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Crítica | Como Enlouquecer Seu Chefe

Uma preciosa sátira sobre os relacionamentos humanos nos ambientes corporativos.

por Leonardo Campos
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Falta de flexibilidade, formalismo com excesso de documentação, confusão constante entre os laços que interligam a vida profissional com a vida pessoal, numa crítica cheia de humor e sarcasmo aos processos do sistema capitalista que consome muito tempo de nossas vidas em trabalhos monótonos e abusivos, em especial, quando estamos na zona menos favorecida da pirâmide social que nos estrutura. Eis alguns pontos temáticos de reflexão presentes na comédia Como Enlouquecer Seu Chefe, lançada em 1999 e, mais de duas décadas depois, ainda muito atual em suas discussões sobre a vivência em ambientes corporativos liderados por figuras incompetentes. Na trama de 90 minutos, acompanhamos o cotidiano de Peter Gibbons (Ron Livingston), um personagem à beira da depressão, consumido pelo estresse num espaço de trabalho opressivo, homem que já chega ao local para cumprir seu expediente com os olhos vidrados no relógio, a sonhar intensamente com o horário de desfecho da jornada diária.

Frustrado, ele atua na INATEC como um programador responsável pelo upgrade de softwares. Diariamente, testemunha os habituais dissabores do lado negativo da vida corporativa: as fofocas em excesso, a competição interna por melhoria na ocupação de cargos, as horas extras em demasia e os abusos da chefia, autocrática e arrogante. Como alcançar bons resultados e progredir não apenas individualmente, mas também coletivamente? Esta é uma das perguntas que o filme dirigido por Mike Judge, também responsável pelo roteiro, nos apresenta. Muito além das situações cômicas desenvolvidas enquanto entretenimento, Como Enlouquecer Seu Chefe consegue trazer em sua proposta um painel de reflexões sobre algo que nos acomete, de maneira geral, em nossos cotidianos: somos realmente felizes com o nosso trabalho ou estamos ocupando um cargo apenas para pagar as contas?

Localizada na região do Vale do Silício, a empresa onde Peter Gibbons atua é liderada pelo agressivo Bill Lumbergh, interpretado com eficiência por Gary Cole. Ele é o típico chefe autocrata, que desperdiça o potencial dos seus colaboradores com o excesso de burocracia, numa empresa que desvaloriza o capital humano em prol de regras que pouco fazem sentido. As tarefas rotineiras são entediantes, automatizadas como se todos estivessem numa linha de montagem de um fábrica. Neste processo automático, os colaboradores cumprem o básico para manter a empregabilidade e, assim, exercerem as suas respectivas cidadanias. A comunicação, neste ambiente, passa longe de ser assertiva. E, para piorar, não dialoga com nenhum dos princípios da “não violência”. Todos, dos programadores colegas do protagonista ao seu interesse amoroso, uma garçonete, interpretada por Jennifer Aniston, estão na condição de proletários e insatisfeitos.

São personagens que integram a condição do trabalhador na sociedade burguesa, isto é, aqueles que vendem a sua força de trabalho para pagar as contas, mesmo que isso consuma a sua saúde física e mental, bem como grande parte de suas dignidades. As coisas curiosamente se modificam depois que Peter Gibbons faz, a contragosto, uma sessão de terapia com hipnose que o transforma num homem com nova perspectiva para o trabalho. Ele foge das regras, inicia um processo de rebeldia e desobediência e, paradoxalmente, recebe elogios e muda a sua rotina. Nesta trama que ainda flerta com a necessidade do desapego aos bens materiais e aos ditames do mundo corporativo, o protagonista e seus dois principais colegas, Michael (David Herman) e Samir (Ajay Naidu) abraçam o absurdo num projeto de desvio de verba que tonifica a narrativa e a tira da linearidade, na geração de situações engraçadas e mirabolantes.

Em linhas gerais, Como Enlouquecer Seu Chefe retrata a falta de sentido no trabalho por meio destes personagens ridicularizados, espécie de caricaturas humanas. Na direção de fotografia e no design de produção, assinados por Tim Suhrstedt e Edward T. McAvoy, respectivamente, nós conseguimos mergulhar na temática corporativa, haja vista a eficiência de ambos os setores em criar ambientes e captar os personagens que circundam por estes espaços. A trilha sonora de John Frizzell também ajuda o filme a funcionar bem. Ademais, a produção é uma comédia para divertir os seus espectadores e fazer refletir sobre a síndrome da segunda-feira, isto é, a aversão ao primeiro dia útil da semana, quando sabemos que a felicidade momentânea do final de semana acabou e que, forçadamente, teremos que voltar ao nosso posto de trabalho por mais cinco longos dias. Não é uma realidade para todos, mas algo que acomete muita gente, também conhecida, por aqui, como Síndrome do Fantástico (referência ao programa dominical e sua vinheta que reforça a chegada do final do domingo e o começo de uma nova semana).

Como Enlouquecer Seu Chefe (Office Space, Estados Unidos – 1999)
Direção: Mike Judge
Roteiro: Mike Judge
Elenco: Ron Livingston, Jennifer Anniston, Stephen Root, Diedrich Bader, Ajay Naidu, Gary Cole, Alexandra Wentworth, Joe Bays, Paul Willson, John C. McGinley
Duração: 90 min.

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