiva faz um bom tempo.
Em uma Paris tomada pelos super-heróis, que estão cada vez mais saturados e vivem de promover sua própria imagem, alguns civis sem poderes sentem-se incomodados ao ponto de procurar uma droga misteriosa capaz de atribuir habilidades especiais ao seu usuário (no caso, a capacidade de atirar rajadas de fogo das mãos). Investigando o caso, os agentes Moreau (Pio Marmaï) e Schaltzmann (Vimala Pons) decidem procurar os responsáveis pela droga, e para isso eles tem o auxílio dos ex-heróis, Monte Carlo (Benoît Poelvoorde) e Callista (Leïla Bekhti).
Dirigido por Douglas Attal, a proposta inicial desse filme não é a mais original de todas, já que quadrinhos como Powers, de Brian Michael Bendis, abordavam essa mesma ideia há mais uma década na editora Image; sem contar que no mesmo ano de lançamento de Como Virei Super-Herói (Comment je suis devenu super-héros, no original), tivemos Power, da dupla Henry Joost e Ariel Schulman. A vantagem do longa de Attal é ter uma execução bem melhor, mas não é como se isso fosse um enorme elogio quando lembramos o quão fraco foi o filme de Joost e Schulman.
Por se comprometer com a ideia de explorar uma estrutura narrativa vista tantas vezes, mesmo quando tentam subvertê-la, o filme acaba explorando elementos que já foram abordados de maneira mais eficiente e inteligente em outras das diversas “histórias que trazem um lado novo dos super-heróis”, e por isso o enredo não passa de um conceito bem intencionado, mas atrasado demais para um mercado saturado com pontos de vista sobre o assunto. E tudo piora quando o roteiro se arrisca a construir um passado traumático para o protagonista através de um flashback ao qual retornamos constantemente, mas a montagem repetitiva deixa tudo mais previsível do que o necessário, quando o propósito parecia ser a de entregar uma grande revelação.
Mas não é por conta de um enredo batido que deve-se descartar completamente o trabalho de Attal, isso porque há elementos muito bem aproveitados aqui, e se conseguimos encarar algo previsível de filmes de orçamento bem maior e estúdios que praticamente atingiram o status de monopólio, por que não dar uma chance a uma aventura além da abordagem estadunidense?
O que se destaca acaba sendo a dinâmica entre os personagens, mais por conta do elenco que o roteiro, que não traz diálogos muito bons, mas os atores são carismáticos o suficiente para te fazer ignorar a história fraca e a direção sem foco. Quando terminamos o filme, fica clara a intenção de uma sequência (com direito a cena pós-crédito), o que poderia até beneficiar a narrativa, sem ter que dividir uma história de origem com a trama principal, deixando tudo desequilibrado, sem contar o vilão, que nem cheguei a mencionar de tão esquecível, o que é uma curioso porque ele é a personagem mais caricata e excêntrica da obra.
Como Virei Super-Herói é a aposta do mercado francês nos super-heróis, mas acabaram pegando o bonde andando tarde demais e não parecem trazer qualquer novidade para o gênero, o que não é uma obrigação, mas com a quantidade de histórias envolvendo encapuzados e as diversas maneiras em que podemos subvertê-las, não faria mal tentar algo mais original.
Como Virei Super-Herói (Comment je suis devenu super-héros) – França, 2020
Direção: Douglas Attal
Roteiro: Cédric Anger, Douglas Attal, Melisa Godet, Charlotte Sanson (baseado em criação de Gérald Bronner)
Elenco: Pio Marmaï, Vimala Pons, Benoît Poelvoorde, Leïla Bekhti, Swann Arlaud, Gilles Cohen, Léonie Souchaud, Camille Japy, Louis Peres, Théo Christine, Clovis Cornillac, Rafaël Guez, Cartman, Cyril Gueï, Vincent Haquin, Antoine Gouy, Anthony Pho, Rachid Yous, Marc David.
Duração: 97 min.